No retorno aos laboratórios, Escola de Engenharia de São Carlos provoca protestos por impor aos pós-graduandos assinatura de “termo de ciência e responsabilidade”
07/08/2020 17h48
COMPARTILHE
Encaminhado pela Diretoria da unidade, documento a ser assinado por cada pesquisador(a) individualmente ignora o plano institucional de retomada das atividades presenciais e diz que “ciente e a despeito dos perigos inerentes ao cenário da atual pandemia e das potenciais consequências que dela podem advir, decidi realizar, sob minha conta e risco, atividades de pesquisa presenciais para complemento de minha formação acadêmica”. Além de repudiar a imposição, APG e Fórum de Representantes Discentes da USP São Carlos reivindicam que o retorno às atividades presenciais em laboratórios seja facultativo
A decisão da Diretoria da Escola de Engenharia de São Carlos (EESC) de impor aos pós-graduandos a assinatura de um “Termo de Ciência e Responsabilidade”, mediante o qual os signatários assumem as eventuais consequências de contaminação pelo novo coronavírus (Covid-19), foi objeto de repúdio da Associação de Pós-Graduandos e do Fórum de Representantes Discentes da USP São Carlos, segundo os quais o documento “abre brechas claras para a exigência da presença dos pós-graduandos nos laboratórios enquanto exime a Universidade da responsabilidade sobre as consequências do trabalho presencial”.
Em mensagem encaminhada ao vice-reitor Antonio Hernandes, coordenador do Grupo de Trabalho incumbido de planejar a retomada das atividades presenciais na USP, o professor titular Marcelo Zaiat, coordenador do Laboratório de Processos Biológicos do Departamento de Hidráulica e Saneamento da EESC — que reúne 38 pesquisadores de mestrado, doutorado, pós-doutorado e iniciação científica e quatro docentes — juntou-se ao protesto: “Em nenhum momento o termo cita o Plano de Retorno e joga completamente a responsabilidade para o pesquisador, ponta mais fragilizada do processo, com prazos a cumprir, como defesa das dissertações e teses e com prazos de bolsas a vencer”.
O “Termo de Ciência e Responsabilidade” diz o seguinte: “Eu [nome do(a) aluno(a), matrícula, curso, nome do(a) orientador(a)] declaro estar plenamente ciente de que, devido à declaração de pandemia da Covid-19 (Novo Coronavírus SARS-CoV-2) pela Organização Mundial da Saúde em 11 de março de 2020, a Universidade de São Paulo (USP) decidiu pela suspensão de atividades presenciais, em posição institucional reiterada até o presente momento, priorizando, acima de tudo, a proteção e preservação da saúde e da vida de seu corpo discente”. Prossegue: “No entanto, ciente e a despeito dos perigos inerentes ao cenário da atual pandemia e das potenciais consequências que dela podem advir, decidi realizar, sob minha conta e risco, atividades de pesquisa presenciais para complemento de minha formação acadêmica”.
Na mensagem ao vice-reitor, o professor Zaiat relata inicialmente haver tomado uma série de providências, na condição de coordenador do seu laboratório, baseadas na orientação firmada pelo Documento número 2 do PRAA-2020, elaborada pelo GT presidido por Hernandes: “Definimos uma escala de trabalho, em turnos, para os 38 pesquisadores, considerando as normas de segurança e distanciamento, com a diretriz de mantermos apenas 6 pesquisadores por turno de trabalho em laboratório de 800 metros quadrados. Do lado da EESC, observei um trabalho sério, buscando garantir todas as condições para o trabalho, seguido as diretrizes estabelecidas no PRAA-2020”.
