Pareceres
Parecer sobre Inexigibilidade de inscrição nos Conselhos de Fiscalização Profissional
Aparecido Inácio*
DA INEXIGIBILIDADE DE INSCRIÇAO DOS DOCENTES DAS UNIVERSIDADES FEDERAIS E ESTADUAIS NOS CONSELHOS DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL
1) Da consulta:
Trata-se de consulta formulada por um docente filiado a ADUSP – Associação dos Docentes da USP onde suscita dúvida se o mesmo é obrigado a se manter vinculado ao Conselho de Fiscalização de sua atividade profissional, em vista de que se dedica exclusivamente a atividade de docente.
2)Dos Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional:
Antes de adentrar no mérito da consulta que nos foi formulada, impõe-se primeiramente tecer alguns comentários sobre a característica dos chamados Conselhos de Fiscalização do Exercício Profissional.
Os Conselhos de Fiscalização das profissões regulamentadas (os mais conhecidos são a OAB – advogados, o CREMESP- médicos, o COREN- enfermeiros, o CREA- engenheiros e arquitetos, CRESS- assistentes sociais, CRF- farmacêuticos, o CRC- contabilistas, o CRA- administradores, o CROS para os dentistas, o CRECI para os Corretores de Imóveis, o CRMV para os médicos veterinários, etc) exercem uma função que lhes é delegada pelo Poder Público. Logo são considerados uma "autarquia especial ou corporativa" pois são dotados da função de fiscalizar os membros de determinadas categorias profissionais, na defesa da sociedade.
Diz-se que tal atribuição lhes é delegada, pois originalmente a fiscalização das profissões é uma atribuição da União[1][2], prevista na Constituição Federal, a qual pode ser delegada.
Para tanto somente gozam destas prerrogativas os Conselhos criados por lei federal, para atuarem assim como um braço auxiliar do Estado (Governo) e são dotados de personalidade jurídica de direito público e isso lhes autoriza a criar contribuições (anuidades) que são consideradas obrigatórias e se não forem pagas poderão ser executadas na via judicial, e o profissional que deixar de paga-la, corre o risco de não ter mais permitido sua atuação profissional.
Como tais Conselhos são considerados de personalidade jurídica de direito público, seus dirigentes devem observar as regras Constitucionais do artigo 37 e art. 39 da Constituição Federal, ou seja, para a contratação de seus funcionários devem fazer concurso público; devem fazer licitações para compra de bens e imóveis; seguem normas de um processo eleitoral, devem prestar contas ao TCU – Tribunal de Contas da União, entre outras coisas e todos os Conselhos estão sujeitos a estas normas, conforme reiteradas decisões do SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL, especialmente a que foi proferida por último, já no final do ano de 2002, relativo a ADIn 1.717-6.
Portanto, para fiscalizar cada profissão, foi criado um Conselho Federal com sede em Brasília e existem Conselhos Regionais em todos os Estados (alguns inclusive passaram por intervenção do federal, por conta de irregularidades cometidas por seus administradores, p.e, CROSP/SP e CRECI/SP) e todos eles estão sob fiscalização contábil e financeira do Tribunal de Contas da União, por força do inciso II do artigo 71 da Constituição Federal.
O STJ- SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, já decidiu que tais Conselhos são autarquias, pura e simples e que as taxas por eles instituídas são tributos, podendo ser cobrados através das ações de execução fiscal perante a Justiça Federal. Vejamos:
"Competência. Execução fiscal movida por Conselho Regional de Corretores de Imóveis. I- Os Conselhos…constituem autarquias federais, segundo dispõe expressamente o art. 5*………Ensina HELY LOPES MEIRELLES que" Autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei, com personalidade jurídica de direito público interno, patrimônio próprio e atribuições estatais especificas (in. Dir. Adm. Brasileiro, 9* ed., RT, pág. 276) Os conselhos regionais (de enfermagem, engenharia, Medicina, etc.) têm natureza jurídica de autarquia federal. Neste caso específico, por força da Lei 5.905…. que criou o Conselho Regional de Enfermagem de Minas Gerais. Essas entidades visam ao cumprimento, como entes da Administração, da competência prevista no artigo 21, XIV, da Constituição, segundo o qual cabe à União, "organizar, manter e executar a inspeção do trabalho".
