Meio ambiente
Vereador propõe que reitor e autoridades do estado se comprometam a manter em atividade escolas e posto de saúde ameaçados pela expansão do Butantan; barulho dos equipamentos segue atormentando a população

O vereador Nabil Bonduki (PT), docente da Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design (FAU) da USP, encaminhou no final de agosto uma indicação (instrumento por meio do qual o vereador sugere ações ou providências a órgãos públicos) a várias autoridades, inclusive ao reitor da USP, Carlos Gilberto Carlotti Jr., para que se comprometam de forma explícita com a continuidade do pleno funcionamento de equipamentos de saúde e educação inseridos na nova Zona de Ocupação Especial (ZOE) do Butantã, criada com a aprovação do Projeto de Lei (PL) no 691/2025.
Três equipamentos de competência estadual foram incluídos na área do novo zoneamento, aponta a indicação: “o Centro de Saúde Escola Samuel Barnsley Pessoa (CSEB), que oferece excelentes serviços de saúde básica para o bairro, ligado à Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP); a Escola Estadual Alberto Torres, unidade escolar quase centenária, que tem tradição na oferta de ensino básico de tempo integral para a juventude da região; e a Escola Técnica Estadual Cepam (Etec Cepam), também muito reconhecida em toda a região metropolitana pela oferta de ensino técnico integrado e modular nas áreas de interesse público e social”, e que tem projetos de parceria com diferentes unidades da USP.
Na indicação, o vereador afirma que, nas audiências e diálogos ocorridos na Câmara Municipal durante a tramitação do projeto, a comunidade do bairro manifestou “a preocupação com a possibilidade de que estes equipamentos possam ter sua destinação alterada ou encerrada por conta da expansão das atividades do Instituto Butantan, levando assim à descontinuidade dos serviços públicos prestados por eles ali onde estão instalados”.
Aprovação do projeto envolveu compromisso de permanência das escolas e do CSEB
Bonduki lembra que parlamentares da oposição negociaram mudanças no texto original enviado pelo Executivo, que era muito mais permissivo em relação às intervenções no Butantan. O entendimento desses(as) vereadores(as) era de que a bancada de apoio ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) já teria os votos necessários para a aprovação do texto, e portanto era preciso formular um substitutivo que restringisse o alcance das alterações propostas.
“Houve compromissos assumidos publicamente em torno da continuidade das escolas nos prédios em que estão hoje, dentro da nova ZOE aprovada, por todo o campo de atores que trabalharam por essa importante aprovação”, argumenta.
A indicação reforça que é preciso firmar “os instrumentos jurídicos necessários como garantia de perenidade e segurança jurídica almejada por toda a comunidade do Butantã”.
Além de Carlotti Jr., o documento foi encaminhado ao governador do estado, Tarcísio de Freitas (Republicanos); ao secretário da Casa Civil, Arthur Lima; ao presidente do Centro Paula Souza, Clóvis Dias; e ao diretor do Instituto Butantan, Esper Kallás. Até o momento, não houve resposta oficial das autoridades citadas.
O PL 691 foi aprovado em segunda votação no dia 20 de agosto e deu origem à lei 18.298/2025, publicada por Nunes no dia 17 de setembro. O texto atende ao desejo do Butantan de dar continuidade ao seu projeto de expansão e de construção de fábricas de vacinas na área do instituto, que é tombada pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) desde 1981 e está cercada por bairros densamente povoados.
Entre outros itens, o texto limita a construção de fábricas aos locais já comprometidos com edificações, mantém áreas de preservação ambiental e não permite o parcelamento do solo, o que poderia levar à comercialização de loteamentos, de acordo com a oposição. O gabarito (altura máxima) dos novos prédios poderá ficar entre 28 metros e 48 metros (o equivalente a um edifício de 16 andares), a depender da localização. As intervenções preveem a derrubada de cerca de 1,7 mil árvores, contra quase 7 mil da proposta original.
Barulho é insuportável, denunciam moradores(as)
As obras de expansão e o início da operação de equipamentos como o novo Biotério têm provocado altos níveis de ruído, motivo de queixas frequentes de moradores(as) de condomínios vizinhos ao Butantan.
Durante a tramitação do projeto na Câmara, o Movimento SOS Instituto Butantan, organizado pela comunidade do entorno — que luta contra as intervenções na área e defende que a produção de vacinas ocorra em outros locais, como a Fazenda São Joaquim, propriedade do instituto em Araçariguama —, produziu um dossiê entregue a vereadores e vereadoras, no qual já eram registradas as reclamações sobre o barulho.
“O ruído é contínuo, 24 horas por dia, 7 dias por semana […]. Realizamos medições técnicas que indicam níveis de decibéis e frequência acima dos limites legais, especialmente no período noturno — quando o silêncio é essencial para o descanso”, testemunhou a moradora Patricia Coelho.
“Além da intensidade, o ruído apresenta uma frequência específica e penetrante, que atravessa paredes e não é barrada nem por janelas antirruído. Trata-se de um som físico e mentalmente exaustivo, que impossibilita o repouso, a concentração e o convívio familiar. Temos moradores que hoje precisam usar protetores auriculares do tipo industrial — iguais aos utilizados por trabalhadores de aeroportos — para conseguir permanecer em suas próprias casas. É um cenário insustentável”, prossegue.