Porém, diz Zaiat, em 5/8, “com muita surpresa”, recebeu o “Termo de Ciência e Responsabilidade”, que a seu ver transfere totalmente para os discentes a responsabilidade pela volta aos laboratórios. “O que era um plano de retorno INSTITUCIONAL, com responsabilidades compartilhadas, passa, com esse Termo, a ser um plano PESSOAL de retorno (‘decidi realizar, sob minha conta e risco, atividades de pesquisa presenciais para complemento de minha formação acadêmica’). Em nenhum momento o termo cita o Plano de Retorno e joga completamente a responsabilidade para o pesquisador, ponta mais fragilizada do processo, com prazos a cumprir, como defesa das dissertações e teses e com prazos de bolsas a vencer” (destaques conforme o original).
“Em minha visão, é assustador o modo como a USP decide retomar as atividades de pesquisa, jogando toda a responsabilidade para os discentes, com anuência do orientador e Chefe do Departamento”, diz o docente. “Isso definitivamente não se trata de retomada de atividades de pesquisa, mas de uma ação que permite a volta, responsabilizando completamente os que decidirem voltar. Além disso, considerar que a atividade de pesquisa, principalmente de pós-graduação, é um ‘complemento da formação acadêmica’ beira o absurdo. Surreal, para dizer o mínimo”.
Por fim, Zaiat apela ao GT para que “redefina os termos utilizados em tal documento [número 2] e que assuma definitivamente que há um plano institucional de retorno, com responsabilidades compartilhadas entre todos os envolvidos”.
APG-São Carlos manifesta preocupação com Documento 2 do PRAA-2020
A extensa nota emitida pela APG-São Carlos e pelo Fórum de Representantes Discentes daquele campus não se limita, contudo, a rebater a imposição formulada pela Diretoria da EESC. Observa que recentemente foi anunciada a flexibilização das normas restritivas vigentes na USP, com o retorno das atividades de pesquisa presencial. “Dada a importância do assunto e acreditando na necessidade e possibilidade do diálogo e de deliberações construídas coletivamente, redigimos o presente documento enquanto representantes da categoria dos pós-graduandos com a intenção de participarmos dos processos decisórios da Universidade referentes ao tema” (destaques no original).
“O que de fato nos preocupa”, prossegue a nota, “é o Documento nº 2 do Plano de Readequação para o Ano Acadêmico 2020 (PRAA-2020), divulgado em 3/7/2020 pelo Grupo de Trabalho (GT) da USP dedicado ao tema e reivindicado pela Diretoria da EESC no Ofício 022 20, de 15 de julho [que traz como anexo o ‘Termo de Ciência e Responsabilidade’]. No corpo do texto é possível observar um planejamento dedicado à volta das atividades de pesquisa a partir da segunda metade do mês de agosto. Para tal, são fixadas normas de segurança sanitária aos laboratórios de pesquisa, bem como ações no plano administrativo para garantir a distribuição de EPIs e viabilizar a limpeza dos ambientes”.
APG e Fórum de RDs assinalam que, devido ao atual estágio da pandemia, “que não demonstra nenhum sinal de declínio ou controle”, é necessário ponturar questões gerais e particulares a serem definidas antes de qualquer retorno. “Acreditamos que uma eventual flexibilização por parte da Universidade, sem levar em consideração os pontos aqui colocados, poderá gerar pressão nos pósgraduandos, além do aumento da possibilidade de contágios desnecessários e suas consequências”.
Por essa razão, reivindicam “o caráter facultativo da presença nos laboratórios de pesquisa a todos e todas pós-graduandos, de forma institucionalizada e reconhecida pelos órgãos superiores da Universidade, para mitigar possíveis atos de assédio”, bem como um melhor detalhamento “dos mecanismos de ação da Universidade frente ao descumprimento das regras de responsabilidade sanitária por parte dos presentes nos laboratórios, em especial professores, orientadores e técnicos”. Questionam: “Quem poderá fazer denúncias? Junto a qual órgão da Universidade? Como será garantida a não-retaliação?”
Leia a seguir a integra da nota da APG-São Carlos e do Fórum de RDs, bem como a íntegra da mensagem do professor Zaiat ao vice-reitor.
