Universidade
Diretor da Faculdade de Direito afasta docente investigado por supostos abusos sexuais; jurista contesta medida
Tem suscitado controvérsia a decisão do diretor da Faculdade de Direito (FD-USP), Celso Fernandes Campilongo, de afastar de suas atividades, por 60 dias, o professor Alysson Leandro Barbate Mascaro, do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito, cuja conduta é objeto de investigação preliminar, por supostos abusos sexuais cometidos contra estudantes.
Enquanto vigorar o afastamento cautelar, Alysson “não poderá comparecer a aulas, reuniões, bancas, nem aos espaços físicos e/ou virtuais em que atua como docente na unidade”. Nem poderá utilizar “das funções, prerrogativas e acessos que o cargo lhe confere para contatar os denunciantes e testemunhas ou interferir de qualquer modo nos trabalhos de investigação”, segundo estipula a Portaria Interna 19/2024, assinada por Campilongo.
Os primeiros considerandos de Campilongo citam “o relatório encaminhado pelo presidente da apuração preliminar, instaurada por intermédio da Portaria Interna 18/2024, cujo teor se presta a requerer o afastamento cautelar do docente investigado […] por pelo menos 60 dias (prazo original, mais prazo para eventual prorrogação dos trabalhos), a fim de bem garantir a apuração dos fatos descritos”, e “os fundamentos expostos pela presidência no sentido de que há fortes indícios de materialidade dos fatos e que estes envolvem possível enquadramento típico de assédio sexual vertical”.
Os considerandos seguintes argumentam que “o cenário normativo das leis formais do Estado de São Paulo, aplicáveis ao caso, permite o afastamento preventivo de servidores no bojo do procedimento investigativo de modo excepcional, conforme artigo 266, I, da Lei Estadual 10.261/68 c/c art. 62, parágrafo único, da Resolução 8.170/2022”, e, ainda, que o recém editado Decreto 69.122, de 9 de dezembro, “ao disciplinar sobre a apuração preliminar regida pela Lei Estadual 10.261/68, permite em seu artigo 12 a aplicação de medidas cautelares do Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado desde a análise preliminar da notícia de irregularidade, quando envolver caso de assédio sexual”.
O decreto do governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) foi publicado seis dias após a divulgação das denúncias contra o professor Alysson Mascaro no The Intercept Brasil, que ocorreu no dia 3 de dezembro. Docentes que acompanham o caso avaliam que a proximidade de datas entre a edição do decreto (9 de dezembro) e a decisão do diretor da FD de afastar o docente, materializada na Portaria 19/2024 (13 de dezembro), pode não ser fortuita.
Consultado pelo Informativo Adusp Online, o advogado Márcio Sotelo Felippe, ex-procurador-geral do Estado (gestão Mário Covas), considera indevida a medida adotada pelo diretor Campilongo, no estágio inicial em que se encontra a apuração das denúncias.
“O afastamento cautelar é previsto no Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado apenas quando aberta a sindicância ou processo administrativo disciplinar. Sindicância é quando a pena prevista é até suspensão, processo administrativo é quando a pena é de demissão. No caso o que existe é apenas apuração preliminar, o que equivale ao mero inquérito policial, o investigado ainda não está sendo processado, não é réu”, diz Felippe.
“Há um decreto recentíssimo do governador Tarcisio, 69.122, de 9 de dezembro de 2024, que permite o afastamento cautelar na apuração preliminar nos casos de assédio etc. Obviamente o decreto não pode se sobrepor à lei. É manifestamente ilegal o decreto de Tarcísio e Campilongo sabe disso”, destaca. “O afastamento é uma antecipação da pena, na prática”.
Na avaliação da assessoria jurídica da Adusp, o decreto não difere do que propõe o Estatuto dos Funcionários Públicos (lei 10.261/1968), apenas regulamenta. As penalidades e práticas procedimentais também decorrem da lei e não deste decreto. A presidenta da Adusp, Michele Schultz, lembra que o afastamento cautelar de denunciados durante a fase de apuração é uma reivindicação do movimento de mulheres, com o objetivo de proteger as eventuais vítimas de contato com o denunciado.
“Essa medida evita que as pessoas que eventualmente tenham sofrido violência se encontrem com o provável assediador nos espaços da universidade. Na prática, se não há o afastamento do denunciado, quem acaba se afastando são as pessoas que fazem a denúncia, o que nos parece bastante injusto”. Michele salienta que essa medida orientou também as definições do Protocolo de Conduta da Adusp e ação similar foi incluída na proposta do Sistema de Acolhimento, Registro e Responsabilização para Situações de Assédio, de Violência, Discriminações e Outras Violações de Direitos Humanos ocorridas na Universidade de São Paulo (SUA), recentemente aprovado na PRIP.
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