Como entender 270 demissões sem justa causa?

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“… denota-se que os regramentos que autorizavam a extinção automática do contrato de trabalho – após a concessão de aposentadoria espontânea ou voluntária (requerida pelo segurado junto ao Instituto Nacional de Seguridade Social – INSS), NÃO MAIS SUBSISTEM, gerando, dessa forma, novos efeitos no contrato de trabalho que devem ser enfocados a luz das legislações previdenciárias e trabalhistas.”

“Não podendo ser a aposentadoria espontânea motivo de resilição contratual e considerando que o Poder Público tem limitação quanto ao rompimento laboral sem justa causa, haja vista que os atos administrativos devem ser motivados, inexiste a possibilidade de rescisão arbitrária. Conclui-se portanto, que no caso da Universidade, enquanto Autarquia Estadual, não é mais possível, à frente da posição externada pelo Supremo Tribunal Federal (ADIN’s nos 1721-3 e 1770-4), proceder à dispensa do empregado público, quando da aposentação.”

Por surpreendente que possa parecer, os trechos acima não são de autoria de alguma liderança sindical ou política, em defesa de uma causa corporativa. De fato, eles correspondem a itens (3 e 7) extraídos do parecer 0382/07 da Consultoria Jurídica da USP (CJ), de 22/3/2007, que instruía o Departamento de Recursos Humanos (DRH) da USP a proceder, a partir de então, à consulta dos servidores sobre sua “opção em permanecer ou não em atividade e de prosseguir a relação de emprego com a USP, em razão da concessão da aposentadoria voluntária, nos termos da legislação vigente”.

E de fato assim procedeu o DRH. O ofício DRH/CIRC/ 034/2007, assinado pela então diretora do departamento, professora Maria de Lourdes Bianchi, e tendo como referência “aposentadoria voluntária do servidor celetista”, transmitia essa orientação para os dirigentes da universidade, informando que “o desligamento dos quadros funcionais da Universidade de São Paulo passa a depender da manifestação de vontade do servidor celetista que, ao se aposentar voluntariamente pelo INSS, conforme minutas anexas do Termo de Manifestação, poderá optar ou não em prosseguir na relação de emprego”.

Foram as disposições desse mesmo oficio circular de 26/4/2007 que, por decisão do professor Joel de Souza Dutra, diretor geral do DRH da USP desde 25/8/2010, “não mais se aplicam”, conforme simples comunicação feita por e-mail às assistências técnicas acadêmicas em 11/1/2011!

Por quê?!

Aparentemente, a decisão de suspender o previsto no ofício 034/2007, a partir de 5/1/2011, se deu ao ensejo de mandar embora, ao arrepio da legislação e do cristalino entendimento em contrário desta possibilidade exarado pela CJ, quase três centenas de funcionários desta casa. A pergunta é: por quê?!

Não se tem conhecimento de alguma nova decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), ou de recente legislação superior, ou de nova orientação da CJ, que tenham passado a fundamentar que no setor público demissões sem justa causa possam ocorrer indiscriminadamente, em desobediência à legislação aplicável à Administração Pública, deixando os servidores sem garantias, órfãos dos humores das reitorias e/ou dos seus respectivos diretores de recursos humanos.

Ainda que algo de novo pudesse haver a contrariar esse entendimento, o mínimo a se exigir seria a explicitação prévia do que havia mudado, o que permitiria a justa contraposição a uma possibilidade tão perversa, como a que se decidiu executar.

Viés privado?

Sabe-se que o professor Dutra, atual diretor do DRH e docente da Faculdade de Economia e Administração (FEA), tem fortes laços com a iniciativa privada. Atua na entidade privada “Fundação Instituto de Administração” (FIA, cujo slogan é “a melhor escola de negócios do Brasil”), onde coordena projetos, e é um dos sócios da empresa Growth Consultoria, especializada em “gestão de pessoas”.

Será que esse currículo em organizações privadas, para alguém em tão destacado cargo na reitoria de uma universidade pública, determinou algum viés que ensejasse confundir a legislação e os procedimentos previstos para o setor público, com aqueles em vigor para o setor privado? Será que essa decisão foi objeto de avaliação por parte da CJ e demais setores da universidade? Será que é parte articulada de uma nova ofensiva contra o caráter público que deve reger nossas universidades estaduais?

Há quem entenda que as decisões do STF, que motivaram o parecer e orientações da CJ de 2007, colidem com outros dispositivos constitucionais, que tornariam inviável o acúmulo de proventos de aposentadoria com salários em certos casos. É legítimo que se busque esclarecer essas situações. No entanto, não se pode admitir que a USP tome uma iniciativa absolutamente arbitrária e ilegal, como a que foi tomada, à luz de uma interpretação que contraria decisões do STF e do próprio posicionamento firmado pela CJ por força dessas decisões.

 

Informativo n° 320

EXPRESSO ADUSP


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