Íntegra da nota da APG-São Carlos e Fórum de Representantes Discentes
A APG realizou, no dia 3 de agosto, uma reunião denominada “Fórum de RDs”, na qual participaram representantes discentes de todos os institutos do campus São Carlos bem como de instâncias superiores. A partir desta, foi deliberado o envio da presente manifestação acerca da flexibilização da pesquisa e de atividades presenciais.
A situação do Brasil no contexto da Covid-19 está em destaque no mundo todo, infelizmente de forma negativa. No momento, diversos países impõem restrições à entrada de brasileiros, órgãos de imprensa internacionais noticiam o caos constante no qual vivemos e diversas outras humilhações ocorrem ao nosso país, que possui infraestrutura de saúde considerável para o enfrentamento de crises como a atual, mas que não tem conseguido transformar essa potencialidade em realidade junto à população.
Observamos sucessivos picos no número de mortos no Brasil e, apesar disso, para surpresa ainda maior da comunidade global, em vez da manutenção ou endurecimento de medidas restritivas de isolamento social, são orientadas e aplicadas determinações de flexibilização da quarentena sem critérios objetivos que as guiem. É o caso, por exemplo, do retorno às aulas da rede pública no Estado de São Paulo, proposta para o começo de setembro.
Na Universidade de São Paulo a situação é melhor, já que as aulas presenciais não devem retornar até 2021, o que garante certo nível de segurança sanitária e o direito ao isolamento a boa parte da comunidade acadêmica. Recentemente, entretanto, foi anunciada a flexibilização das normas restritivas com o retorno das atividades de pesquisa presencial. Dada a importância do assunto e acreditando na necessidade e possibilidade do diálogo e de deliberações construídas coletivamente, redigimos o presente documento enquanto representantes da categoria dos pós-graduandos com a intenção de participarmos dos processos decisórios da Universidade referentes ao tema.
Entendemos que a pesquisa na USP nunca parou. Conforme o mote “a USP não vai parar”, aulas, trabalhos, reuniões, defesas e outras tarefas foram realizadas de forma remota neste período. Com relação à autorização de pesquisas e atividades presenciais no Campus da USP São Carlos, um comunicado feito pelo Presidente do Conselho Gestor e Prefeito do Campus da USP São Carlos, no último dia 31 de julho, deixa claro que “há equipes multidisciplinares de pesquisadores que estão autorizadas pela Universidade de São Paulo a desenvolver as atividades de pesquisa relacionadas ao desenvolvimento de medicamentos e terapias visando ao combate à Covid-19”. No mesmo comunicado, faz-se menção sobre a liberação da entrada de pesquisadores na temática de Covid-19 no Campus 2, assim como de servidores ligados a áreas essenciais. Tais medidas se fazem razoáveis neste período em que a importância da ciência pública e de qualidade se evidenciam no dia-a-dia da população.
O que de fato nos preocupa é o Documento nº 2 do Plano de Readequação para o Ano Acadêmico 2020 (PRAA-2020), divulgado em 3/7/2020 pelo Grupo de Trabalho (GT) da USP dedicado ao tema e reivindicado pela Diretoria da EESC no Ofício 022 20, de 15 de julho. No corpo do texto é possível observar um planejamento dedicado à volta das atividades de pesquisa a partir da segunda metade do mês de agosto. Para tal, são
fixadas normas de segurança sanitária aos laboratórios de pesquisa, bem como ações no plano administrativo para garantir a distribuição de EPIs e viabilizar a limpeza dos ambientes.