Segundo o professor especialista em direito administrativo Dr. HELY LOPES MEIRELLES "Autarquias são entes administrativos autônomos, criados por lei, com personalidade jurídica de direito público interno, patrimônio próprio e atribuições estatais especificas" (In. Direito Administrativo Brasileiro, 9* ed, RT, pág. 276).
Em outra parte do julgamento acima citado ocorrido no STJ, o MINISTRO DEMÓCRITO REINALDO, assinalou que:
"Os conselhos regionais (de enfermagem, engenharia, Medicina, etc.) têm natureza jurídica de autarquia federal. Neste caso específico, por força da Lei 5.905…. que criou o Conselho Regional de Enfermagem de Minas Gerais. Essas entidades visam ao cumprimento, como entes da Administração, da competência prevista no artigo 21, XIV, da Constituição, segundo o qual cabe à União, "organizar, manter e executar a inspeção do trabalho".
3) Da liberdade do exercício de atividade profissional:
Como dito, em face de terem sido criados por lei, os Conselhos Federal e Regionais são dotados de personalidade jurídica de direito público, logo, exercem poder de policia administrativa sobre os membros da categoria. Por isso sua manutenção se dá através das anuidades cobradas de seus membros, a qual é considerado um tributo.
Mas no que diz respeito a obrigatoriedade do pagamento de tal anuidade como condição para o exercício profissional, existem muitas controvérsias. Alguns Conselhos Regionais, especialmente o CREA, COREN e o CREMESP, se utilizam o fato de que se um determinado profissional não pagou a anuidade está proibido de atuar na profissão e até oficiam os órgãos aos quais o mesmo está vinculado para que faça cessar a prestação do serviço.
Entendemos que isso é ilegal, pois fere o inciso XIII do artigo 5o da CF/88. Vejamos:
"Art.5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:·(…)". XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer".
Frise-se ainda o que estabelecem os incisos III e IV do art. 1º, da CF, que:
"Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado democrático de direito e tem como fundamentos: (…) III – a dignidade da pessoa humana; IV – os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa".
Citando a lição do professor J. Cretella Jr., em seus Comentários à Constituição de 1988, encontramos o binômio trabalho-dignidade como algo que jamais poderá ser alijado um do outro, senão vejamos: o ser humano, o homem, seja de qual origem for, sem discriminação de raça, sexo, religião, convicção política ou filosófica, tem direito a ser tratado pelos semelhantes como `pessoa humana`, fundando-se o atual Estado de direito, em vários atributos, entre os quais se inclui a `dignidade` do homem, repelido, assim, como aviltante e merecedor de combate qualquer tipo de comportamento que atente contra esse apanágio do homem.
Sob dois ângulos, pelo menos, o trabalho pode ser apreciado: pelo individual (`o trabalho dignifica o homem`) e pelo social, afirmando-se, em ambos os casos, como valor que na escalonação axiológica se situa em lugar privilegiado. Dignificando a pessoa humana, o trabalho tem valor social dos mais relevantes, pelo que a atual Constituição o coloca como um dos pilares da democracia [2][3]
Logo, como a qualificação profissional para o exercício de uma determinada profissão é outorgada na forma da legislação vigente, pelo Reitor de cada universidade (CF/88, art. 207 e Lei 9.394/96), depois de concluído o aprendizado necessário não se pode admitir então que para exercer a profissão, o profissional fique limitado apagamento de tal anuidade.
4) DAINEXIGIBILIDADE DE INSCRIÇÃO EM CONSELHO PROFISSIONAL PARA EXERCÍCIO DE CARGO DE DOCENTE EM UNIVERSIDADE ESTADUAL OU FEDERAL
Tal matéria já foi objeto de apreciação judicial em caso idêntico ao que estamos analisando, tendo a Justiça Federal reconhecido não incidir sobre as Universidade Federais a fiscalização de tais autarquias corporativas, em face da autonomia constitucional assegurada pelo Art. 207 da Carta Política Pátria e pela Lei 5.540/68.
