Democracia na USP
Programas são contraditórios
Diferentemente dos programas apresentados pelas chapas situacionistas, os programas de Maria Arminda e Ildo Sauer procuram, em maior ou menor medida, dialogar com propostas e reivindicações da comunidade. No entanto, é visível igualmente a preocupação de não ferir os interesses dos setores que controlam a estrutura de poder da USP. Certos temas, como fundações privadas “de apoio” e conflito de interesses, são tratados por esses programas de maneira genérica, superficial ou sequer mencionados.
Na sua Carta de Intenções, Sauer toma como ponto de partida o “clima de frustração” que tomou conta da USP, que é consequência “do fechamento que ocorreu na última gestão”, das “promessas feitas na campanha e descumpridas depois”, e, principalmente, “de medidas centralizadoras colocadas em prática pela gestão Zago/Vahan”. No entanto, exceto pela clara promessa de retirada das grades da Reitoria, há uma tensão entre esse diagnóstico e boa parte do seu programa.
No tocante à crise de financiamento da USP, são positivas as propostas de Sauer de “luta pela constitucionalização do repasse financeiro do Estado” e pelo “fortalecimento do Cruesp [Conselho de Reitores] e do sistema universitário paulista”. Porém, contraditoriamente, seu programa fica aquém da agenda do próprio Cruesp, ao não encampar os esforços deste para ampliar o repasse da Quota-Parte Estadual do ICMS dos atuais 9,57% para 9,95%, calculados sobre o total do produto (para impedir a maquiagem contábil do governo estadual).
Maria Arminda, por sua vez, adota postura ambígua ao tratar do tema. Primeiro, diz entender que a crise da USP deva ser efetivamente resolvida, “mesmo que grupos corporativo-sindicais ainda façam ouvidos moucos a seu enfrentamento firme”. Quanto às medidas embutidas nos “Parâmetros de Sustentabilidade”, avalia que “tanto por sua forma de discussão e aprovação ao ‘rufar dos tambores’, como por seu conteúdo, amiúde simplista, devam ser substituídas por uma ‘agenda’ que atenda à necessidade exigida pelo momento crítico, oferecendo soluções ágeis, práticas e exequíveis, que não agridam direitos ou inviabilizem o funcionamento da Universidade”.
Autonomia e ICMS
Mais adiante, ao tratar da “Repactuação da Autonomia”, a professora assinala: “Para que tenhamos uma ideia do montante subtraído do repasse às universidades devido aos descontos [habitação, juros etc.], a partir de 2002, o valor deduzido mensalmente da arrecadação do ICMS corresponde a 1/12 do total de recursos aprovados para essa finalidade na Lei Orçamentária. Em 2014 e 2015, por exemplo, o prejuízo das universidades com esse procedimento foi de cerca de R$ 600 milhões. Em 2016, cerca de R$ 410 milhões”.
Curiosamente, Maria Arminda omite que o levantamento de tais dados e a denúncia sistemática da maquiagem contábil praticada pelo Palácio dos Bandeirantes devem-se aos tais “grupos corporativo-sindicais” que, segundo ela, fazem “ouvidos moucos ao enfrentamento da crise”.
No tocante à avaliação docente, Sauer deixa de abordar a nevrálgica questão da “Nova CPA” e “Estatuto do Docente”. Limita-se a emitir enunciados genéricos, tais como “propomos o equilíbrio entre critérios objetivos, mensuráveis, e a necessidade de avaliação qualitativa, subjetiva” (Carta de Intenções) ou “valorização dos docentes que se destacam no exercício da docência, em ações de impacto social, em atividades culturais” etc (folheto de campanha).
Maria Arminda identifica “efeitos danosos” nas “recentes alterações na estrutura de avaliação docente e institucional da USP”, mas, atenção: “não por sua existência, mas pela forma como se realizou a discussão e tramitação dessas reformas”. De qualquer modo, anuncia, “a próxima gestão reitoral tem a obrigação de se comprometer com as especificidades da Universidade de sorte a lhe garantir a universalidade de métodos e conteúdos no âmbito da docência, da pesquisa e da extensão, tripé constitucional da Universidade Brasileira” (destaques do original).
Situacionismo
Para Vahan Agopyan, a crise de financiamento foi causada pela significativa ampliação da universidade, pela crise econômica e pelo “grave descontrole interno”, o que remete à gestão de J.G. Rodas, na qual tanto ele como o atual reitor eram pró-reitores. Como assinalou o Informativo Adusp 441: “Se a crise de financiamento tem como elemento central a expansão da universidade sem contrapartida de recursos do governo estadual, esta só foi possível pela combinação de um imenso poder nas mãos do reitor com a cumplicidade da maioria do Conselho Universitário (Co). Portanto, sem a democratização das estruturas de poder estaremos constantemente sujeitos tanto à vontade discricionária do reitor em exercício”.
O candidato oficial admite que o corpo docente “enfrenta uma remuneração inicial relativamente baixa” e que o salário líquido inicial de um doutor, “geralmente com experiência em estágios de pós-doutoramento, é similar ao de uma bolsa para o seu nível”. As medidas que propõe para resolver este problema, e o do teto salarial, são tão frugais quanto o restante do seu programa: “Aos docentes em início de carreira, por exemplo, garantir o processo de progressão horizontal e, ao mesmo tempo, manter e melhorar o Programa de Apoio aos Jovens Docentes. Para os professores que têm a sua remuneração limitada pelo teto, dentro da legislação vigente, propor um programa similar ao dos jovens docentes”.
Quanto ao programa de Ricardo Terra, seu eixo é a preocupação com a autonomia universitária. “Por que, apesar da autonomia, não conseguimos escapar de amarras burocráticas, por exemplo, como aquelas que a Capes introduziu para os nossos programas de pós-graduação e para os nossos pesquisadores?”, indaga. Outra de várias perguntas cita a falta de coesão na universidade sobre “questões vitais” como “as manifestações violentas de sindicatos” e “a partidarização da vida universitária”.
Terra entende a autonomia universitária como algo oposto ao que chama de “corporativismo”, “populismo” e “dissensões internas” que, supostamente, levariam a USP ao imobilismo.
Programa da Adusp
É sempre interessante comparar as propostas apresentadas pelos reitoráveis, e aqui sumariamente comentadas, ao Programa da Adusp para a USP.
Informativo nº 442
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