Evento na USP prossegue série de debates sobre EàD
Daniel Garcia
debate

Debate realizado no auditório da FAU

No dia 2/12, realizou-se na FAU-USP o último evento do “I Fórum de Debates sobre EàD”, fruto de acordo firmado entre o Fórum da Seis e o Cruesp (vide Informativo Adusp edições 296 e 298). A pergunta proposta para este debate, o terceiro da série, foi: “É possível formar bons profissionais para o país via EàD?”.

A mesa foi composta pela professora Sueli Guadelupe de Lima Mendonça (Unesp) e o professor Edmundo Fernandes Dias (Unicamp), ambos como representantes do Fórum, e pelos professores Manoel Oriosvaldo de Moura (USP) e Klaus Schlünzen Junior (Unesp), que participaram a convite do Cruesp.

O evento teve transmissão ao vivo pela internet, envio de perguntas pelos espectadores e tradução simultânea para Língua Brasileira de Sinais (Libras).

Expansão

A professora Sueli procurou localizar o EàD no contexto de mudanças nas políticas educacionais ocorridas a partir da década de 1990, estimuladas por organismos como Banco Mundial, FMI e OMC: diversificação de fontes de financiamento, com cobrança de mensalidade; diversificação dos modelos educacionais; aligeiramento da formação; captação de recursos privados. “Nessa lógica, o direito social à educação deixa de ser um direito para se transformar em mercadoria, em prestação de serviços”, apontou.

Segundo a professora, foi nesse sentido que, em 2001, o Cruesp apresentou à Alesp o documento “Expansão do sistema estadual público de Ensino Superior”, em que aponta ser “impossível” a expansão do ensino superior no modelo das três estaduais paulistas que, por basear-se no tripé ensino, pesquisa e extensão, é “caro por natureza”; e propôs como alternativa a criação de “cursos diversificados, menos dispendiosos e mais simples”.

Sueli lembrou que daquelas discussões surgiram as primeiras experiências de EàD nas estaduais: o PEC-Formação Universitária, programa que contou com a participação de USP, Unesp e PUC-SP, e que visava atender professores da rede pública estadual que não possuíam formação superior; e, na Unesp, o programa Pedagogia Cidadã, voltado para redes municipais. Em 2009, a Unesp vive a experiência do curso de Pedagogia à distância, como parte da Univesp. “Essas políticas têm sido impostas por governos e pelas reitorias, sem discussão com a comunidade”, criticou.

Responsabilidade

O professor Oriosvaldo afirmou que universidades e cursos de formação têm se pautado cada vez mais pela idéia de “competências e habilidades”, a partir de diretrizes curriculares propostas pelo MEC. “Essas competências e habilidades têm se assentado numa responsabilidade sobre o sujeito. Cabe ao sujeito esse esforço para que ele tenha sucesso, quando ele não tem sucesso é porque não foi capaz de se apropriar do que tem se chamado de habilidades e competências”.

“Se pensarmos no desenvolvimento humano como parte de um processo sócio-histórico, vamos certamente ter a possibilidade de nos contrapor a essa perspectiva do desenvolvimento do sujeito alienado dos seus processos de produção”, afirmou. A ação formadora pressupõe um sujeito que se apropria de conhecimentos e de um modo de conhecer, o que implica uma mudança de qualidade desse sujeito, em função de sua inserção num projeto coletivo: “O sujeito para se tornar pertencente à sua comunidade deve se considerar como parte desse projeto. Formar bons profissionais implica uma atividade de uma comunidade”.

O professor da FE propôs uma reflexão sobre como estão sendo usados os novos recursos tecnológicos na USP. “Nós não sabemos nem usar ainda o equipamento para o [ensino] presencial, mas se coloca para nós a necessidade, a possibilidade, de usar também para o ensino à distância”, lamentou. Segundo ele, o que temos na USP hoje “são ações desarticuladas que não se constituem em uma atividade, fica para cada unidade a tomada de decisão sobre o uso de tecnologias educativas, fica para cada sujeito a responsabilidade pela sua formação”.

Projeto

O professor Edmundo Dias criticou o fato de o EàD não possibilitar o convívio do diferente: “O ensino à distância é aquele que não permite a convivência de múltiplos sujeitos, inclusive diferenciados, que a gente tem no ensino presencial. O ensino presencial é a solução? Eu não diria que é a salvação da pátria, mas que é melhor do que o ensino à distância, porque as contradições podem ser colocadas”.

Ele apontou a possibilidade de o EàD servir como instrumento de manipulação ideológica: “Se vocês pegarem a história da educação no mundo, vão ver que a escola de qualidade humanística para os ricos e a escola profissional brutalizante para os pobres têm mais de 200, 300 anos, o que se dá [é uma] forma nova agora”.

“Da mesma maneira que o capitalismo tem que reestruturar as suas técnicas produtivas, tem que reestruturar também a sua maneira de obter legitimidade, ou seja, de capturar as subjetividades dos antagonistas. O processo de educação [presencial] não impede que isso ocorra, mas expõe as contradições”. No EàD, “esse processo de ganhar a subjetividade do outro é muito mais fácil, até porque nós temos hoje em dia o mito da técnica como força produtiva por excelência: é a técnica que faz as coisas, não são as pessoas”, diz. “Cabe a nós como educadores negar essa tese”.

Acesso

O professor Klaus observou que o significado de distância não é mais o mesmo nos dias de hoje: “Se a gente pensar no caso do Instituto Universal Brasileiro, a distância era realmente distância naquela época, porque não havia nenhum contato, no sentido físico, presencial, [entre] o formador e o aluno. Não estou falando que não exista a relação de espaço. Mas pergunto: essa distância é a mesma hoje? Essa distância física, geográfica, é contornada por todo um aparato tecnológico”.

O professor da Unesp afirmou que o EàD não é educação de massa, mas “visa atender necessidades de formação para pessoas que estão de certa forma desprovidas de acesso a centros de formação”. Para Klaus, outra questão é que EàD “não é transposição do presencial para o virtual”. Trata-se, diz, de “um outro paradigma, uma outra realidade”.

O professor frisou a necessidade de as universidades definirem políticas para institucionalização do EàD: “Isso implica definir critérios claros de qualidade, baseados em referências; oferecer subsídios, conceitos e base pedagógica para elaboração de cursos”. Ele informou que um estudo sobre EàD em países europeus mostrou que os alunos desse tipo de curso dedicam mais tempo aos estudos, são mais autônomos, organizam-se melhor. Outros estudos apontariam igualdade entre cursos EàD e presenciais e que modelos combinados ou bimodais mostram-se superiores aos puramente presenciais.

Esse debate terá continuidade em 2010.

 

Matéria publicada no Informativo nº 299

EXPRESSO ADUSP


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