Vejamos
"EMENTA: Administrativo. Conselho Regional de Administração. Inscrição Profissional, cargo em Comissão. Superintendente de Recursos Humanos da UFPB. Ação Ordinária proposta pelo CRA, visando a anular nomeação de pessoa não portadora do Diploma de Administrador como Superintendente de Recursos Humanos da UFPB; As Instituições de Ensino Superior (IES) não se sujeitam à fiscalização das Autárquicas Corporativas, sobe pena de violação ao princípio da Autonomia das Universidades, de cunho Constitucional e precisa definição da Lei-CF88. Art. 207, Lei 5.540/68, art. 3º Cargo para o qual não se exige, em decorrência da legislação de ensino ou de norma regulamentar da IES, que seja preenchido por Administrador." (JSTJ E TRF – VOLUME 103 -PÁGINA 575). Apelação Cível n. 106.388-Pb;
Os conselhos de fiscalização sustentam em sua defesa que as funções exercidas pelos docentes nestas carreiras é privativo daquela profissão, devendo a estes se filiar, se obrigando assim ao pagamento da anuidade.
Nada disso: A legislação que atribui aos Conselhos Regionais o poder de regulamentar e fiscalizar o exercício das profissões não se sobrepõe ao princípio da autonomia universitária e tampouco a Lei de Diretrizes e Bases da Educação. pertinentes à matéria. (Art. 207 da CF)
O sistema de ensino constitui um ordenamento jurídico próprio, de cunho constitucional (artigos 205 e ss., da CF), e precisa de definição em Lei, sem que daí conste a exigência de satisfação de requisitos genéricos para o exercício de profissões reguladas, na esfera privada, pelos Conselhos de Classe.
Por esse ordenamento não se reclama, quer para o provimento, quer para o exercício de cargos de direção, chefia e assessoramento tidos como de confiança, o registro profissional em determinadas autarquias corporativas, sob pena de ofensa ao princípio da autonomia universitária que vem sendo conquistada e ampliada, apesar das resistências, ao longo da história.
Isso é o que conclui da leitura dos dispositivos legais da LDB, abaixo citados:
LEI Nº 9.394, DE 20 DE DEZEMBRO DE 1996.
Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional
(…….)
Art. 54. As universidades mantidas pelo Poder Público gozarão, na forma da lei, de estatuto jurídico especial para atender às peculiaridades de sua estrutura, organização e financiamento pelo Poder Público, assim como dos seus planos de carreira e do regime jurídico do seu pessoal.
§ 1º No exercício da sua autonomia, além das atribuições asseguradas pelo artigo anterior, as universidades públicas poderão:
I – propor o seu quadro de pessoal docente, técnico e administrativo, assim como um plano de cargos e salários, atendidas as normas gerais pertinentes e os recursos disponíveis;
II – elaborar o regulamento de seu pessoal em conformidade com as normas gerais concernentes;
(………)"
Ainda exemplificando com lições extraídas de julgados de nossos Tribunais, já decidiu o TRF da 5ª Região, no tocante especificamente aos cargos de direção dos entes da administração indireta, que se a norma regulamentar não exigir o seu preenchimento por portador de Diploma em Administração, não estão, seus ocupantes, obrigados a se inscrever no CRA.
Nesse sentido é de se destacar também o julgamento da AMS n. 50.146/PB, em que foi Relator o MM. Juiz JOSÉ DELGADO, ora Ministro do STJ, vejamos:
"MANDADO DE SEGURANÇA. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO. INSCRIÇÃO PROFISSIONAL.
I – Só estão obrigados a se inscreverem no Conselho Regional de Administração os portadores de diploma de Técnico em Administração.
