Mais dois livros com narrativas de pessoas que sofreram torturas durante a Ditadura Militar foram lançados na USP nas últimas semanas: Retrato Calado, de autoria do professor Luiz Roberto Salinas Fortes, nas Ciências Sociais, em 25/9; 68, a geração que queria mudar o mundo, organizado por Eliete Ferrer, em 21/9, no Teatro Laboratório Miroel Silveira do Departamento de Artes Cênicas da ECA.

O professor Salinas Fortes, que era militante comunista, foi preso e torturado por duas vezes em 1970 (a primeira na Oban, a segunda no DOPS), experiências que o marcaram profundamente. Morreu em 1987, com apenas 50 anos de idade. No relançamento de Retrato Calado (Cosac Naify, 2012), sua personalidade e sua obra literária e acadêmica estiveram no centro de um debate que contou com a participação das professoras Maria das Graças de Souza, Irene Cardoso e Marilena Chauí.

Orientanda de Salinas Fortes no doutorado, que concluiu em 1990, já com Marilena como orientadora, Maria das Graças discorreu sobre os estudos que o professor realizou da obra de Rousseau.

Irene expôs sua convicção de que Retrato Calado é efetivamente um “testemunho”, por ligar a existência pessoal do autor “às grandes correntes da história” e por se tratar de um documento escrito, que evita o risco do esquecimento. Ela chamou atenção para a crítica mordaz de Salinas Fortes ao regime militar, para quem ao “espetáculo pirotécnico do Brasil Grande” e ao “pacífico esquadrão comandado por Pelé e Tostão” contrapunham-se aos subterrâneos representados pela tortura e pelo Esquadrão da Morte. “Não esquecer Buzaid”, anotou ainda o autor, em alusão ao reitor da USP e ministro da Justiça da Ditadura.

Marilena deu um testemunho pessoal, destacando o “frescor psicológico, moral, incrível” de Salinas Fortes, a quem conheceu em 1966 e de quem se tornou grande amiga. A professora afirmou que, após o AI-5, a repressão política dizimou o Departamento de Filosofia da USP, no qual ambos lecionavam: “Havia um pavor contínuo, ao qual a gente não podia se render. Neste ambiente é que Salinas foi preso por três meses. Quando saiu, fez a tese de doutorado sobre Rousseau”. Lembrou do gesto do amigo que consistia em colocar as mãos nas têmporas, quando dizia, em alusão aos sofrimentos psíquicos: “Esta dor vai me matar”.

68, a geração…

Eliete Ferrer, que tem percorrido o Brasil para lançar 68, a geração que queria mudar o mundo, esteve presente ao lançamento na ECA. “Este livro tem relatos de todos os tipos. Fala do cotidiano dos militantes, dos momentos nas prisões, das torturas e da solidariedade entre as pessoas à época; ele é dedicado aos jovens, porque a maioria dessas pessoas não tem ideia do que fizemos e do que fizeram com a gente na Ditadura”.

A obra traz 170 relatos, que variam entre duas e 15 páginas cada um, e exigiu cinco anos de trabalho. Na USP, a apresentação fez parte da campanha pela criação de uma Comissão da Verdade na instituição.

 

Informativo nº 352

EXPRESSO ADUSP


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