Defesa da Universidade
Combater o corte de verbas da saúde, da educação e dos serviços públicos exige ampliar diálogo e mobilização
Entidades representativas de docentes, servidora(e)s e estudantes realizaram nesta quarta-feira (30/9) um ato público virtual marcando o Dia Nacional de Lutas em Defesa da Educação, da Saúde, da Ciência e dos Serviços Públicos. Entre os vinte oradores que se manifestaram estavam a reitora da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Soraya Smaili, e o reitor da Universidade Federal do ABC (UFABC), Dácio Matheus.
As entidades divulgaram um manifesto no qual defendem que “é hora de juntar forças e ampliar o diálogo e a mobilização em defesa dos direitos sociais severamente ameaçados”. A íntegra do ato está disponível no Facebook e no YouTube da Adusp.
A vice-presidenta da Adusp, professora Michele Schultz Ramos, abriu sua intervenção no ato manifestando solidariedade às pessoas que tiveram Covid-19 e condolências “às mais de 143 mil famílias brasileiras que perderam suas queridas e queridos”. “Destaco esse número, 143 mil, porque ele revela muito sobre como a falta de uma política de Estado clara de combate à pandemia pode vitimar pessoas. O Brasil atualmente ocupa a terceira posição em número absoluto de casos, com 14% do número total de casos e óbitos no mundo. Para se ter ideia do que isso significa, é importante dizer que a população brasileira corresponde a 2,76% da população mundial”, comparou a professora.
Na sua avaliação, o cenário revela a contínua e urgente necessidade de investimentos públicos em ciência. “A pandemia tornou mais evidente que, dado o contexto socioambiental, os conhecimentos científicos tornam-se cada vez mais essenciais. No entanto, o que temos vivido? Um ataque brutal à educação e ciência, com obscurantismos e negacionismos como pressupostos de políticas de Estado”, apontou.
Michele lembrou que os sucessivos governos paulistas vêm investindo num processo de desmonte das instituições públicas de pesquisa, com políticas de subfinanciamento, falta de contratações de docentes e servidores técnico-administrativos e “com a desvalorização do trabalho de professoras e pesquisadoras, professores e pesquisadores, funcionárias e funcionários, além de estudantes de pós-graduação que são, na prática, quem conduz de fato os projetos de pesquisa”.
É exatamente nesse contexto que une pandemia, desvalorização da ciência e sucateamento das universidades e institutos de pesquisa que o governador João Doria (PSDB) apresentou o projeto de lei 529/2020, enfatizou a professora. O texto prevê a retirada de verbas das universidades públicas estaduais e da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), além da extinção de dez fundações e autarquias, incluindo institutos de pesquisa.
“Sob o falacioso argumento de que economizará cerca de R$ 10 bilhões de reais, o governo apresenta um projeto que elimina instituições que prestam serviços aos mais pobres em várias áreas da administração pública: saúde, transportes, moradia, meio ambiente, direito à terra, educação e ciência”, afirmou.
Michele encerrou sua manifestação com um chamado à união para a defesa da educação, da ciência, das universidades públicas, gratuitas, de qualidade e socialmente referenciadas e contra a aprovação do PL 529/2020 e da reforma administrativa encaminhada pelo governo federal ao Congresso Nacional.
Lei Orçamentária de 2021 aprofunda perdas no MEC e no SUS
O presidente da Associação dos Docentes da UFABC, Salomão Ximenes, também se referiu às vítimas da pandemia da Covid-19, mencionando a dor e o pesar das pessoas que têm perdido familiares e amigos e convivem com as sequelas “desta irresponsabilidade e, podemos dizer, deste genocídio do governo brasileiro”.
Ximenes defendeu a necessidade da convergência de lutas no âmbito estadual e federal pelo financiamento da pesquisa nas universidades e instituições e pela oferta de serviços públicos adequados à população.
O professor lembrou que a Emenda Constitucional 95 tem servido de justificativa para impor um conjunto de reformas baseadas na austeridade econômica, enquanto a reforma administrativa encaminhada por Jair Bolsonaro, por meio da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 32/2020, “tem um potencial absolutamente destrutivo no conjunto dos serviços públicos no país”.
“Nossa unidade foi capaz de produzir os tsunamis da educação em 2019, o que reverteu um conjunto de medidas já baseadas na austeridade econômica, no corte de direitos e no desmonte do Estado, mas o plano é implementar de forma mais dura e permanente a austeridade econômica e o corte de direitos a partir de 2021”, afirmou. “Nosso dever prioritário no momento é nos colocarmos na linha de frente em defesa da democracia, dos direitos sociais e do conjunto dos serviços públicos devidos à população brasileira.”
Soraya Smaili, reitora da Unifesp, defendeu a necessidade de mobilização em torno de alguns eixos fundamentais para o financiamento dos serviços públicos. Um deles é a reversão dos cortes de recursos para as universidades e institutos federais previstos na Lei Orçamentária Anual (LOA) de 2021, em debate no Congresso Nacional. O texto estabelece um corte de R$ 1,8 bilhão nas verbas das instituições federais de ensino superior, o que compromete 16,5% do orçamento de custeio, de capital e de assistência estudantil.
Além dessa redução, 60% do orçamento terá aprovação condicionada à liberação por parte dos parlamentares no ano que vem. As perdas também se estendem às verbas para bolsas e fomento de pesquisa na Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
“Na saúde, o corte orçamentário chega a R$ 35 bilhões. O impacto da EC 95 na saúde é enorme, com uma grande perda para o SUS”, alertou. “Como continuaremos os atendimentos diante da pandemia, da situação de crise sanitária e da necessidade de fazer chegar uma vacina às regiões mais distantes dos grandes centros se não tivermos o apoio ao SUS?”
A reitora apontou dois projetos cuja aprovação deve ser defendida pela comunidade acadêmica: um é a PEC 24/2019, da deputada federal Luisa Canziani (PTB-PR), que dá autonomia para a utilização de receitas próprias, convênios ou doações obtidas pelas universidades federais, e o outro é o PL 135/2020, do senador Izalci Lucas (PSDB-DF), que proíbe a limitação das despesas custeadas pelo Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (FNDCT).
“Essas medidas são muito importantes, e o engajamento e liderança de todos são necessários para que possamos de fato concretizar essas ações”, ressaltou Soraya.
Participaram da manifestação, além da Adusp e da ADUFABC, as associações de docentes da Unesp (Adunesp), da Unicamp (Adunicamp) e da Unifesp (Adunifesp); a Federação de Sindicatos de Trabalhadores Técnico-administrativos em Instituições de Ensino Superior Públicas do Brasil (Fasubra Sindical); o Fórum das Seis; os sindicatos dos trabalhadores da UFSCar (Sintufscar), da Unesp (Sintunesp), da Unicamp (STU), da Unifesp (Sintunifesp), da USP (Sintusp), da UFABC (SintUFABC) e do Centro Paula Souza (Sinteps); os sindicatos nacionais dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) e dos Servidores Federais da Educação Básica, Profissional e Tecnológica – Seção SP (Sinasefe-SP); e a União Nacional dos Estudantes (UNE).
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