II – O diretor de sociedade de economia mista atua como discricionariedade no preenchimento dos cargos em comissão, que são de livre nomeação e exoneração de indicados pelo critério de confiança.
III – Se o cargo não exige, em decorrência de lei ou de norma regulamentar, que seja preenchido por Técnico de Administração, a pessoa que ocupa não está obrigada, ao exercê-lo, a se inscrever no Conselho Regional de Administração.
IV – Apelação provida para conceder a segurança e tornar sem validade e eficácia a autuação fiscal instituída."
No mesmo sentido foi o julgamento da AMS n. 55.229, da qual relator o Juiz Dr. Ridalvo Costa.
" EMENTA – ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE ADMINISTRAÇÃO . INSCRIÇÃO PROFISSIONAL. CARGO EM COMISSÃO
1 – O exercício de atividade administrativa de âmbito interno, sem distinção para terceiros, não submete a empresa à fiscalização do CRA.
II – De igual modo, não estão obrigados a se inscrever no CRA os ocupantes de cargos de direção de empresa, para cujo preenchimento a norma regulamentar não exija portador de diploma de Técnico em Administração.
III – Precedentes deste TRF (MAS N. 55.22/PB, REL. JUIZ RIDALVO COSTA, TERCEIRA TURMA, JULG. 19.09.96, DECISÃO UNÂNIME).
No caso, não há também qualquer distinção com a atividade docente.
5) Outros posicionamentos a respeito do assunto:
Encontramos outros posicionamentos contrários a obrigatoriedade dos docentes se inscreverem nos Conselhos de Fiscalização:
Nosso colega Márcio Ferezin Custodio, de SIQUEIRA NETO ADVOGADOS ASSOCIADOS, respondendo a CONSULTA ADUNESP Nº 0008/99, aduziu que:
"Exercício da docência. Professores Engenheiros, Arquitetos e Engenheiros-Agrônomos. Exigibilidade de quitação das anuidades junto ao órgão de classe (artigo 7º da Lei 5194/66). Falta de previsão legal.
1. A ADUNESP-Central, por intermédio de seu Presidente (Ofício 16/99), consulta-nos a respeito de um parecer sobre a exigibilidade de comprovação da quitação das anuidades pelos respectivos docentes, junto ao Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura – CREA, para o pleno exercício da docência.
2. A obrigatoriedade de quitação da anuidade pelos docentes junto aos CREAs, foi decidida na Sessão Plenária Ordinária nº 1.258 do "Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia – CONFEA" (DECISÃO Nº PL-1625/95) de 6 de outubro de 1995; e posteriormente acatada pela Reitoria e Pró-reitoria de administração da UNESP, conforme as decisões exaradas no processo 610/97-RUNESP, às fls. 30 e 33 respectivamente.
3. A decisão da Plenária do "CONFEA" fundamentou-se no artigo 7º, alínea "d", da Lei 5.194/66, o qual necessário se mostra a reprodução:
"(…)
Art. 7º – As atividades e atribuiçõesprofissionais do engenheiro, do arquiteto e do engenheiro-agrônomo consistem em:
a) a) a) (…)
d) ensino, pesquisa, experimentação e ensaios;
(…)
Parágrafo único. Os engenheiros, arquitetos e engenheiros-agrônomos poderão exercer qualquer outra atividade que, por sua natureza, se inclua no âmbito de suas profissões." (Grifo Nosso)
4. Ressalte-se que a indigitada Lei, regulamenta somente as atividades que os profissionais engenheiros, arquitetos e engenheiros-agrônomos podem desempenhar, ou seja, refere-se única e exclusivamente sobre o tipo de trabalho que os mesmos estão aptos. Nada mais que isso.
5. Com e efeito e analogicamente demonstrando, é o caso do bacharel em Direito que pode perfeitamente ministrar aulas, sem que para isso tenha que se inscrever na Ordem dos Advogados do Brasil.
É a nossa opinião. São Paulo, 16 de Junho de 1999."
