Ganhou repercussão na mídia tradicional e na Internet a celebração de convênio entre a USP, a empresa transnacional Monsanto e a Fundação de Apoio à USP (Fusp) para financiamento parcial do Programa de Pré-Iniciação Científica, revelado, em 7/8, por uma reportagem do jornal Brasil de Fato. O programa, financiado apenas por recursos privados, envolve a Secretaria de Estado da Educação e a USP e pretende “aproximar da universidade os alunos do ensino médio da rede pública”.

O Conselho de Pesquisa da USP referendou o convênio com a Monsanto em 25/6, em sessão extraordinária, depois que a empresa aceitou retirar do texto original os pontos criticados por representantes discentes em reunião anterior do colegiado. Posteriormente o convênio foi ratificado pelo Conselho Universitário.

O aporte financeiro da Monsanto, de R$ 220 mil, está relacionado a um outro convênio, firmado entre a Secretaria da Educação, a USP, a Fusp e o Santander, com o objetivo de implantar e desenvolver o Programa de Pré-Iniciação Científica. Neste segundo convênio, cujo valor total é de R$ 940 mil, o Santander responderá por uma cota de R$ 720 mil e a Fusp por R$ 220 mil. A Monsanto não é citada neste último convênio, apenas a Fusp — que é mera intermediária do repasse.

A cláusula nona da minuta inicial, que foi inteiramente suprimida no texto final do convênio, dá uma idéia dos moldes que a empresa pretendia impor, ao estabelecer que a “USP e a Fusp estão cientes de e se comprometem a obedecer as disposições da Lei Norte-Americana contra Práticas de Corrupção Estrangeiras – de 1977 (Foreign Corruption Practices Act)”.

Outro dispositivo, que facultava à Monsanto supervisionar “o bom andamento deste Convênio, inclusive a educação e o acompanhamento científico que estão sendo oferecidos”, foi substituído por “Acompanhar o andamento das atividades-fim do presente convênio”. Além disso, foi inserido, também por sugestão dos estudantes, o compromisso das partes de “não utilizar valor superior ou equivalente a 5% do valor total do convênio para gastos com sua divulgação”.

Sigilo para todos

Foi mantida, embora com alterações, a cláusula de “sigilo e confidencialidade”. O texto aprovado determina que a “USP e a Fusp e a Monsanto se obrigam por si, seus diretores, funcionários ou pessoal contratado, a manter o mais completo e absoluto sigilo em relação a toda e qualquer informação relacionada às atividades de quaisquer das três partes envolvidas neste convênio (…) das quais venha[m] a ter conhecimento ou acesso em razão do cumprimento do presente acordo”. O texto original obrigava a USP e a Fusp ao sigilo em relação a informações relativas à Monsanto.

A aprovação do convênio no âmbito do Conselho de Pesquisa contou com 32 votos e três abstenções. Segundo a ata, três professores que votaram favoravelmente ao convênio nem por isso se furtaram de criticar a Monsanto, empresa acusada de práticas condenáveis na comercialização de sementes e de organismos geneticamente modificados (OGM ou transgênicos).

No encerramento da sessão, o pró-reitor de Pesquisa em exercício, professor Paulo Saldiva, cumprimentou os estudantes pelo parecer que emitiram e que resultou em mudanças nos convênios. “O Conselho fica muito atento a pequenos detalhes administrativos e discute pouco política de pesquisa”, disse.

Christy Ganzert Pato, um dos representantes discentes no Conselho, avalia que o Programa de Iniciação Científica é positivo como projeto de inclusão. No entanto, ressalta que havia “outras quinhentas formas de conseguir esses 220 mil”, que não o financiamento da Monsanto. Ele dá o exemplo de projetos que constam no Fundo de Pesquisa com valores superiores a R$ 4 milhões. Não os toma como modelo, mas explica: “Os canais de captação não são tão restritos”.

Critérios da USP

Perguntado sobre o critério usado pela USP para fazer parcerias com a iniciativa privada, o professor Pedro Bombonato, coordenador do programa de Pré-Iniciação Científica, evita responder diretamente. Informa que foram consultadas cerca de 50 empresas (entre elas Phillips, Vale do Rio Doce, Banco Safra e Petrobrás), mas apenas Santander, Monsanto e Microsoft dispuseram-se a transferir recursos à USP.

No que diz respeito especificamente à Monsanto, Bombonato considera que a “diabolização” social de certas empresas não deve servir de parâmetro negativo para as escolhas da USP. O que interessa, diz ele, é aquilo que a empresa se compromete a fazer no convênio.

Para a realização do programa, a universidade rejeitou a busca de recursos públicos. Bombonato afirma que foi cogitada uma parceria com o CNPq, que mantém um programa nacional de Iniciação Científica Jr., voltado para estudantes do Ensino Médio, mas ela não se efetivou “porque o valor da bolsa era muito pequeno e não havia a participação da Secretaria da Educação”.

Ele conta que os aportes do Santander e da Monsanto já estão sendo depositados na conta da Fusp e que em 1º/9 o programa será inaugurado. “Do ponto de vista prático, a Monsanto nunca esteve na universidade, nenhum representante dela veio à universidade e nem virá. Eles não podem e não devem interferir do processo de execução do programa”, garante, lembrando que o convênio também veda qualquer tipo de abordagem dos estudantes participantes pelas empresas financiadoras. A fiscalização do convênio ficará a cargo do Conselho de Pesquisa.

 

Matéria publicada no Informativo nº 265

EXPRESSO ADUSP


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