Devido ao atual estágio da pandemia, que não demonstra nenhum sinal de declínio ou controle, enquanto representantes da categoria de pós-graduandos, nós pontuamos questões gerais e particulares a serem definidas antes de qualquer retorno. Acreditamos que uma eventual flexibilização por parte da Universidade, sem levar em consideração os pontos aqui colocados, poderá gerar pressão nos pós-graduandos, além do aumento da possibilidade de contágios desnecessários e suas consequências. Para justificar tal posicionamento e ensejar o debate de forma propositiva, apresentamos o que segue:
• A questão do “bom senso”: Sabemos que existe uma disputa de narrativa em relação à pandemia, com a existência de grupos que minimizam e até ridicularizam a gravidade da situação. A comunidade acadêmica não foge a esta regra, de modo que infelizmente não se pode considerar o senso de responsabilidade coletiva como um valor universalmente difundido ou objetivamente determinado entre seus membros. Este ponto é de grande relevância no caso da pós-graduação, uma vez que existe uma forte hierarquia e dependência na relação orientador-orientando. Dito isso, reivindicamos o caráter facultativo da presença nos laboratórios de pesquisa a todos e todas pós-graduandos, de forma institucionalizada e reconhecida pelos órgãos superiores da Universidade, para mitigar possíveis atos de assédio. Solicitamos também um melhor detalhamento sobre os mecanismos de ação da Universidade frente ao descumprimento das regras de responsabilidade sanitária por parte dos presentes nos laboratórios, em especial professores, orientadores e técnicos. Quem poderá fazer denúncias? Junto a qual órgão da Universidade? Como será garantida a não-retaliação ao(à) denunciante?
• Fiscalização e higiene: Só haverá segurança sanitária em espaços confinados e com tantas pessoas como os laboratórios da USP São Carlos se todos os frequentadores desses ambientes seguirem estritamente as regras de distanciamento e convívio social, bem como a utilização dos equipamentos de proteção e hábitos de higiene incrementados. Como a USP garantirá a fiscalização e o acompanhamento das condições às quais os pesquisadores, técnicos, professores e funcionários terceirizados estarão expostos? Haverá segurança institucional para a denúncia de pessoas que não agirem em conformidade com a segurança sanitária? Haverá pessoal suficiente para assegurar a limpeza constante dos ambientes? Já existe legislação interna prevista para lidar com os conflitos e acusações que eventualmente surgirem em relação às regras sanitárias?
• EPIs e EPCs: Medidas de segurança extraordinárias exigem gastos extraordinários. Na pós-graduação, em alguns casos os pesquisadores nem mesmo são pagos, e quando são, recebem bolsas defasadas e sem reajustes há anos. Tudo isso, se somado a diversos gastos necessários com EPIs e produtos específicos, significará certamente prejuízos importantes nos orçamentos já debilitados dos pós-graduandos. A USP arcará com os custos e fornecerá EPIs e EPCs? Com que regularidade? Como será feita essa distribuição?
• Transporte e alimentação: Principalmente nos casos do Campus 2 e do CRHEA, existe a necessidade de transporte e de alimentação, sendo de primeira importância para a flexibilização a consideração desses aspectos. Quais medidas serão aplicadas em relação aos transportes, de modo a assegurar o acesso dos pós-graduandos ao Campus e sua segurança sanitária no caminho? Controle de lotação e consequente aumento do número de viagens? E, em relação a alimentação, serão fornecidas marmitas? Onde os pós-graduandos comerão? Como será a segurança dos funcionários do transporte e do restaurante?
• Saúde e responsabilidade: A Covid-19 se espalha a uma taxa mais intensa do que a gripe comum e há vários mecanismos de transmissão. Mesmo com as regras sanitárias sendo cumpridas, é possível que pessoas da comunidade acadêmica venham a se contaminar durante as atividades de pesquisa. Sendo os pósgraduandos ligados diretamente à Universidade, é de fundamental importância que a USP se responsabilize por eventuais infecções. Quais responsabilidades a USP assumirá em casos de infecção? Qual será o apoio e assistência prestados à(s) pessoa(s) infectadas e ao seu entorno?
