O Conselho Universitário (Co) reuniu-se extraordinariamente em 24/5, para tratar exclusivamente da definição do reajuste salarial de docentes e funcionários técnico-administrativos da USP. A medida vincula-se aos planos da gestão M.A. Zago-V. Agopyan de esvaziamento do Conselho de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas (Cruesp).

Apesar de sua retórica sobre transferir a decisão do reajuste para o colegiado, o reitor comportou-se de forma extremamente autoritária na reunião: impediu que fossem a voto as diversas propostas de reajuste — apresentadas por representantes de congre­ga­ções e dos funcionários — com índices superiores ao definido no Cruesp, de 3%.

Assim, o Co limitou-se a referendar os 3% de reajuste propostos pelo Cruesp, em contrapo­si­ção à proposta apresentada pela Comissão de Orçamento e Patrimônio (COP), de zero por cento de rea­jus­te. O índice sugerido pelos reitores recebeu 66 votos, contra 17 conferidos à proposta da COP. Abstive­ram-se 16 conselheiros: docentes, funcionários e estudantes.

“Dificuldades”

Na intervenção inicial, o reitor declarou que “as três universidades estaduais paulistas têm uma coisa em comum: todas enfrentam dificuldades financeiras”, ressalvando que apesar disso “há uma diferença na situação específica de cada uma das universidades”. Assim, continuou, “concordamos em fazer uma oferta de reajuste de 3%”, a qual “cabe eventualmente no orçamento” da USP, Unesp e Unicamp.

“Acordamos este índice e é ele que eu trouxe para avaliação por parte deste conselho”, prosse­guiu. “O alerta que a COP nos traz precisa ser considerado com toda a atenção. O que eles estão dizendo é: não há condições de nem mesmo um reajuste de 3%”.

O reitor explanou longamente, procurando influir na votação, apesar de alegar o contrário (“Não me cabe orientar o Conselho Universitário, mas…”). Ele depreciou o Cruesp como fórum institucional capaz de negociar e deliberar a respeito de reajustes unificados.

“Eu vou ler o decreto de criação do Cruesp [26.914/1987], para que fique claro para todos que o Cruesp não é um órgão deliberativo e não existe hierarquia entre Cruesp e as reitorias”. Após a leitura, acrescentou: “Portanto, o Cruesp é um órgão de integração, de assessoramento do governador, e com o tempo, enten­deram os reitores que poderia servir como instrumento para tentar dar isonomia ao tratamento salarial entre as universidades. Jamais passou pela cabeça de quem criou, ou pela cabeça de quem frequenta o Cruesp, que tal órgão tivesse qualquer atividade no sentido de tomar decisões com relação a qualquer coisa que diz respeito às universidades”.

Ele se referiu à “experiência amarga nos anos passados, em que reajuste e outros benefícios foram concedidos sem que o Co estivesse plenamente consciente do que estava acontecendo”. Reduziu a questão da contratação de docentes a um problema contábil: “Querem contratar novos docentes? Eu também quero. Eu acho fundamental para a vida da universidade. Quanto custa um docente novo? R$ 153 mil ao ano. Façam as contas!”

Recusa imperial

Bruno Sperb Rocha, representante dos funcionários, apresentou uma tripla moção de encaminha­men­to: 1) “que o Conselho possa liberar o reitor para negociar. Ou seja, não fixar aqui um percentual. É o que acaba de ser aprovado no Co da Unesp por 45 votos contra 25”; 2) “se o Conselho votar sim ou não ao parecer da COP, no caso de vencer o não, que se ponha em votação tanto a proposta do Cruesp quanto a reivindicada pelo Fórum da Seis (12,34%)”; 3) “se nenhuma das minhas moções for acatada, queria adiantar que não podendo me manifestar pelo 12,34% eu já declaro que é esse o conteúdo da minha abstenção, e proponho a todos os conselheiros fazer dessa forma”.

M.A. Zago recusou-se a acatar esse encaminhamento. “As três propostas estão denegadas, e eu explico por que. Não farei qualquer negociação sem um índice definido por este conselho. Particularmente, propostas que vão além de 3%: eu já encontrei dentro da universidade, em seus órgãos representativos, uma resistência à aceitação”.

