“Veio uma comissão construída de cima para baixo e sem ouvir ninguém. Nosso trabalho de quatro meses de negociação, em princípio, foi todo jogado fora”. Assim o professor Helder Garmes, representante da Adusp, manifestou-se sobre a reunião de 7/5 em que a Reitoria anunciou sua decisão de criar unilateralmente a Comissão da Verdade (CV), com sete membros, no­meada pelo reitor sem participação da comunidade. Desse modo, foi atropelada a proposta do Fórum Aberto pela Democratização, que inicialmente a Reitoria aceitara como passível de tramitação no Conselho Universitário (Co), e que consistia de uma comissão de 15 membros titulares, 12 dos quais indicados pelas quatro entidades representativas (Adusp, Sintusp, DCE e APG) e três indicados pela Reitoria.

Já no dia seguinte a Reitoria publicou a Portaria GR 6172, que define as finalidades da CV e nomeia seus membros, desqualificando assim todo o processo de debates sobre o tema que vinha sendo feito, desde meados de 2012, na comunidade universitária. Restou apenas, como resíduo das negociações, o enunciado central: “Fica criada, na Universidade de São Paulo, a Comissão da Verdade destinada a examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos,  praticadas durante a ditadura militar com a ajuda de setores civis que vigorou no País entre 31 de março de março de 1964 e 15 de março de 1985, contra docentes, alunos e funcionários não docentes da Universidade”.

Foram designados pelo reitor Grandino Rodas para compor a CV os docentes Dalmo Dallari (FD), Erney de Camargo (ICB), Eunice Durham (FFLCH), Janice Theodoro da Silva (FFLCH), Maria Hermínia  Brandão de Almeida (IRI), Silvio Roberto Salinas (IF) e Walter Colli (IQ).

Postergações

Antes do encontro de 7/5 entre o Fórum Aberto e os representantes da Reitoria (Alberto Carlos Amadio, chefe de gabinete; Wanderley Messias da Costa, superintendente de relações institucionais; e Rubens Beçak, secretário geral da Universidade), outros foram desmarcados sucessivamente, e de modo desrespeitoso, por parte da Reitoria.

Como noticiado no Informativo Adusp 361, a Reitoria havia agendado para 14/5 uma reunião entre os membros indicados pelas categorias para compor a CV-USP e o grupo de professores representantes da Reitoria. Porém, no dia 3/5, o encontro foi desmarcado por meio de telefonema da Superintendência de Relações Institucionais, que sugeriu sua anteci­pa­ção para 7/5. O  Fórum  Aberto confirmou a presença no dia 7/5, após ter consultado todos os representantes cuja presença estava prevista para a reunião do dia 14/5.

Vale ressaltar que, além da comissão do Fórum que estava conduzindo a negociação com a Reitoria, estariam presentes no encontro de 14/5 alguns dos representantes eleitos pelas categorias para compor a CV-USP, entre eles os professores Fabio Comparato, Marilena Chauí e Pedro Paulo Chieffi. Devido à antecipação para 7/5, o professor Chieffi não poderia mais comparecer e seria substituído pela professora Zilda Iokoi. Contudo, todo o esforço de contatar novamente os representantes foi em vão: no final da tarde de 3/5, a Adusp recebeu nova mensagem da Superintendência, cancelando o encontro recém-confirmado. O recado também informava que propostas de duas novas datas seriam encaminhadas.

Em telefonema no dia 6/5 ao professor Wanderley Messias, superintendente de relações institucionais, a associação insistiu para que a reunião de 7/5 fosse mantida. Durante a conversa, a Adusp foi informada de que os representantes da Reitoria não viam sentido em que participassem do encontro as pessoas indicadas pelas categorias para compor a CV-USP, uma vez que esta ainda não existia. Messias ainda disse que, na ocasião, apresentaria a proposta  da Reitoria para a criação da CV-USP. Só no final da manhã de 6/5 é que foi confirmada a reunião do dia seguinte, mas sem a presença dos representantes eleitos pelas categorias. A Reitoria só estava disposta a receber a comissão de negociação. Consultado o Fórum Aberto, decidiu-se mesmo assim participar da reunião, na expectativa de que os trâmites para a criação da CV-USP avançassem.

Dada essa movimentação no mínimo intrigante, bem como o cenário posterior, surgem dúvidas e indagações. Por que, às vésperas de uma reunião marcada com antecedência, a Reitoria anunciou que não mais receberia os membros eleitos pelas categorias para compor a CV-USP? Afinal de contas, a quem interessou esse jogo de postergações e subterfúgios?

“Como antes nós havíamos mandado um documento solicitando uma conversa entre a Reitoria e os membros indicados pelas categorias para compor a CV-USP,  [durante a reunião] eles tentaram nos fazer acreditar que nós já tínhamos definido a comissão e que, por isso, a Reitoria não tinha mais o que fazer”, conta o professor Helder Garmes sobre o encontro do último dia 7/5.

O representante da Adusp observa que o argumento utilizado pela Reitoria na ocasião tinha a intenção de fazer com que os demais presentes acreditassem que as nomeações das categorias para a CV-USP denotaram um “atropelo” da Reitoria pelo Fórum. “E aí o reitor decidiu baixar a portaria”. “Nós contra-argumentamos, dizendo que não era esse o combinado. Insistimos que se estava perdendo a oportunidade de fazer uma comissão de fato representativa, que servisse de modelo para outras universidades, mas de nada adiantou; tudo já estava previamente decidido”, diz Garmes.

Processo

O pedido de criação de uma Comissão da Verdade da USP foi oficialmente apresentado à Reitoria em reunião do dia 21/11/12. Em 15/12/12, a solicitação foi respondida indiretamente. No Diário Oficial do Estado, o reitor Rodas publicou ato em que declarava que “qualquer grupo interessado” na busca da verdade histórica “possui legitimação própria, independentemente de nomeação reitoral”. O documento também citava o nome dos professores incumbidos de representar a Reitoria nas negociações.

No dia 21/11, abaixo-assinado com mais de 4.600 assinaturas, pedindo a instalação da CV-USP, foi entregue ao secretário-geral da Universidade, professor Rubens Beçak. Em 22/1/13, em nova reunião com a Reitoria, o Fórum obteve, finalmente, a resposta de que a Universidade se comprometeria a instaurar oficialmente a comissão. 

Em 4/2/13, o Fórum apresentou à Reitoria uma proposta inicial, deliberada em sua reunião aberta de 30/1/13, que indicava a composição da CV-USP, nomeação dos membros, prerrogativas, infra-estrutura, assessoria etc. Em reunião do dia 7/5/13, com representantes das categorias e do Fórum, a Reitoria anunciou a criação de sua própria comissão. 

Vale lembrar que, durante sua trajetória promovendo debates sobre o assunto na Universidade, o Fórum Aberto conseguiu fazer com que a criação da CV-USP contasse com o apoio das seguintes instituições e grupos: Comissão Nacional da Verdade, Comis­são da Verdade do Estado de São Paulo “Rubens Paiva”, Comissão Municipal da Verdade “Vladimir Herzog”, Ministério Público Federal, Associação Juízes para a Democracia, Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos e Comitê Paulista por Memória, Verdade e Justiça.

 

Informativo nº 363

EXPRESSO ADUSP


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