Uma nova demonstração do desrespeito da USP ao mais elementar dos direitos dos docentes (o de votar e ser votado na composição dos colegiados) ocorreu no recente processo de eleição dos representantes das categorias de professor doutor e professor associado no Conselho Universitário (CO).

Essas categorias têm direito a eleger, cada uma, um só representante como membro do CO. Os representantes são eleitos por delegados das unidades. Assim, a eleição dos representantes é precedida pela eleição dos delegados.

A eleição dos delegados ocorreu no dia 18/10. Se, nos anos anteriores, esta eleição durou um dia inteiro, desta vez as urnas ficaram abertas por apenas duas horas! Na eleição dos representantes, em 25/10, os candidatos tiveram apenas quinze minutos para inscrever-se, e meia hora para votar: entre 10h30 e 11h00 para os associados e entre 14h30 e 15h00 para os doutores.

A Adusp, sabedora do formato antidemocrático do processo eleitoral, tentou criar condições para que os delegados pudessem conhecer-se e discutir as candidaturas existentes. Assim, encaminhou um convite a todos, colocando a sede à disposição para uma reunião entre eles. O convite foi enviado pelo correio eletrônico no dia 23/10, para que a reunião tivesse lugar a tempo, no dia 24/10.

Participaram da reunião exclusivamente delegados. Foram cerca de 20 professores, que se apresentaram aos demais. Quem pretendia candidatar-se a representante declarou esta intenção. Três dos delegados, diretores da Adusp, deixaram claro que não eram candidatos. Depois de uma breve apresentação dos candidatos, marcou-se uma nova reunião, a realizar-se no dia seguinte, imediatamente antes da votação.

Um dos presentes à reunião de 24/10, professor Silvio Melhado (EP), foi eleito representante dos associados, com 30 votos em 44, disputando com outros três candidatos. O professor Pablo Ortellado (EACH), também presente à reunião, elegeu-se representante dos doutores, com 26 votos em 48, à frente de outros três candidatos. Sua suplente é a professora Elizabeth Spinelli de Oliveira (FFCLRP), eleita com 25 votos.

“Rito sumário”

“A sensação é de que o rito da eleição é muito sumário”, declarou ao Informativo Adusp o professor Melhado. “Fomos levados a trabalhar com a expectativa de uma inscrição em minutos, e de uma votação em minutos”, acrescentou.

Para conversar entre si, informalmente, os delegados associados recorreram a um artifício regimental: retiraram-se da sala onde se reunia o colégio eleitoral, provocando falta de quórum, o que obrigou o presidente da mesa a postergar a votação.

“Seria desejável um encontro dos professores para discutir suas prioridades. Um processo de debate, programado, que ocupasse um dia ou pelo menos uma manhã”, comentou Melhado, observando que a USP é grande e há dificuldades para que os candidatos “entendam os anseios dos colegas”.

É preciso combater o desinteresse e a omissão de uma parte da categoria, sustenta. “Não houve um mínimo de articulação, o que é preocupante”. Ele também questiona, como preliminares, a baixa representação dos associados no CO, “restrita a um único professor”, e o fato de a eleição ser indireta, em duas fases.

O professor Ortellado, por sua vez, considera o atual processo eleitoral desprovido de caráter democrático: “É completamente insuficiente, ruim. A eleição é indireta. Parece que foi desenhado para que seja pouco participativo”.

O mais grave, diz, é a eleição dos delegados em tempo muito curto. “A pessoa que estiver dando aula não pode votar. Não existe justificativa para que essa eleição não dure o dia inteiro”, protesta ele. “Na minha unidade, talvez tenham participado apenas 30 professores, de um total de 200”.

Composição do CO

O CO é constituído por uma centena de membros, sendo apenas cinco representantes dos docentes. Num colegiado constituído pela absoluta maioria de professores titulares vinculados à administração da universidade, apenas cinco representantes docentes é algo que desrespeita qualquer lógica democrática. Sendo tão poucos e considerando que estão na pauta do CO as discussões da reforma do Estatuto, é preciso que esses representantes tenham efetivo compromisso de discutir com seus representados as posições a serem defendidas e votadas.

Mudança de estatuto

Os documentos elaborados pela comissão do CO encarregada da proposta institucional para a reforma do Estatuto foram recentemente remetidos para discussão nas Congregações. A leitura das propostas indica que não há avanços quanto à democratização das relações de poder na USP, quando não fazem retroceder, como parece ser o caso da estrutura da carreira.

Nas mudanças propostas, o artigo 2, que trata das finalidades da universidade, dá nova redação à extensão, substituindo o texto atual, “estender à sociedade serviços indissociáveis das atividades de ensino e pesquisa”, pela formulação “estendendo à sociedade serviços relacionados com suas atividades fins”, numa clara abertura aos interesses de utilização privada dos recursos materiais e humanos da universidade pública.

No artigo 76, que define as categorias docentes, é reintroduzida a figura do professor adjunto. Por ironia, retroagindo no único item proposto pela comunidade que foi acatado pelo CO na reforma estatutária de 1988, quanto o degrau correspondente ao professor adjunto foi extinto, facilitando o acesso dos professores que fizessem a livre docência aos cargos de titular.

De acordo com a proposta da Comissão, “a obtenção da condição de professor titular poderá se dar por duas vias: avaliação de mérito por provas ou concurso público para provimento de cargo” (artigo 84). No primeiro caso, o candidato deve ser adjunto e há um controle externo às unidades sobre quem pode se inscrever. Assim é que no artigo 86 aparece: “A inscrição para obtenção do nível de professor titular deverá ser apreciada pela congregação da Unidade responsável pelo concurso, com base em relatório circunstanciado favorável, sobre o memorial do candidato, elaborado por comissão externa à unidade, segundo requisitos mínimos previstos no Regimento geral”.

Uma mudança de estatuto que promova a democratização da USP só ocorrerá com a participação de professores, funcionários e estudantes. Espera-se que os representantes eleitos somem sua atuação ao conjunto dos docentes e demais setores que lutam pela democratização da nossa universidade.

 

Matéria publicada no Informativo n° 247

EXPRESSO ADUSP


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