Junto a UFSCar, este assunto também obteve posicionamento da Procuradoria Jurídica daquela Universidade . que também é contrária a subordinação dos docentes aos referidos Conselhos. Vide nesse sentido Despacho PJ n. 619/2001, da Procuradoria Jurídica da Universidade Federal de São Carlos, do qual se reproduz o seguinte trecho:
"A propósito deste tema, esta Procuradoria Jurídica já se pronunciou anteriormente, ainda que examinando pretensão apresentada por entidade diversa, naquele caso, o Conselho Regional de Química – CRQ, tendo emitido o Parecer PJ n. 014/99, elaborado pela Dra. Giuliana Maria Delfino Pinheiro Lenza, no qual ficou demonstrado que tanto esta Universidade, como os seus professores, não estão obrigados a manterem-se registrados nos conselhos regionais profissionais, como condição para o oferecimento regular de seus cursos, ou para o exercício das atividades próprias da docência universitária.
Aquele pronunciamento, cuja conclusão esclarece que "não estão os docentes da UFSCar, exclusivamente pelo fato de exercerem a docência em área relacionada à química, obrigados a se registrarem no Conselho de Química", com as devidas adequações, aplica-se inteiramente à presente consulta razão pela qual sugerimos o encaminhamento deste despacho á Chefia do Departamento de Computação, acompanhado de cópia daquele parecer, providência que reputamos suficiente para a elucidação do assunto."
Mais recentemente, a mesma Procuradoria Jurídica da UFSCar foi solicitada a se pronunciar novamente sobre o assunto, tendo emitido o Parecer PJ n. 059, de 15.04.2002, este elaborado pelo Procurador Federal Lauro Teixeira Cotrim, no qual a matéria foi tratada de forma mais aprofundada, sendo de se destacar os seguintes trechos:
"Trata-se de consulta encaminhada pela Diretoria do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia, sobre a obrigatoriedade de atendimento à solicitação do Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo – CREA-SP, de informações sobre a existência ou não de alterações curriculares dos cursos de engenharia ministrados nesta Universidade, no ano de 2001, encaminhando, em caso afirmativo, a nova grade curricular e respectivo programa, da parte profissional, bem como a relação nominal do corpo docente, com o número de inscrição naquele Conselho, além de indagar da possibilidade de recorrer daquela decisão, de modo a evitar prejuízos para alunos e docentes.
Em pronunciamento anterior desta Procuradoria Jurídica, objeto do Parecer PJ n. 226/98, elaborado pela Dra. Giuliana Maria Delfino Pinheiro Lenza, foi abordada precisamente a questão aqui versada, ficando assentado que esta Universidade não está obrigada a apresentar informações sobre grades curriculares, carga horária, programas e relação nominal do corpo docente, com os respectivos números do CREA-SP, como condição para o registro dos diplomas de seus alunos naquela entidade (…)
Verifica-se assim, reiterando os termos do parecer acima reproduzido, que é ilegítima a exigência de prestação de informações pela Universidade, na forma pretendida pelo CREA, isto é, como condição para o registro de engenheiros diplomados pela UFSCar naquela entidade de fiscalização profissional.
Todavia, me parece que a questão pode ser reexaminada com algum temperamento pois, como ficou registrado no parecer antes mencionado, "as informações acima referidas têm caráter público, estando, portanto, disponíveis para qualquer cidadão ou instituição que demonstre interesse na sua divulgação", devendo ser afastada da solicitação o propósito talvez secundário de compelir esta Universidade e seus professores a se registrarem naquela entidade, como indica a exigência de que das informações conste o número de registro dos docentes.
O Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia do Estado de São Paulo é entidade que tem interesse jurídico no conhecimento das informações que solicita, não somente para o efeito de divulgação, como apontou o parecer reproduzido acima, mas certamente com o propósito de melhor instruir seus processos de registro e fiscalização do exercício profissional, atribuindo a cada registrando as competências que a lei lhe conferir, consoante a sua formação acadêmica.
