Democracia na USP
Sucessão reitoral à revelia da comunidade?
A Adusp acaba de enviar ofício à Reitoria da USP, requerendo desta que informe qual é o calendário do processo eleitoral de reitor ou reitora e respectivo(a) vice. O desastroso mandato da gestão M.A. Zago-V. Agopyan, que causou graves danos à instituição, aproxima-se do seu final sem que a comunidade universitária tenha ideia dos prazos relacionados ao processo sucessório indireto que determinará os nomes que sucederão os atuais reitor e vice.
O processo eleitoral vigente é profundamente oligárquico, antidemocrático ao excluir cerca de 100 mil membros da comunidade: a esmagadora maioria dos estudantes, funcionários técnico-administrativos e docentes da USP não tem direito a voto. Além disso 80% dos docentes estão impedidos de candidatar-se aos cargos de reitor e vice, pois apenas os professores titulares possuem tal prerrogativa.
Convém lembrar que, dada a vocação autoritária de M.A. Zago, os laços que cultivou com o empresariado, sua subserviência ao Palácio dos Bandeirantes e seu modus operandi (negociações sigilosas, adoção de “pacotes”sem discussão, truculência com os opositores), é bem provável que ele não só terá seus próprios candidatos, mas usará de todos os meios para impor essa chapa, capaz de dar continuidade ao projeto de “empreendedorismo universitário” hoje em curso na USP.
A reforma do Estatuto realizada no final da gestão J.G. Rodas, em 2013, restringiu-se a modernizar alguns aspectos das normas eleitorais, sem afetar seu caráter elitista. Por isso, mais uma vez, a disputa limitou-se a candidatos afinados com o campo conservador. A apresentação de candidatos a reitor, vice-reitor e dotados de um programa, mudança que sugeria um modesto porém importante avanço, não conseguiu evitar um estelionato eleitoral. Eleita, a chapa que mais falou em “diálogo” revelou-se uma completa fraude.
Manu militari
O pano de fundo dessa tragédia combinou o virtual colapso da gestão J.G. Rodas com a recusa dos diretores de unidades, que controlam metade dos votos do Conselho Universitário (Co), a aprovar a proposta de eleições diretas e paritárias para a Reitoria, no processo de reforma do Estatuto realizado no final do segundo semestre de 2013. O resultado da postura anacrônica e obtusa desses “dirigentes” é evidente hoje, quando a USP é dirigida manu militari por prepostos do governador.
Diante do quadro atual, a Adusp deu início à atualização do seu Programa Mínimo para a USP, tendo como ponto de partida as propostas de democratização da universidade apresentadas no primeiro semestre de 2014, enquanto durou o processo de reforma do Estatuto coordenado pela Caeco, depois encerrado de modo abrupto e unilateral pela Reitoria. Essa atualização poderá estabelecer uma agenda, pautada por parâmetros políticos democráticos, que permita à USP superar os descompromissos e descompassos de sucessivas gestões reitorais frente ao corpo da universidade.
As três últimas gestões representaram uma escalada de ataques à democracia e à carreira docente, bem como de permissividade em relação ao “mercado”. Suely Vilela autorizou a entrada da Polícia Militar (PM), criou a progressão horizontal, tornou-se “propagandista” do Santander, demitiu um diretor do Sintusp. J.G. Rodas inventou a Procuradoria Disciplinar, expulsou seis estudantes por questões políticas, empregou 400 homens da PM na desocupação da Reitoria, demitiu ilegalmente 270 funcionários, tolerou a criação da Faculdade FIA. Pró-reitor na gestão de J.G. Rodas, M.A. Zago parece ter aprendido muito com ele.
Não há, portanto, como fugir da constatação de que qualquer candidatura a reitor(a) que se intitule sustentável ou progressista terá de assumir compromissos que impliquem a reversão do desmonte da USP, a defesa do caráter público e gratuito da universidade e uma ampla e profunda reforma do Estatuto, que transforme a atual estrutura de poder, a começar pela democratização do processo eleitoral.
Estatuinte
Em termos mais específicos, as candidaturas realmente democráticas precisam comprometer-se com a convocação de uma Estatuinte democrática, exclusiva e soberana, que altere a composição dos colegiados de modo a garantir a paridade na representação de docentes, funcionários e estudantes, e institua mecanismo de impedimento de diretores e reitores, bem como mecanismos de combate ao conflito de interesses.
Ainda quanto à reforma do Estatuto, o compromisso deve incluir o apoio às eleições diretas e paritárias para reitor(a) e ao fim da lista tríplice, de modo que o processo eleitoral seja concluído na USP, sem a canetada final do governador.
Outras medidas necessárias, que independem da reforma do Estatuto, são:
- Reversão das restrições financeiras e administrativas adotadas contra HU, HRAC, EA, Creches, Museus e outros equipamentos;
- Reversão dos “Parâmetros de Sustentabilidade”;
- Revisão do “Estatuto Docente” e da “Nova CPA”;
- Extinção dos convênios com as fundações privadas “de apoio”;
- Denúncia dos contratos com Comunitas e McKinsey;
- Compromisso com o fortalecimento e a unidade do Cruesp;
- Denúncia do convênio com a Secretaria de Segurança Pública, retirada da PM e reorganização da Guarda Universitária.
O debate eleitoral de reitor(a) e vice precisará tratar desses temas e tópicos, ou será uma nova farsa, destinada a perpetuar os desmandos a que temos assistido. Ademais, espera-se que, desta vez, a comunidade acadêmica esteja bem mais imune a qualquer tentativa de estelionato eleitoral.
O próximo processo eleitoral precisa respeitar a comunidade.
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