Programa de bônus é equivocado, diz Marcelino

Diretor da Adusp participa de debate com a secretária estadual da Educação

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Marcelino, Maria Helena, Dimenstein, Ramiro e Andrade

O jornal Folha de S. Paulo promoveu, em 10/3, debate sobre a proposta da Secretaria Estadual da Educação (SEE-SP) de instituir um programa de bônus para professores da rede pública estadual que se destacarem. Mediado pelo jornalista Gilberto Dimenstein, o debate reuniu a secretária estadual da Educação, Maria Helena Guimarães de Castro; o presidente do Sindicato dos Professores da Rede Estadual (Apeoesp), Carlos Ramiro de Castro; o diretor regional da Adusp em Ribeirão Preto, professor José Marcelino de Rezende Pinto; e Eduardo de Carvalho Andrade, professor da Faculdade Ibmec.

“Acreditamos que temos que valorizar as boas equipes, os bons professores”, declarou Maria Helena. A secretária informou que o projeto de lei que cria o programa será encaminhado à Assembléia Legislativa até abril: “Uma comissão está fechando os indicadores”.

“Temos que encarar os problemas com realismo e com coragem. O bônus é importante? É. É para valorizar a equipe? É. É para representar um estímulo a mais além da política salarial, que não substitui o bônus? É. Nós somos contra simplesmente a isonomia salarial, eu em particular sou contra, não posso falar pelo governo. Nós temos que valorizar sim os talentos, projetos criativos, e ter uma carreira que valorize os profissionais de educação cada vez mais”.

“Brincadeira”

O presidente da Apeoesp rejeitou a adoção da política de bônus: “Vamos acabar com essa brincadeira de que o salário não é importante. Quando assumo compromissos, assumo baseado no meu salário, e não numa gratificação, num possível prêmio”.

A rede estadual, disse Ramiro, sente a “falta dos materiais pedagógicos mais simples”, bem como “falta de recursos humanos: funcionários, vigias, técnicos”. Denunciou superlotação das salas de aula: “Tivemos o fechamento de mais de 300 escolas nos últimos dez anos, e de milhares de salas de aula”.

Ele defendeu a criação de um plano de carreira para a categoria, pois a política atual faz a rede perder professores que procuram aperfeiçoar-se: “Se consegue doutoramento, como o salário é muito baixo, ele vai para a universidade ou para outro setor do mercado. Temos que pensar em uma política salarial, um plano de carreira”. Ele criticou a SEE-SP por implantar projetos sem escutar os educadores nem discutir com a comunidade.

“Milagres”

Eduardo Andrade surpreendeu ao receitar medidas mais radicais do que o programa da SEE-SP. Ele considera que a proposta de bonificação do governo estadual “tem pontos de partida bem interessantes”, tais como “a necessidade de uma gestão mais profissional das escolas”, “metas bem definidas e um sistema de incentivos adequado”. A idéia fundamental seria “responsabilizar professores e diretores pela qualidade do ensino que é recebido pelos alunos”. Na sua opinião, “o bom professor tem a capacidade de fazer milagres”.

Porém, Andrade pensa que é “errado pagar salários iguais para todos os professores”, uma vez que a “premiação de todos os professores das escolas que cumprirem as metas é injusta, é o efeito carona. O programa não separa o joio do trigo”.

Segundo o professor do Ibmec, “na verdade São Paulo simplesmente está copiando um modelo adotado nos Estados Unidos”, mas, ao contrário do que ocorre naquele país, “a política de São Paulo não tem mecanismo de punição”. Nos Estados Unidos, informou, há estados em que escolas que não alcançam a meta são fechadas e os alunos têm o direito de escolher outra escola, pública ou privada (o chamado “voucher”).

Prêmio, não

“Uma escola de qualidade tem um custo, e esse custo não é pequeno”, destacou o professor Marcelino, lembrando que a educação pública precisa de recursos. “Dinheiro faz diferença”, frisou. Qualquer aluno de escola particular de classe média no Brasil, explicou, recebe em recursos investidos nele pelo menos três vezes o que o país gasta com um aluno da rede pública.

O diretor da Adusp situou 1995, ano em que ocorreu a reorganização da rede física, como ponto crítico da história do ensino estadual em São Paulo. “Eu chamo de ‘reforma Jack, o Estripador’. As escolas de ensino fundamental foram repartidas ao meio: primeira a quarta, quinta a oitava, ou eventualmente ensino médio. Naquele momento o Conselho Estadual [de Educação] se omitiu. São Paulo tinha a oportunidade de ter o que o resto do mundo tem: uma escola pública única. São Paulo perdeu essa oportunidade. Na época denunciávamos que aquilo tinha a função de municipalizar, e foi o que ocorreu”.

“A rede estadual, que tinha 87% dos alunos, ficou com 57%. De primeira a quarta ela só tem 38% das matrículas”. Por isso, disse, qualquer política de ensino fundamental deve envolver as duas redes. “Um debate desses tem que envolver o Conselho Estadual, tem que envolver Undime [União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação]. Não adianta pensar em políticas pontuais”.

Marcelino sustentou que a lógica da política de bônus faz aumentar o risco de desigualdades no interior do sistema, pois os professores experientes tenderão a se afastar das escolas cujos alunos apresentam notas mais baixas —exatamente as escolas das regiões mais pobres. “Parte-se do pressuposto implícito de que o professor não ensina porque não quer”. Para ele, a experiência chilena de introdução de mecanismos de mercado na educação se mostrou um desastre.

O caminho é outro, defendeu o diretor da Adusp: “Nem prêmio, nem castigo, os professores precisam de condições adequadas de trabalho” — e de uma política de avaliação que não seja centrada só em testes padronizados, mas que envolva pais, alunos e os próprios profissionais da educação.

Não decide

Em resposta a uma pergunta, a secretária da Educação afirmou não ter qualquer ingerência na política salarial: “Não faço parte do grupo que decide”, declarou, citando a Secretaria de Gestão e a Secretaria da Fazenda como as responsáveis. Para ela, turmas superlotadas “são pontuais” e a SEE-SP está “buscando uma solução” para o problema.

 

Matéria publicada no Informativo nº 254

EXPRESSO ADUSP


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