De outra feita, aquela Procuradoria exarou em outro Parecer PJ n. 058/2002, análise na qual sustenta que o magistério superior não é prerrogativa exclusiva dos profissionais com formação em nível de graduação na respectiva área de conhecimento, sendo perfeitamente possível atribuir encargos didáticos a outros professores, ainda que não detentores de curso de graduação, porém, desde que possuam formação em cursos de pós-graduação, em nível de mestrado ou doutorado, bem como aqueles de notório saber, na área respectiva área, conforme trecho abaixo reproduzido:
'Da leitura dos textos legais acima reproduzidos, evidencia-se que o exercício da profissão de Bibliotecário é privativo dos portadores de diploma de Bacharelado em Biblioteconomia expedido por instituição nacional, ou de diploma de graduação em Biblioteconomia expedido por instituição estrangeira, desde que devidamente revalidado no Brasil, competindo ao Bacharel em Biblioteconomia, entre outras atribuições, o ensino das disciplinas de Biblioteconomia. O exercício da função de Bibliotecário, estritamente considerada, é privativo dos bibliotecários devidamente inscritos nos quadros do Conselho Regional da respectiva jurisdição.
Isto não significa, entretanto, que apenas ao bacharel ou graduado em Biblioteconomia seria permitido o exercício do magistério superior relacionado às matérias específicas de Biblioteconomia. Ao contrário, ao Bibliotecário é permitido o ensino daquelas disciplinas, mas a atividade também não é vedada a outros profissionais que igualmente exibam formação que as habilitem ao magistério superior nesta área de conhecimento, como é o caso da obtenção de diploma em curso de pós-graduação em nível de mestrado ou doutorado.
Ademais, não é a legislação que disciplina o exercício da profissão de Bibliotecário que haverá de orientar o ensino de Biblioteconomia em instituição pública de educação superior, como é o caso da Universidade Federal de São Carlos, à qual, no exercício da autonomia que lhe é assegurada pela Constituição Federal (art. 207), compete estabelecer os requisitos para o exercício da docência universitária, observados os parâmetros postos em lei, em especial na Lei de Diretrizes e Bases da Educação – Lei n. 9.394, de 20 de dezembro de 1996, cujo art. 66 estabelece:
'Art. 66. A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado.
Parágrafo único, O notório saber, reconhecido por universidade com curso de doutorado em área afim, poderá suprir a exigência de título acadêmico'.
E prosseguem aduzindo ainda:
"Como se observa, a lei de regência da educação no Brasil estabelece como orientação às instituições de ensino, que os profissionais da educação que venham a se dedicar ao ensino superior devem ser preparados em nível de pós-graduação, em especial, em programas de mestrado e doutorado, indicando que a graduação em determinada área de conhecimento não é único requisito e tampouco confere o direito de exclusividade ao exercício do magistério superior, o qual pode ser atribuído, até preferencialmente, a profissionais que exibam maior qualificação, com a formação em nível de pós-graduação na área específica, ainda que eventualmente não tenham cursado a graduação na mesma área.
Até mesmo a pessoa que venha a ser reconhecida por Universidade com curso de doutorado em área afim, como detentora de notório saber em determinada área de conhecimento, ainda que não possua formação acadêmica, poderá ser admitida ao magistério superior sem atender àquela exigência.
Isso bem demonstra que o exercício das funções de magistério superior é assegurado tanto ao profissional diplomado em curso de graduação na área específica, no presente caso o Bacharelado em Biblioteconomia, sendo também perfeitamente possível que aqueles que não possuam a graduação específica se dediquem à docência, desde que possuam formação em nível de pós-graduação, com mestrado ou doutorado, ou sejam de reconhecido e notório saber, na respectiva área.'
E mais: Despacho PJ n. 619/2001 e no Parecer PJ n. 052/2002: "não estão os docentes da UFSCar, exclusivamente pelo fato de exercerem a docência em determinada área de conhecimento, ainda que voltada para a formação de engenheiros, obrigados a se registrarem no Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia", manifestações que, com as devidas adequações, aplicam-se inteiramente ao presente caso.
