Em vez de julgar habeas impetrado em 21/7, desembargador ironiza abaixo-assinado em favor de jovem preso ilegalmente

Gabriel Scarcelli e Magno Nascimento estão encarcerados há meses, em caso que envolve abuso de poder de um delegado da Polícia Federal

No dia 18/8, vinte e sete dias depois de impetrado pedido de habeas-corpus em favor do jovem Gabriel Scarcelli Barbosa (e quase dois meses após sua prisão ilegal), o desembargador Sérgio Ribas, do Tribunal de Justiça (TJ-SP), finalmente despachou no processo. Mas não para acatar ou negar o pedido — embora a lei determine que o faça em no máximo 48 horas. Ribas preferiu pedir informações à 16ª Vara Criminal, responsável pela ordem de prisão preventiva totalmente infundada que mantém Gabriel no Cadeião de Pinheiros desde 21/6.

O desembargador aproveitou o despacho para ironizar o abaixo-assinado em favor de Gabriel, com 238 signatários, que acompanhou o pedido de habeas-corpus. "Tangente ao abaixo-assinado cabe referir que é elevado o número de aderentes. Por elevado, caberia dizer do excesso, e, portanto, do exagero. Pertinente ao exagero, urge lembrar: ‘Enfraquece-se sempre tudo que se exagera’ (La Harpe). E ainda: ‘Um exagero é sempre a exageração de algo que não o é’ (Ortega y Gasset)".

Totalmente deslocados frente ao drama de Gabriel, os comentários insensíveis de Ribas chocaram os amigos da família. "Quem poderia não ser militante diante de uma injustiça? Qual mãe e qual pai estariam tranquilos e pacientes esperando tanto tempo?", indaga Luis Galeão, professor do Instituto de Psicologia (IPUSP). O abaixo-assinado conta atualmente com 500 assinaturas.

Trabalhador

O caso da perseguição de Gabriel pelo delegado Kleber Massayoshi Isshiki, da Polícia Federal (PF), foi narrado em detalhes no Informativo Adusp 403. Mas outros jovens amigos seus também foram alvo de investigações totalmente irregulares promovidas por Isshiki e dos pedidos de prisão que encaminhou à Justiça Federal e, depois, à Justiça Estadual. O caso mais grave é o de Magno Nascimento, de 28 anos, preso no Cadeião do Belenzinho desde 9/4.

Maria Gildete da Silva Nascimento, mãe de Magno, explica que nos últimos quatro anos ele trabalhou na conhecida Pizzaria "1900" e que nunca se envolveu em problemas com a Polícia ou a Justiça. "Ele nunca fez nada de errado. Foi a primeira vez que precisou ir em delegacia. Sempre foi um menino trabalhador. O delegado jogou vários processos de roubo em cima dele. Mas todo mundo sabe que ele nunca roubou".

Magno foi preso durante uma audiência de um dos processos em que figurava como acusado, à qual compareceu livremente, por estar convencido de que poderia provar sua inocência. "O juiz nem deixou ele falar, mandou levar embora", relata Gildete. A prisão, acrescenta, se deveu ao fato de que ele se recusou a fazer o reconhecimento de um primo, apontado pelo delegado da PF, vítima de um assalto à mão armada em 2013, como autor do crime.

"Manipulação"

A pedido das famílias, o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe) está investigando o caso. "Estamos tentando apurar eventual violação de direitos humanos. Ainda não terminamos a apuração porque estamos aguardando que outros jovens envolvidos prestem depoimento", explicou Rildo Marques, presidente do Condepe, ao Informativo Adusp. "Se confirmado o que eles [Gabriel e Magno] estão dizendo, estaremos diante de um caso de tortura, ocorrida dentro das dependências da Polícia Federal em São Paulo e praticada por policiais federais".

Rildo confirmou a informação de Gildete quanto ao verdadeiro motivo da prisão de Magno. "Eles sofreram constrangimento psíquico e foram forçados à identificação de um criminoso. Como não efetuaram o reconhecimento, foram ameaçados e parece que essa ameaça se cumpriu. Os demais [jovens], que efetuaram o reconhecimento, saíram ilesos. Os que não reconheceram saíram como criminosos".

O presidente do Condepe relatou que também está solicitando informações à Polícia Civil, para saber como se deu a participação dessa instituição nas investigações conduzidas por conta própria pelo delegado da PF. "Pelo relato dos acusados, parece que houve uma investigação dirigida e manipulação de informações, com o propósito claro de beneficiar a atuação questionável por parte do delegado-vítima", diz Rildo.

Procurada pelo Informativo Adusp para comentar o caso, a Polícia Federal não se manifestou até o fechamento desta edição.

Informativo nº 404

EXPRESSO ADUSP


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