A Congregação da Faculdade de Direito (FD) da USP aprovou por unanimidade, em reunião realizada em 27/5, parecer redigido pelo jurista e professor Jorge Luiz Souto Maior, segundo o qual “a greve, vista pela ótica do Direito Social”, “é um instrumento a ser preservado”. Ainda segundo o parecer endossado pela FD, ao direito não compete limitar a greve, mas “garantir que possa ser, efetivamente, exercida”. No mesmo dia, a Congregação da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) aprovou moção dirigida ao reitor, em que manifestou-se “pelo respeito ao direito de greve previsto na Constituição brasileira”.

O documento aprovado na FD foi redigido pelo jurista após o pedido da Reitoria, encaminhado aos diretores das unidades, de listas de funcionários em greve. Como o órgão central da universidade havia anunciado, em comunicado de 4/5, dia anterior ao início da greve, que não haveria pagamento dos dias parados, a requisição da Reitoria foi entendida como mais uma tentativa de intimidar o movimento.

O corte de ponto se concretizaria no dia 7/6, afetando cerca de mil funcionários, a maioria deles ligados à Coordenadoria do Campus da Capital (Cocesp, antiga PCO), à Coordenadoria de Assistência Social (Coseas) e aos campi de São Carlos e Ribeirão Preto.

“Democracia”

A deliberação da FD reafirma o caráter democrático da greve: “Em uma real democracia deve-se abarcar a possibilidade concreta de que os membros da sociedade, nos seus diversos segmentos, possam se organizar para serem ouvidos. A greve, sendo modo de expressão dos trabalhadores, é um mecanismo necessário para que a democracia atinja as relações de trabalho.”

Opondo-se ao corte de salários, entendido como uma ameaça ao efetivo exercício do direito de greve, o documento afirma: “Só há direito à greve com garantia plena à reivindicação por parte dos trabalhadores, pois, afinal, os trabalhadores em greve estão no regular exercício de um direito, não se concebendo que o exercício desse direito seja fundamento para sacrificar o direito à própria sobrevivência, que se vincula ao efetivo recebimento de salário.”

Em sua conclusão, o parecer redigido por Souto Maior fala especificamente da USP: “No caso específico da Universidade de São Paulo, além de tudo isso, há o aspecto relevante de que está historicamente incorporado ao patrimônio jurídico dos trabalhadores o direito ao efetivo exercício da greve sem a ameaça anti-sindical do desconto do salário dos dias parados. Qualquer alteração neste sentido, portanto, além de ilegal, representa um grave desrespeito ao instituto do direito adquirido e à tradição democrática da Universidade.”

No Supremo

O artigo 9º da Constituição Federal assegura o direito de greve a todos os trabalhadores. Já o texto original do inciso VII do artigo 37 da Constituição assegura o exercício do direito de greve pelos servidores públicos civis, a ser regulamentado através de lei complementar. Esta lei nunca foi elaborada, e o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) foi de que o direito de greve dos servidores dependeria de regulamentação, como se verifica nos Mandados de Injunção (MI) 20/DF e 438/GO. No entanto, esse entendimento não foi unânime entre os ministros do STF.

Como afirmou o ministro Marco Aurélio de Mello, a greve é um fato, decorrendo sua deflagração de fatores que escapam aos estritos limites do direito positivo, ou seja, das leis (MI 438/GO). Em votos vencidos nos dois MIs, o ministro afirmou que a validade do direito independe de edição de lei. “Não creio que, na espécie, a Constituição contemple a outorga de um direito, deixando-o em suspenso, na dependência da vontade política do legislador comum, como se os fatos que o revelam pudessem, em passe de mágica, ser olvidados”, anotou Marco Aurélio. “A greve prescinde, para ocorrência, das noções de conveniência e oportunidade, enquanto jungida à atividade legiferante”, afirmou em seu voto quanto ao MI 20/DF.

Igual entendimento teve o ministro Sepúlveda Pertence, para quem a expressão “nos termos e limites da lei” significava apenas que o direito poderá ser limitado, regulado, e não que ele fica suspenso, à espera da lei. Assim, declarada a existência do direito de greve, este pode ser exercido, independendo de legislação inferior.

Através de emenda constitucional de 1998, o inciso VII do artigo 37 da Constituição foi alterado, passando a exigir somente “lei específica”. Como já existia lei específica sobre o assunto, a Lei nº 7.783/89, que regulamenta o direito paredista do trabalhador em geral, o STF, julgando o MI 712/PA, reconheceu expressamente o direito de greve dos servidores públicos e decidiu pela aplicação analógica da lei existente, no que for cabível. Embora o reconhecimento desse direito seja, obviamente, um avanço, seria preferível não subordiná-lo a quaisquer restrições legais que possam vir a embaraçar seu pleno exercício.

 

Informativo nº 311

EXPRESSO ADUSP


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