6) Outras decisões judiciais:
Ultimamente tem sido tantas as questões levadas à Justiça Federal envolvendo os Conselhos de Fiscalização que quatro juízes federais do Sul – Ricardo Teixeira do Valle Pereira, Luíza Hickel Gambá, Jorge Antonio Maurique e Otávio Roberto Pamplona, escreveram especialmente o livro "Conselhos de Fiscalização Profissional – Doutrina e Jurisprudência" ( In. Editora Revista dos Tribunais, 2001) abordando todos os aspectos envolvendo tais órgãos.
O tópico 6, é o que trata dos "Aspectos materiais da inscrição nos Conselhos de Fiscalização Profissional", de autoria Luíza Hickel (páginas 149/193). Destaca-se do mesmo algumas decisões judiciais a respeito do tema aqui tratado. vejamos:
"Administrativo- Inscrição no Conselho Regional de Contabilidade- Desnecessidade- Auditor Fiscal. 1. Para o exercício do cargo de Auditor Fiscal da Fazenda Nacional não foi exigido do impetrante formação em determinada área, mas apenas a conclusão de qualquer curso superior. 2. Ilegal o ato do Presidente do Conselho Regional de Contabilidade, que negou ao impetrante seu pedido de desligamento daquela entidade" (TRF 4a região, 3a Turma, MAS 96.04.53843-8/PR, relatora Juíza Luiza Dias Cassales, DJU 22.07.1998, p.456);
"Administrativo- CP 40- Edital- Limites- Exigência de inscrição no órgão de classe para assumir cargo publico – Viabilidade. 1. Os requisitos para o concurso são estabelecidos pela Administração, na forma que melhor convenha ao interesse publico, desde que não estabeleça desigualdade entre os candidatos. 2. A exigência de curso superior e inscrição no respectivo órgão de classe, para exercer cargo publico, não afeta os princípios constitucionais atinentes à Administração Publica, inclusive o da legalidade. 3. Agravo improvido"(TRF 4a região, 3a Turma, AG 98.04.01011446-7/RS, relatora juíza Marga Barth Tessler, DJU 17.06.1998, p.514).
7) Conclusão:
Como visto, o exercício do magistério superior não é exclusividade do profissional diplomado em curso de graduação, sendo perfeitamente possível que aqueles que não possuam a graduação específica se dediquem à docência, desde que possuam formação em nível de pós-graduação, com mestrado ou doutorado, ou sejam de reconhecido e notório saber numa daquelas áreas de conhecimento.
Também aponto que em face do princípio da autonomia universitária de ensino superior tem liberdade para fixar os currículos, conteúdos programáticos e cargas horárias de seus cursos de graduação, e para admitir ao magistério superior os professores que ministrarão suas disciplinas, observadas apenas as disposições constitucionais e legais que regem a matéria, em especial, as normas e as diretrizes curriculares gerais pertinentes, estabelecidas pela União na LDB.
Por conseqüência somos da opinião também que o docente universitário não está obrigado a se filiar e a manter-se filiado ao Conselho de Fiscalização do exercício de sua profissão, pois isso não é nenhum pré-requisito para o exercício de sua atividade, devendo este se limitar aos ditames legais estabelecidos pela Instituição Universitária, respeitados os princípios da autonomia universitária, erigidos no artigo 207 da Constituição Federal.
É o nosso parecer.
São Paulo, 03 de fevereiro de 2002.
Aparecido Inácio, advogado
OAB/SP. 97.365
*Advogado componente da Assessoria Jurídica da ADUSP à época da elaboração deste parecer.
[1][2] Art. 21 – Compete à União:
(…………………………….)
XXIV– organizar, manter e executar a inspeção do trabalho;
(…………………………….)
Art.22 – Compete privativamente à União legislar sobre:
(……………………………..)
XVI– organização do sistema nacional de emprego e condições para o exercício de profissões;
(………………………………)
[2][3] (Obra citada, Forense Universitária, Rio de Janeiro, 3a. ed., 1992, p.139/140).
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