O Ensino Superior no Brasil está extremamente privatizado: 75% das quase 5 milhões de matrículas em cursos presenciais de graduação ocorrem em instituições privadas (IPES). Isto tem conseqüências perversas. Os estudantes, além de sujeitos a mensalidades não raro extorsivas, deixam de receber a formação a que têm direito. Os docentes são submetidos a condições trabalhistas e salariais aviltantes, quase sempre com alta instabilidade, devido a frequentes renovações contratuais que os colocam à disposição, como “horistas”, dependentes da carga didática que essas IPES lhes atribuem.

O país também perde muito com essa privatização, acentuada após 1996. Por regra, as IPES não se instalam onde o lucro não é garantido, nem oferecem cursos de alto investimento. Criam e fecham cursos ao bel-prazer, seguindo modismos e “nichos de oportunidades”. Assim, faltam licenciados em Física, Química e Biologia, engenheiros em alguns ramos menos atraentes no momento, agrônomos etc, enquanto proliferam multidões de advogados, administradores e até pedagogos, egressos de cursos que não implicam investimentos tão custosos. A outra face dessa privatização é mais um descalabro: muitos mestres e doutores formados às custas do erário público, desempregados, são obrigados a esconder seus diplomas para poder trabalhar nessas IPES.

Diante deste quadro, como enfrentar as investidas da “livre iniciativa”, em especial via “associações de mantenedoras” de IPES, por exemplo, da ABMES (nacional) e do Semesp (paulista), para que o Estado lhes facilite a atuação? A “Agenda Positiva” da ABMES (www.abmes.org.com), de 2006, pouco antes de o governo federal encaminhar seu PL 7.200/06 (“reforma universitária”) ao Congresso, não deixa dúvida: primeiro, reclamam de “excesso de normas regulamentadoras”, o que lhes causaria “insegurança jurídica”; segundo, completando a desfaçatez, exigem a revogação de dispositivo que condiciona a autorização de cursos à apresentação de certidão negativa de débitos fiscais e se opõem à pouca regulamentação que sobrou na LDB, em especial quanto a regime de trabalho e titulação docente.

Teor mercantil

Poucos sabem é que o setor privado já havia depositado, antes de o governo fazê-lo, seus projetos de “reforma universitária” na Câmara dos Deputados. Por estranha coincidência, em 6/10/2004, dois ex-secretários estaduais de Educação encaminham projetos de igual teor mercantil e justificativas idênticas: o PL 4212 do deputado Átila Lira (PSB/PI) e o PL 4221 do deputado João Matos (PMDB/SC).

Tais projetos buscam: regularizar o regime horista; autorizar qualquer instituição, mesmo faculdade, pública ou privada, a conferir diplomas e registrá-los; mexer nas exigências para constituir universidades, autorizar cursos; remodelar “avaliações” (CONAES e SINAES, onde se dispõe sobre o ENADE, dentre outros) e, até mesmo, reformar a composição e as atribuições do Conselho Nacional de Educação. E o PL do governo está apensado a estes dois projetos e, por ser mais antigo, o PL 4212/04 encabeça um rol de, por ora, uma dúzia de PLs, constituindo a “reforma universitária”.

Essa “reforma” ficou parada no Congresso até recentemente (ver Informativo Adusp 220, 223 e 226), após um percurso inicial, ainda em 2006, que contabilizou várias sessões na Câmara e a constituição de uma primeira Comissão Especial (que substitui o trâmite por todas as outras Comissões). Isto se deu, sobretudo, devido à resistência da Frente de Luta criada pelas comunidades universitárias na ocasião. Recentemente, na antevéspera de novo período eleitoral, essa “reforma” voltou a tramitar e com rapidez. Foi constituída uma nova Comissão Especial, em 7/4/09, que já cumpriu três sessões e uma Audiência Pública, para a qual a ABMES e congêneres foram convidadas, já existindo, inclusive, um relatório preliminar.

É hora de docentes, funcionários e estudantes se reorganizarem para acompanhar passo a passo este processo e nele intervir com chance de sucesso!

 

Matéria publicada no Informativo nº 281

EXPRESSO ADUSP


    Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui

    Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!