Continuou: “Para mim, é lícito entender que aqueles que rejeitarem o parecer da COP são pessoas que acham que tem que dar algum reajuste e o limite desse reajuste possível é de 3%. Quem for favorável ao reajuste de 3%, votará ‘não’; quem entender que não deve se dar um reajuste, deve votar ‘sim’; e aqueles que se abstiverem é porque não estão de acordo com nada e esperam que um dia o mundo mude”.

Abstenções

O abuso de poder do reitor, definindo ele próprio um “teto” para as propostas de reajuste do Co, provocou críticas de conselheiros que tiveram de se abster.

“O professor Zago colocou em votação o parecer da COP, contrário à concessão de reajuste de 3%. Houve várias propostas alternativas, mas o sr. reitor decidiu não submetê-las ao plenário. Na votação, ganhou por larga margem a proposta de rejeitar o parecer da COP e conceder 3% de reajuste. Abstive-me, por entender que as demais propostas alternativas, levantadas por diversas congregações (FE, IP, EE), também deveriam ir a votação”, declarou ao Informativo Adusp o professor Marcelo Ferreira, representante da Congre­ga­ção do ICB.

“Pessoalmente acho mais apropriado que uma decisão sobre reajuste salarial passe pelo Co em vez de ser tomada monocraticamente”, ponderou Ferreira. “No entanto, é preciso lembrar que quase a metade do Co é composta por representantes de congregações. Portanto, é preciso que as congregações tenham o hábito de discutir os temas levados ao Co (inclusive os índices de reajuste salarial) para que essa representação de fato funcione”.

“A reunião do Co de 24/5 seria uma oportunidade magnífica para a atual gestão e o Co entenderem que mais importante do que as questões propriamente financeiras é que a Universidade de São Paulo possa neste momento dialogar com a comunidade universitária”, comentou a professora Ana Loffredo, representante do IP e que também se absteve na votação. “A questão não é apenas a gente ver se vai dar 3% ou 0%, e sim abrir o diálogo com as categorias”.

“Jogo de cena”

Bruno Sperb Rocha, membro do Co e diretor do Sintusp, acredita que o parecer da COP é fruto de uma encenação: “A divergência entre o reitor, como parte do Cruesp, e a COP, serviu como um jogo de cena para que o reitor se localizasse como generoso, como quem está fazendo mais do que o possível. Na verdade, é uma proposta que o próprio Cruesp, na reunião de negociação, chamou de ‘ridícula’. Por isso, eu propus como encaminhamento que fosse posta em votação, caso o parecer da COP propondo 0% fosse recusado, não só a proposta de 3% do Cruesp, mas a proposta do Fórum das Seis de 12,34% de reajuste”.

Fabiana Oliveira, representante discente (RD) dos pós-graduandos, atribui a atitude da Reitoria à lógica que orienta a atual gestão: “as crises são aproveitadas para a implementação de um outro modelo de universidade”. Explica por que se absteve: “Diversos conselheiros apresentaram outras soluções, com a sugestão de que também fossem submetidas a votação, mas o reitor as ignorou. Qualquer reajuste que não permita ao trabalhador recuperar a capacidade de consumo tolhida pela inflação acumulada fatalmente nos levará ao mesmo impasse em que nos vimos em 2014”.

No entender do pós-graduando Douglas Anfra, também RD, “a abstenção se mostrou como a única posição possível de um ponto de vista democrático e republicano”. A seu ver, a postura do reitor é “coerente com a demonstração de desrespeito no tratamento dos conselheiros que representam funcionários e estudantes”, e “não inova em relação às posturas políticas da Reitoria frente a qualquer manifestação de discor­dân­cia, que vai, desde o comentário a cada fala de conselheiro, construindo oposições em que coloca a sua posição como a única racional e cabível”. Ele criticou o modo jocoso como o reitor se referiu às propostas alternativas.

Informativo nº 419

EXPRESSO ADUSP


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