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Paulo Vanzolini, o singular cientista boêmio
![Paulo Vanzolini, o singular cientista boêmio](https://adusp.org.br/wp-content/uploads/2013/07/vanzolini02.png)
Falecido em abril aos 89 anos, Paulo Emílio Vanzolini, professor emérito do Instituto de Biociências da USP, deixou um legado excepcional sob muitos aspectos. Reconhecido internacionalmente por suas contribuições à zoologia, em especial à herpetologia, o singular Vanzolini notabilizou-se também como compositor de canções que se tornaram clássicas na música brasileira, sempre temperadas por seu humor cáustico e uma ironia ferina.
Fancisco Emolo |
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Paulo Vanzolini |
Vanzolini dirigiu, por décadas, o Museu de Zoologia da USP. Os pesquisadores Francisco Inácio Bastos e Magali Romero Sá, da Fiocruz, classificam-no como “um dos mais importantes herpetologistas do mundo”, em artigo publicado em 2011 no qual registram o variado trabalho desenvolvido por ele, que inclui, além das publicações dos achados de suas pesquisas, “atividades de curadoria museológica, atuação na formulação de políticas científicas”, e “contribuições a diferentes áreas de conhecimento como bioestatística, biogeografia e história das ciências”.
Os pesquisadores da Fiocruz destacam as análises, feitas por Vanzolini, do legado científico de naturalistas como Spix, von Martius, Agassiz e outros, “a partir da retomada de fontes originais” e que representam “valioso repositório de informações históricas e científicas”. Contudo, eles consideram que o olhar heterodoxo de Vanzolini, sua ironia profunda (ora explícita, ora nas entrelinhas), bem como as suspeitas recíprocas existentes entre acadêmicos do campo das humanidades e acadêmicos do campo das ciências naturais, talvez tenham resultado no “modesto impacto dos escritos de Vanzolini” na corrente dominante da história da ciência no Brasil (“O cientista como historiador: Paulo Vanzolini e as origens da zoologia no Brasil”, História, Ciências, Saúde-Manguinhos, 2011).
A singularidade de Vanzolini está presente também na sua obra artística. Composições aclamadas como “Ronda” (1951) e “Volta por Cima” (1959), hoje incorporadas ao patrimônio cultural paulista e brasileiro, surgiram de modo amador, quase displicente. O autor pouco conhecia de música, confessadamente. Seu talento como compositor nasceu do espírito boêmio e da sua condição de observador mordaz das amarguras da vida. Ele próprio desdenha de “Ronda”: “É muito piegas. Tem gente que diz que ‘Ronda’ é o hino de São Paulo. Que belo hino! É a história de uma prostituta que vai matar o amante”.
“Cobras e lagartos”
O cientista e sambista também se envolvia em polêmicas com alguma facilidade. Certa vez atacou o Museu Paraense Emílio Goeldi (MPEG), de Belém, importante centro de pesquisas: “O trabalho do Museu na Amazônia é zero”, declarou Vanzolini à Folha do Meio Ambiente em 2001. Em resposta, o pesquisador Peter Mann de Toledo, então diretor do MPEG, pediu a Vanzolini para “não criar intriga” e não ser “preconceituoso”.
A antipatia de Vanzolini com o MPEG tinha relação com incidentes que remontam a 1985, quando participou de um levantamento faunístico e florístico e da população de mamíferos do Xingu. O trabalho integrava os Estudos de Impactos Ambientais (EIA) para construção da Usina Hidrelétrica Kararaô, hoje Belo Monte. Porém, como o trabalho de Vanzolini não dispunha de autorização, o Ibama confiscou a coleção de pássaros e mamíferos coletados por ele, a qual, em razão do contrato firmado entre Vanzolini e o consórcio de empresas que contratou seus serviços, seria entregue ao Museu Field de Chicago. Além disso, a direção do Ibama decidiu confiar ao MPEG a guarda do acervo apreendido.
Outra polêmica famosa deu-se com o músico Caetano Veloso, autor de “Sampa”, bela canção que homenageia a capital paulista. Ocorre que “Sampa” contém nada menos do que 14 acordes de “Ronda”, o que levou Vanzolini a acusar Caetano de plagiador. “Uma música é considerada plágio quando tem oito compassos de outra. ‘Sampa’ tem 14 compassos de ‘Ronda’. É uma citação”, declarou ao Jornal do Brasil, em 2000.
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