• Prazos dos pós-graduandos: A pandemia da Covid-19 ataca mais um flanco da população: a saúde mental. Lidar com o isolamento social sem perspectivas de término, o trabalho remoto, o medo e ansiedade que a possibilidade de se infectar causam e, por vezes, com as dores de adoecer ou ver um ente querido adoecer à distância, torna impossível imaginar que o rendimento dos pesquisadores permaneça o mesmo. A Universidade deve respeitar essas importantes limitações impostas pela conjuntura e, assim, valorizar os pesquisadores que nela atuam.
Dessa forma, pleiteamos a extensão dos diversos prazos que os pósgraduandos devem cumprir por quanto tempo durar a pandemia, irrestritamente e sem exceções. Ao mesmo tempo, requeremos a continuidade das bolsas de pesquisa aos alunos que recebem recursos diretos da USP neste período, bem como manifestações organizadas da Universidade junto às agências de fomento para a igual extensão dos subsídios a elas ligados.
• Funcionários terceirizados: Sabemos que mesmo sem a pandemia os funcionários terceirizados possuem regimes de trabalho desgastantes, são malremunerados e desfrutam de poucos direitos trabalhistas. Com as demissões recentes, o retorno das atividades de pesquisa significa uma intensificação na demanda dos serviços prestados por terceirizados com menos pessoas para executar esses trabalhos, agravando a já complicada situação da categoria, ainda mais considerando o perigo sanitário ao qual estariam expostos. Em caso de infecção de funcionário(s), qual seria a postura da USP e da empresa terceirizada? Há um seguro-saúde previsto para tais ocorrências? A Universidade poderia garantir a impossibilidade de demissão desse(s) funcionário(s)?
Repudiamos também qualquer documento responsabilizando o próprio pós-graduando caso este venha a adoecer. Exemplo claro disso é o Comunicado da Diretoria da EESC, enviado em 5 de agosto à comunidade acadêmica e acompanhado de um Termo de Ciência e Responsabilidade que, na prática, abre brechas claras para a exigência da presença dos pós-graduandos nos laboratórios enquanto exime a Universidade da responsabilidade sobre as consequências do trabalho presencial. Como exposto anteriormente, essa grave pressão não corresponde ao significado real da Universidade ou ao seu papel para nossa comunidade, e demonstra evidente desrespeito para com os pesquisadores, parte vital da força de trabalho da USP. De fato, nesse momento de crise é preciso defender a continuidade da pesquisa científica, mas não podemos colocar nenhuma vida em risco para fazê-lo.
Por fim, reiteramos nosso posicionamento ressaltando a viabilidade da flexibilização da pesquisa e de atividades presenciais somente mediante a contemplação dos questionamentos propostos. Compreendemos que a Universidade precisa apresentar um plano robusto para uma possível flexibilização, principalmente até a distribuição de uma vacina acessível a todos e todas.
Reforçamos, assim, a união das categorias e o debate constante como ferramentas para a definição e a criação das condições necessárias para o retorno das atividades presenciais, de maneira sustentável e sem oferecer riscos aos pós-graduandos e outros atores de nossa valorosa comunidade.
Agradecendo a atenção e apelando ao cuidado à vida, assinam este documento:
Associação dos Pós-graduandos da USP São Carlos
Fórum de Representantes Discentes da USP São Carlos
Mensagem do professor Marcelo Zaiat ao vice-reitor Antonio Hernandes
Prezado Prof. Hernandes,
Coordenador do GT-USP
Sou coordenador de Laboratório de Pesquisa na EESC/USP (Laboratório de Processos Biológicos do Departamento de Hidráulica e Saneamento), o qual conta atualmente com 38 pesquisadores em nível de Mestrado, Doutorado, Pós-Doutorado e Iniciação Científica com trabalhos estritamente experimentais, orientados ou supervisionados por 4 docentes. Desde meados de março de 2020, seguindo determinação da USP, o Laboratório decidiu que as atividades seriam suspensas, mantendo-se apenas algumas essenciais e estritamente necessárias. Assim, dos 38 pesquisadores, apenas 8 continuaram a desenvolver parcialmente atividades, pois trabalhamos com microrganismos e alguns trabalhos não podem parar completamente.
