Em 1968, CO aprovou Assembléia Paritária na USP
abertura2
Professor Bernardino de Figueiredo fala durante o debate de 26/5

Em dezembro de 1968, o Conselho Universitário (CO) aprovou a realização anual e ordinária de uma Assembléia Universitária Paritária da Universidade de São Paulo, como órgão máximo e soberano da instituição, para traçar suas diretrizes. Os antecedentes desse processo foram as comissões paritárias criadas por diversas faculdades da USP ao longo de 1968, com especial atenção para a Comissão Paritária da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras, localizada na Rua Maria Antônia.

Este foi o tema da exposição de Bernardino Ribeiro de Figueiredo, professor de Geociências da Unicamp, no debate de abertura do V Congresso da USP, em 26/5, com o Anfiteatro Camargo Guarnieri cheio. Em 1968, Figueiredo era presidente do grêmio da Faculdade de Filosofia,  Ciências e Letras e vice-presidente da Comissão Paritária daquela unidade, que elaborou uma proposta de Estatuto para a USP.

João Zanetic, professor do Instituto de Física e mediador do debate, ressaltou que o evento era importante para “marcar os 40 anos da proposta de Estatuto para a Universidade de São Paulo que nasceu da Comissão Paritária que envolveu estudantes, docentes e uma representação simbólica dos funcionários na Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras”. Zanetic ressaltou que, em 1968, “paritária” representava o par docentes e discentes, e só posteriormente os funcionários se organizaram e surgiu o “tripartite” como bandeira do movimento.

Proposta de Estatuto

Figueiredo relembrou que a reforma universitária e a reestruturação da USP entraram na pauta do movimento com muita força em junho de 1968, “seja porque vinha de Brasília uma proposta de reforma universitária, inspirada em documentos gerados nos fóruns estrangeiros, seja porque havia uma pressão do governador do Estado na Reitoria para que se fizesse de maneira urgente a reestruturação da USP”. Já em julho de 1968, a Faculdade de Filosofia constituiu uma Comissão Paritária que, ao final de 28 encontros, produziu um documento com propostas para o Estatuto da USP.

A visão contida nesse documento era de uma “universidade crítica de si mesma e da sociedade, que conceba o desenvolvimento da ciência e da técnica com instrumentos capazes de acelerar novas relações econômicas e sociais referidas aos interesses da maioria do país; contesta assim que a universidade brasileira deva subordinar suas atividades e objetivos a critérios empresariais ou injunções do mercado de trabalho”.

Propunha-se expansão de vagas, permanência e expansão dos cursos noturnos, criação de um órgão consultivo “universidade e sociedade”, extinção da cátedra vitalícia e governo paritário nos níveis de departamento e conselhos superiores — o documento esclarecia ainda que a direção paritária não viria “questionar a hierarquia real do saber, mas valorizá-la, protegê-la da hierarquia administrativa e burocrática”.

Quanto à autonomia universitária, o documento da paritária da Faculdade de Filosofia propunha que a escolha do reitor fosse feita em um novo Conselho Universitário e que houvesse autonomia em relação ao governo estadual, inclusive através do estabelecimento de percentual fixo de arrecadação (o que só foi implementado em 1989). Já a carreira docente teria ênfase na formação de doutores no regime de dedicação integral. Concebia-se a progressão na carreira baseada no desempenho acadêmico, sem número de vagas pré-estabelecido, e propunha-se a extinção dos concursos para implementação do sistema de busca de talentos.

Desdobramentos

O documento foi bem recebido pelo reitor Hélio Lourenço de Oliveira, que segundo Figueiredo “exerceu liderança durante as discussões do novo Estatuto da reforma universitária da USP”. Oliveira teria recolhido elementos dos documentos de diversas comissões paritárias, não somente da Faculdade de Filosofia, para colocá-los em discussão. Assim, o CO ratificou em abril de 1969 — ou seja, após o Ato Institucional n° 5, a invasão do Crusp e a queda de Ibiúna — a instalação da Assembléia Universitária Paritária da USP.

No entanto, o reitor Oliveira foi cassado, entrando em seu lugar Alfredo Buzaid, professor conservador da Faculdade de Direito que posteriormente se tornou ministro da Justiça do regime militar. Coube a Buzaid, “junto com seus colegas ultra-reacionários que tinham assento tanto no CO quanto no Conselho Estadual de Educação, refazer o Estatuto da universidade”. Assim, em setembro de 1969 houve a rejeição da constituição da Assembléia Universitária Paritária da USP.

Para Figueiredo, muitas das propostas de reforma da universidade feitas em 1968 ainda são válidas hoje. “Eu vislumbro uma universidade mais equilibrada, que também seja voltada para os movimentos sociais e os saberes não científicos. Essa universidade é possível e requer atuação conjunta”. O professor da Unicamp acredita que a contradição de forças existente hoje na universidade brasileira se dá “entre professores e estudantes progressistas de um lado, e professores e estudantes fascistóides de outro”.

Estatuinte

No debate, representantes de entidades falaram da situação atual e dos desafios postos para o movimento. “Nosso objetivo é definir eixos e diretrizes que possam aumentar as probabilidades da USP instaurar um processo estatuinte”, disse o professor César Minto em nome da Adusp. Joana Salém, diretora do DCE, avaliou: “Ou as categorias da universidade se unificam em torno de um projeto, uma luta política e uma mobilização comuns, ou não há transformação da universidade”. Ela também fez o apelo para que o movimento criasse “propostas comuns, apesar da fragilidade em que ele se encontra na construção deste congresso por conta da não liberação dos funcionários”.

Ricardo Crissiuma, da APG, apresentou a tese da pós-graduação para o V Congresso, ressaltando que é preciso garantir “mecanismos democráticos nas esferas de decisão para que a produção do conhecimento possa ser determinada pelo diálogo com a comunidade científica e com os movimentos sociais”.

 

Matéria publicada no Informativo n° 261

EXPRESSO ADUSP


    Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui

    Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!