Uso de acaricidas no campus de Ribeirão Preto provoca danos, advertem docentes

Parecer técnico da Superintendência de Controle de Endemias (Sucen) também aponta problemas no plano da Prefeitura do campus

Uma suposta infestação de carrapatos-estrela na USP de Ribeirão Preto fez com que a Prefeitura do Campus implantasse, em novembro de 2011, um plano de contenção do problema. As medidas adotadas causam protestos de docentes, que argumentam ter havido pouco diálogo sobre o assunto com a comunidade acadêmica ligada à área ambiental. Além disso, são apontadas dúvidas quanto ao acerto do conjunto de ações idealizadas e coordenadas pelo agrônomo Carlos Alberto Perez, que não tem vínculo funcional com a universidade.

Vista aérea do lago no campus de Ribeirão Preto, notando-se à esquerda a localização de um dos bandos de capivaras. A USP quer conter os animais, alegando risco de febre maculosa

Professores da área de Biologia da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCLRP) encaminharam representação ao Ministério Público (MP), em que solicitavam providências: “Em novembro do ano passado, foi realizada audiência na qual apresentamos as nossas restrições”, conta a professora Elenice Mouro Varanda. Segundo a representação ao MP, “o conjunto de ações propostas pela Coordenadoria é inviável ambientalmente e apresenta segurança questionável à saúde dos usuários do campus”. 

O documento sustenta que o projeto adotado pela Coordenadoria é falho por não detalhar os métodos de aplicação e de monitoramento do acaricida escolhido (piretróide), que pode contaminar pessoas, em especial as crianças da creche existente no campus. No entanto, a representação foi arquivada em julho último: “O MP alega que o veneno utilizado é autorizado para ser aplicado sem causar danos ao ambiente”, completa Elenice. 

Ao Informativo Adusp, o prefeito Osvaldo Bezzon disse ter havido diálogo: “No dia 6 de outubro de 2011, a Prefeitura do Campus convidou pesquisadores, principalmente da FFCLRP, e o Presidente da Comissão de Meio Ambiente, para reunião que aconteceu no dia 7 de outubro de 2011 na sala do Conselho Gestor, com o agrônomo Carlos Alberto Perez, consultor junto à diretoria e coordenador de pesquisas e controle do carrapato-estrela no campus da Esalq-USP”, destinada ao “mapeamento das pesquisas em desenvolvimento no campus e esclarecimentos quanto às ações referentes ao combate dos carrapatos”. 

A contratação do consultor teria sido sugerida pelo promotor de justiça, revela o prefeito: “O nome do agrônomo Carlos Alberto Perez surgiu em reunião do professor Sebastião de Almeida, então diretor da FFCLRP, no Ministério Público. O MP chamou o professor Sebastião em função da presença de gambás com carrapatos no campus (…). Como o professor Sebastião informou que na FFCLRP não existia especialista nesta área, o próprio promotor citou o nome do agrônomo Carlos Alberto Perez, pois sabia do ocorrido na Esalq, em Piracicaba”.

Febre maculosa

Em parecer técnico divulgado em novembro de 2011, o Núcleo de Estudos de Doenças Transmitidas por Carrapatos da Superintendência de Controle de Endemias de São Paulo (Sucen) destacou problemas no plano de trabalho proposto para o campus de Ribeirão Preto: falta de informações sobre o número de pessoas parasitadas e sobre as áreas que frequentam, a fim de delinear de forma precisa a região a sofrer intervenções; pouca clareza quanto às metodologias utilizadas para a contenção dos carrapatos; e ausência de explicações sobre a metodologia utilizada para identificação de vetores transmissores da febre maculosa, transmitida pelo carrapato-estrela.

“A febre maculosa se inicia com dores de cabeça e, se não for tratada logo, tem grande chance de levar à morte”, explica Adriano Pinter, técnico da Sucen, que não recomenda o uso de acaricidas no ambiente, por serem extremamente tóxicos para peixes, abelhas e outras espécies. “Mesmo que o produto tenha uma eficiência para a eliminação de 95% dos carrapatos, ainda restam 5% no ambiente suficientes para continuar o ciclo e manter a infestação alta”, diz Pinter. 

Uma forma de controle de carrapatos, explica o técnico da Sucen, é o corte da grama, ou roçagem, “que permite que _raios solares incidam diretamente no solo matando os ovos dos carrapatos; mas para que isso funcione, a roçagem deve ser feita no final do verão, nos meses de fevereiro e março”, ou seja antes da eclosão dos ovos. “A única forma definitiva de conter a população de carrapatos é diminuir a população de capivaras”, afirma Pinter, “mas é muito importante que isso seja feito de forma gradual, não se deve retirar animais do local ou colocar cercas que separem os animais da fonte de alimento, pois isso desequilibra o bando e pode fazer com que os animais migrem para outros lugares transferindo o problema para outras partes”.

A professora Kátia Ferraz, que leciona Ciências Florestais na Esalq,  disse ao Informativo Adusp que, naquele campus, os resultados do uso de acaricida não foram animadores. “Depois que o projeto de contenção começou a funcionar, a infestação de carrapatos não melhorou; pelo contrário, temos a forte impressão de que piorou muito em várias áreas. Hoje, temos carrapatos em regiões em que não tínhamos  antes”. 

Capivaras

Além da aplicação de acaricidas, o projeto implantado no campus de Ribeirão Preto prevê cercar as áreas onde vivem os seus hospedeiros, as capivaras. Acredita-se que a presença desses animais esteja relacionada à infestação. E, se picadas por carrapatos infectados pela Rickettsia rickettsii, bactéria causadora da febre maculosa, elas se tornam fonte de infecção. 

Patrícia Monticelli Almada, professora da FFCL-RP, está fazendo um levantamento da população de capivaras no campus Ribeirão Preto desde março: “Não vejo descontrole no número de capivaras. Meu estudo, ainda que não esteja completo, não me leva a achar que haja mais do que 50 animais aqui. E a literatura considera de 40 a 60 animais uma população baixa”. As áreas ocupadas por eles totalizam 63 hectares e estão em íntima associação com fontes de água: o lago e o córrego Laureano. “Não tivemos nenhum caso comprovado de febre maculosa na USP Ribeirão Preto e nenhum carrapato foi retirado diretamente de uma capivara. Precisamos de tempo para o devido estudo epidemiológico”. Patrícia chama atenção para os riscos da contenção de capivaras: “São animais territorialistas e agressivos, é complicado cercá-los. A situação pode levá-los a matarem uns aos outros” . 

 

Informativo nº 350

 

O Projeto Políticas promovido pela ADUSP Regional Ribeirão Preto,
convida os docentes para Mesa Redonda:

Capivaras e Carrapatos: Estratégias de Manejo

 

 

EXPRESSO ADUSP


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