Obviamente a paralisação trouxe prejuízos para o andamento das pesquisas, principalmente para mestrandos e doutorandos, com prazos a cumprir. Esperávamos ansiosamente por um plano de retomada responsável e isso veio em 3 de julho, conforme documento em anexo (PRAA-2020 – Documento nº 2), no qual são apresentadas as ações para preparação do ambiente para o retorno presencial aos laboratórios de pesquisa.
Desde o recebimento desse documento, como coordenador de Laboratório, preenchi uma série de formulários, todos no sentido de definir a melhor forma de retorno com o máximo de segurança. Definimos uma escala de trabalho, em turnos, para os 38 pesquisadores, considerando as normas de segurança e distanciamento, com a diretriz de mantermos apenas 6 pesquisadores por turno de trabalho em laboratório de 800 metros quadrados. Do lado da EESC, observei um trabalho sério, buscando garantir todas as condições para o trabalho, seguido as diretrizes estabelecidas no PRAA-2020. Além disso, foi definida, pela Unidade, a data de retorno para 17 de agosto de 2020 (segunda quinzena de agosto).
Tudo enfim está pronto para o retorno, após formulários preenchidos, exaustivas reuniões com todo o grupo sobre segurança e cuidados a tomar e adequação do espaço, conforme estabelecido. No entanto, com muita surpresa, recebemos ontem (5/8) o “Termo de Ciência e Responsabilidade”, em anexo, que deve ser assinado antes da volta ao trabalho de pesquisa. Tal Termo transfere totalmente, em minha visão, a responsabilidade para o discente. O que era um plano de retorno INSTITUCIONAL, com responsabilidades compartilhadas, passa, com esse Termo, a ser um plano PESSOAL de retorno (“decidi realizar, sob minha conta e risco, atividades de pesquisa presenciais para complemento de minha formação acadêmica”). Em nenhum momento o termo cita o Plano de Retorno e joga completamente a responsabilidade para o pesquisador, ponta mais fragilizada do processo, com prazos a cumprir, como defesa das dissertações e teses e com prazos de bolsas a vencer.
Em minha visão, é assustador o modo como a USP decide retomar as atividades de pesquisa, jogando toda a responsabilidade para os discentes, com anuência do orientador e Chefe do Departamento. Isso definitivamente não se trata de retomada de atividades de pesquisa, mas de uma ação que permite a volta, responsabilizando completamente os que decidirem voltar. Além disso, considerar que a atividade de pesquisa, principalmente de pós-graduação, é um “complemento da formação acadêmica” beira o absurdo. Surreal, para dizer o mínimo.
Dessa forma, venho apelar ao GT para que redefina os termos utilizados em tal documento e que assuma definitivamente que há um plano institucional de retorno, com responsabilidades compartilhadas entre todos os envolvidos. Não tenho dúvidas que, por desespero e falta de opção, tal Termo será assinado pelos discentes que se veem obrigados a voltar às atividades, mas trata-se claramente de um documento que joga total responsabilidade ao pesquisador e sequer menciona que há um plano coordenado de retorno. Peço desculpas pelo termo, mas acho vergonhoso que a USP se exima de responsabilidades nesse caso, jogando todo o peso para a parte mais frágil do processo, que são os discentes que realmente conduzem a pesquisa na Universidade.
Na esperança de que esse Termo seja revisto e que as responsabilidades sejam compartilhadas, agradeço a atenção.
Marcelo Zaiat
EXPRESSO ADUSP
Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui
Utilizamos cookies neste site. Você pode decidir se aceita seu uso ou não, mas alertamos que a recusa pode limitar as funcionalidades que o site oferece.AceitoRecusoPolitica de Privacidade