Deverá ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), ainda no decorrer deste semestre, uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra lei federal sancionada no governo Fernando Henrique Cardoso, que instituiu o modelo de gestão de órgãos e equipamentos públicos por “organizações sociais” (OSs). A Lei 9.637/98 permitiu que entes privados, assim denominados, prestem serviços de ensino, pesquisa científica, desenvolvimento tecnológico, proteção e preservação ao meio ambiente, cultura e saúde, por meio da gestão de patrimônio público.

A Adin 1.923 foi requerida em 1998 por PT e PDT, os quais questionavam a ausência de processo licitatório na transferência de atividades desenvolvidas por autarquias e fundações públicas para entidades de direito privado. A ação sustenta também que a transferência fere a Constituição no que diz respeito à fiscalização orçamentária, ao limite de despesas com pessoal, à realização de concurso público para admissão de pessoal e à aquisição de bens mediante licitação.

Caso a Adin seja julgada procedente, instituições e serviços federais, estaduais e municipais geridos por OSs necessitariam de um novo modelo de gestão estatal. No entanto, em 2007, o STF julgou e rejeitou por oito votos a três uma liminar que solicitava a suspensão da gestão por OSs até o julgamento da Adin.

“Fere o SUS”

Além disso, nos últimos anos alguns gestores petistas e aliados passaram a adotar o modelo em âmbito federal e municipal. É o caso de cinco órgãos do Ministério da Ciência e Tecnologia, cujos contratos somam R$ 70 milhões, e da Empresa Brasil de Comunicação, que administra a TV Brasil e mantém contrato com uma OS.

Em São Paulo, que conta com lei estadual específica sobre o tema, 23 hospitais estaduais são geridos por OSs, com contratos que somam R$ 1,36 bilhão por ano. Desde o início de sua implantação, o modelo vem sendo duramente combatido por sindicatos e movimentos sociais da área da saúde. O presidente do Sindicato dos Médicos, Cid Carvalhaes, considera que o modelo fere os princípios básicos do Sistema Único de Saúde (SUS).

“Equidade, universalidade e horizontalidade constituem os pilares do SUS. Isso implica que todos que têm demanda recebam atendimento adequado. Isso não é cumprido pela iniciativa privada, pois os hospitais referenciados operam num sistema de portas fechadas, não atendem todo mundo, podem escolher ou não atender pacientes”, afirma. Para Carvalhaes, a gestão de serviços essenciais de saúde é atividade-fim e, portanto, uma obrigação constitucional do Estado.

Ilegalidades

Na área cultural, o modelo de gestão por OSs está amplamente consolidado: todos os equipamentos culturais do Estado de São Paulo são administrados por entidades privadas, que recebem R$ 340 milhões por ano, ou 69,7% do orçamento da Secretaria de Cultura em 2008.

Na avaliação do promotor de justiça Silvio Marques, do Ministério Público Estadual, que investiga ilegalidades na execução de convênios entre organizações sociais da área de cultura e os governos estadual e municipal, a contratação de OSs sem licitação é inconstitucional. “A Lei 8.666/93, que exclui as organizações sociais da necessidade de licitação, é inconstitucional. Uma decorrência disso, no caso dos museus, é que acabam sendo contratados amigos do administrador público”, denuncia Marques.

“Não há motivo jurídico nenhum para excluir essas OSs do processo licitatório, uma vez que elas administram dinheiro público, e não é pouco. O Projeto Guri [que oferece cursos de música para crianças e jovens com verbas públicas], por exemplo, tem contratos de R$ 30 milhões, 40 milhões. Não há justificativa para a ausência de licitação”.

Fundações

O Andes-Sindicato Nacional pretende solicitar ser ouvido pelo STF na condição de amicus curiae, termo latino que significa “amigo da corte” e que define uma entidade que, embora não seja autora da ação, é parte interessada em determinado julgamento.

O Andes-SN solicitará a inclusão no processo baseando-se no fato de que fundações privadas ditas “de apoio” a universidades públicas têm-se qualificado como OSs para gerir hospitais públicos: é o caso da Fundação Faculdade de Medicina, conveniada à USP, e da Associação Paulista para o Desenvolvimento da Medicina, vinculada à Unifesp.

“Se o relator [ministro Ayres Britto] permitir, queremos interferir na discussão, defendendo que a lei seja considerada inconstitucional”, afirma Francisco Miraglia, vice-presidente regional eleito do Andes-SN.

 

Informativo nº 307

EXPRESSO ADUSP


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