Meses depois, a situação permanece a mesma, confirmaram Patricia e outros(as) moradores(as) da região nesta semana à reportagem do Informativo Adusp Online.
Patricia já encaminhou denúncias referentes a esse fato ao Ministério Público de São Paulo (MP-SP) e à Companhia Ambiental do Estado (Cetesb). As medições realizadas pela Cetesb atestaram emissão de ruído em níveis superiores àqueles permitidos pela legislação para uma zona mista predominantemente residencial, como é o caso.
A continuação do barulho contraria a própria lei votada pela Câmara que autoriza a expansão fabril do Butantan. No seu artigo 20, a lei 18.298 determina que deve ser “observado o atendimento aos parâmetros de incomodidade, especialmente o biotério, que deverá se adequar aos novos parâmetros de ruído” (§ 3o, inciso XV).
Em junho, o Butantan já havia se comprometido a contratar “uma empresa especializada em medições acústicas para identificação das fontes geradoras de ruído” e tomar providências num prazo estimado em 120 dias.
Sobre o tema, a assessoria de imprensa do instituto encaminhou ao Informativo Adusp Online a seguinte resposta: “Com relação às queixas sobre a emissão de ruídos, o Instituto Butantan esclarece que por todo o mês de junho foram realizados testes e ensaios com a empresa contratada que, no fim de julho, emitiu relatório sobre os ruídos e, em agosto, realizou a entrega de projeto com as sugestões para atenuação do ruído. Uma licitação para barreira acústica já foi finalizada para a realização da instalação”.
Em relação aos equipamentos de saúde e educação, a nota diz: “É preciso ressaltar que no Plano Diretor do Instituto Butantan não há nenhum projeto para ocupar os dois serviços públicos citados da Zona de Ocupação Especial (ZOE) Butantã: o Centro de Saúde Escola Samuel Barnsley Pessoa/CSEB e a Escola Estadual Alberto Torres e Escola Técnica Estadual Cepam”.
A assessoria afirma ainda que o Instituto Butantan “mantém canais abertos de diálogo com a sociedade, tendo, inclusive, recebido vereadores, vizinhos e outras lideranças na instituição para tratar sobre os temas referidos” e que “os questionamentos foram também respondidos presencialmente pelo diretor do Instituto Butantan em audiência pública na Câmara Municipal de São Paulo, em 5 de agosto”.
A comunidade do bairro contesta essa alegações e aponta que até o momento o instituto não respondeu a dois ofícios protocolados pelo Movimento SOS Instituto Butantan, respectivamente em 3 de junho e 14 de julho.
Além disso, perguntas feitas por vereadores(as) e moradores(as) na audiência pública do dia 5 de agosto não foram respondidas por Esper Kallás. O diretor do Butantan não compareceu à segunda audiência pública na Câmara, realizada no dia 12 de agosto.
Governo encaminha à Alesp projeto que extingue FURP e repassa suas funções ao Butantan
O governo do estado encaminhou à Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) o Projeto de Lei Complementar (PLC) 49/2025, que autoriza o Executivo a promover a extinção da Fundação para o Remédio Popular “Chopin Tavares de Lima” (FURP). As atribuições da fundação serão assumidas pela Secretaria da Saúde, por meio do Instituto Butantan.
De acordo com o governo, a produção de medicamentos será mantida, e os(as) funcionários(as) da FURP também permanecerão no quadro, com a possibilidade de serem “realocados em órgãos e entidades da Administração Pública direta e indireta estadual em que haja necessidade ou déficit de pessoal”, diz o texto do PLC.
Em declaração registrada pela agência de notícias oficial do Executivo, Esper Kallás afirmou que o projeto “vem sendo cuidadosamente elaborado nos últimos dois anos”.
Um pesquisador científico do Butantan disse ao Informativo Adusp Online que a medida pode ser positiva, desde que os encaminhamentos sejam corretos. A FURP tem capacidade para produzir medicamentos importantes com menor custo, e já vinha sofrendo com problemas decorrentes da má gestão, causada pelo próprio governo estadual.
Um ponto importante é que o PLC 49/2025 autoriza o Estado a alienar os bens imóveis atualmente pertencentes à fundação, o que abre a possibilidade de que o governo Tarcísio simplesmente os venda ao setor privado (como tem feito em diferentes serviços públicos estaduais), ao invés de utilizá-los para ampliar o parque de produção de vacinas do Instituto Butantan.
A FURP foi um dos órgãos públicos que escaparam de ser extintos pelo famigerado Projeto de Lei 529/2020, encaminhado à Alesp pelo então governador João Doria (PSDB). O projeto, aprovado com alterações após forte resistência do funcionalismo público e da oposição na Alesp e convertido na lei 17.293/2020, autorizou a extinção de instituições como a Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) e a Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), confiscou fundos públicos e aumentou alíquotas do ICMS e da contribuição dos servidores ao Instituto de Assistência Médica ao Servidor Público Estadual (Iamspe), entre outras medidas deletérias.
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