Audiência pública sobre USP Leste desnuda insensibilidade e intransigência da Reitoria

A audiência pública sobre a crise e as questões ambientais da Escola de Artes, Ciências e Huma­ni­da­des (EACH), realizada na Assem­­bleia Legislativa em 24/4, escancarou a frieza tecnocrática e a insensibilidade com as quais a Reitoria da USP vem conduzindo o caso, em detrimento de docentes, estudantes e funcionários técnico-administrativos da EACH e de um cronograma efetivo de medidas saneadoras. O vice-reitor Vahan Agopyan, representando o reitor, tergiversou quanto às críticas ao “gestor da crise”, professor Osvaldo Nakao; manifestou desinteresse por uma proposta de equacio­na­mento da crise apoiada pelos depu­tados; e após interromper a explanação de uma docente da unidade, integrante da Congregação e diretora da Adusp, desdenhou das afirmações dela, provocando indignação.

Convocada pela Comissão de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana, da Cidadania, da Participação e das Questões Sociais, a audiên­cia também mostrou uma atitude titubeante da Cetesb, cujo representante, o geólogo Elton Goelden, fez afirmações que minimizaram os riscos apontados antes pela própria agência ambien­tal em diversos documentos.

Daniel Garcia
Vahan, Diogo, aluna Júlia Mafra e Neder

Compuseram a mesa, juntamente com Vahan, Goelden e o presidente da Adusp, professor Ciro Correia, os deputados Adriano Diogo (presidente da Comissão de Direitos Humanos), João Paulo Rillo, Carlos Neder e José Zico Prado, todos da bancada do PT. Também compareceram, mas permaneceram no plenário, o pró-reitor de Graduação, Antonio Carlos Ernandes, e Nakao, superin­ten­dente do Espaço Físico.

Soluções?

Ao longo de quatro horas, o que se viu foi a Reitoria e a Cetesb apresentando mais uma vez dados incertos e promessas, enquanto a comunidade cobrava objetividade e um crono­gra­ma de ação. Logo no início, a professora Adriana Tufaile apresentou a atual situação da EACH, dirigindo-se especialmente aos calouros ali presentes que ainda não conheceram o campus, e apontou os locais onde foram encontrados contaminantes no solo.

O vice-reitor e o representante da Cetesb comportaram-se como se a contaminação do campus leste e os riscos de explosão associada ao metano fossem meras hipóteses remotas. Vahan chegou a afirmar que, “se forem realmente localizadas [contaminações], nosso interesse é fazer daquilo objeto de estudo”, mas também admitiu que “a questão do solo pode ser muito mais grave do que estamos imaginando”. Goelden, por sua vez, comentou que os resultados apre­sen­tados pela USP demonstram concentrações baixas de contaminantes, que “não indicam um risco iminente ou uma situação de risco grave que necessite remover as pessoas de lá ou remover o solo amanhã”, mas emendou que “logicamente existe um problema, temos alguns contaminantes”.

O técnico procurou justificar a autorização dada pela Cetesb para implantação da EACH na área. A única condição dada pela Cetesb para a construção da USP Leste, garantiu, foi a implantação de um mecanismo de drenagem de metano, já que na ocasião o depósito de terra contaminada ainda não havia acontecido. A implantação de colchões drenantes possibilitou a autorização da obra, afirmou. Porém, como o sistema nunca foi colocado em funcionamento, testá-lo é uma das condições para a desinterdição do campus.

Respeito

Docentes e estudantes rebateram Vahan e Goelden e cobraram respeito à comu­ni­dade. Citaram não apenas as questões ambientais, mas também o chamado “Plano B” adotado pela Reitoria, que prejudica a realização das aulas, pela distância entre os campi que estão sediando os cursos, falta de estrutura adequada e de bibliotecas e laboratórios, o que inviabiliza as atividades de pesquisa e extensão. O processo disciplinar contra três estudantes que ocuparam a administração central da EACH em 2013, para exigir negociações com o então vice-diretor Edson Leite, também foi apresentado como um desrespeito àqueles que lutam por uma universidade melhor.

“A visão que a universidade tem de nós, que estamos mobilizados e somos  professores, alunos e funcionários, é muito diferente do que a gente sente e do que a gente está fazendo de verdade. Nós estamos defendendo a USP, nós não estamos contra a USP!”, declarou a professora Elizabete Franco.

O professor Ciro Correia ressaltou que é contrafactual tentar minimizar o risco de explosão no campus, diante de documentos como o laudo do engenheiro José Roberto Falconi, apresentado ao Ministério Público em fevereiro de 2014, que constata em um dos edifícios da EACH a presença de mistura metano-ar na faixa de inflamabilidade. Em relação aos processos, disse: “É preciso que a Universidade pare de ter um comportamento esquizofrênico entre aquilo que suas autoridades administrativas dizem e aquilo que a Procuradoria [Geral da USP] faz contra quem não merece ser atingido. Não chegou um oficial de justiça na porta do ex-diretor da unidade, não chegou um oficial de justiça para investigar quem foi beneficiado financeiramente com esse crime ambiental, mas por solicitação e iniciativa da Universidade, nos estudantes que fizeram parte da luta, chegou!”

Ciro enfatizou a importância de se encontrar solução que tenha lastro de credibilidade antes de ser adotada, o que pressupõe transparência da Reitoria. Ele propôs a realização de um seminário no qual a administração apresente quais medidas pretende adotar antes de assumir como solução um compromisso que não tenha sido tratado publicamente. Mesmo com a defesa dessa proposta pelos deputados presentes, o vice-reitor foi inflexível. Após citar expressamente o reitor, a comissão especial (“notáveis”) e ele próprio, Vahan, decla­rou: “Se estivermos convencidos”, disse, “de que há uma solução sem riscos para a comu­nidade, ela será implementada”.

Convocação

As acusações de Osvaldo Nakao aos professores da EACH foram amplamente rebatidas e duramente criticadas na audiência. O deputado Carlos Neder afirmou que a vídeo com o pronunciamento foi exibido na Alesp em 23/4 e que, diante do desrespeito aos professores e também aos deputados, a Comissão de Direitos Humanos aprovou por unanimidade a convocação do reitor Marco Antonio Zago para depor a respeito do assunto. “Não se trata de um convite, é uma convocação!” afirmou Neder, explicando que o eventual não comparecimento do reitor implicaria crime de responsabilidade.

Várias pessoas manifestaram-se exigindo a substituição de Nakao, contra a qual o vice-reitor, contudo, prontamente se pronunciou: “É errado crucificar alguém por um erro”. Vahan declarou que a Reitoria tem “confiança” no atual dirigente da SEF e que ele merece “respeito”. O presidente da Adusp, então, contestou a posição do vice-reitor, lembrando que a questão é de natureza política, não envolve quaisquer considerações de ordem pessoal ou de desrespeito a Nakao: “Estarrece que a Reitoria não se dê conta disso”.

Os estudantes insistiram que não seria possível encerrar o evento sem que a Reitoria se comprometesse minimamente com três pontos: 1) marcar uma reunião com docentes, alunos e funcionários da EACH, 2) substituir Nakao enquanto interlocutor para as questões da EACH, 3) retirar os processos contra os estudantes.

Por fim, o vice-reitor se comprometeu a realizar uma reunião entre ele e a EACH, no lugar da reunião com o reitor, que já fora solicitada oficialmente e não atendida. Quanto aos processos, Vahan disse que não sabia deles, mas incumbiu o pró-reitor de Graduação, “que também não está a par”, de cuidar do assunto.

Informativo nº 380

EXPRESSO ADUSP


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