A Assembleia Geral da Adusp realizada nesta quarta-feira, 1º de outubro, no Auditório César Lattes do Instituto de Física (IF), aprovou, após debate, a atualização do “Programa da Adusp para a USP”. Esse documento contempla cinco eixos — concepção de universidade, financiamento, democratização, condições de trabalho acadêmico e diversidade das pessoas docentes — e, ao final, um tópico denominado “Condições para a implementação deste Programa”, que aponta 12 medidas concretas.

Entre outras mudanças, o Programa recebeu o acréscimo substancial de quatro parágrafos referentes à instituição de políticas afirmativas efetivas para docentes PPI, “tais como reserva de vagas para pessoas negras e indígenas em concursos públicos e incentivo à progressão de carreira”; à inclusão de docentes e funcionáries com deficiência, “garantindo acessibilidade física, pedagógica, comunicacional e tecnológica, bem como condições de trabalho que eliminem barreiras e promovam sua participação efetiva em todas as atividades acadêmicas e administrativas”; à equidade de gênero na progressão na carreira docente, “adotando medidas de correção das desigualdades que afetam mulheres e pessoas gênero-diversas”; e ao combate a todas as formas de discriminação, preconceito e violência, “assegurando um ambiente acadêmico e institucional livre de racismo, sexismo, LGBTfobia, capacitismo, etarismo, xenofobia e quaisquer outras práticas excludentes”.

A nova versão do Programa foi encaminhada às três chapas que disputarão o processo sucessório da Reitoria da USP. Na véspera da Assembleia, o presidente da Adusp, professor Márcio Moretto, enviou convite às chapas para que participem de um debate, a ser realizado de preferência na semana de 20 a 24 de outubro, entre 14 e 18 horas, e aguarda resposta.

Além disso, a Assembleia deliberou que a Diretoria da Adusp, ouvindo o Coletivo de Docentes Negras e Negros da USP, promova uma campanha pela restituição da reserva de 175 vagas para negros e indígenas, indevidamente subtraídas das contratações por concurso em 2023, conforme apontado em ação da Defensoria Pública. Foi debatida também a importância de rearticular o GT Diversidade da Adusp.

A restituição das vagas para 175 docentes PPI nos concursos da USP para contratação de docentes foi incluída entre as doze “Condições para a implementação deste Programa”. Outras medidas defendidas nesse tópico são a revogação dos “Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira da USP” implementados pelas resoluções 7.344/2017 e 7.783/2019; a extinção da Comissão Especial de Regimes de Trabalho-CERT; e a revogação das mudanças estatutárias e regimentais que estabeleceram o “Estatuto do Docente” e a “Nova CPA” (Comissão Permanente de Avaliação).

Conheça a seguir a íntegra do “Programa da Adusp para a USP”.

I. Concepção da Universidade

  1. a Universidade deve ser pública, gratuita, laica e de qualidade socialmente referenciada, constituída por dever do Estado;  suas atividades constituem um bem público e não mercadorias;
  2. a Universidade deve ser autônoma nos âmbitos administrativo, acadêmico, pedagógico, científico e na gestão de seus recursos;
  3. a indissociabilidade de ensino, pesquisa e extensão deve ser garantida e estimulada;
  4. o ensino deve ser crítico, formador e emancipatório, em interação com a pesquisa e a extensão, contribuir para o desenvolvimento da reflexão e para a autonomia da ação, tanto no exercício profissional, como na prática social;
  5. a pesquisa deve ser um instrumento de aprimoramento científico, tecnológico, cultural, artístico, social, ambiental e econômico, contribuindo para o combate à desigualdade e a construção de uma sociedade soberana e equânime, reconhecendo a territorialidade de seus diversos povos e comunidades; e não pode ser condicionada a critérios alheios aos interesses da população ou que desrespeitem a sua diversidade;
  6. a pesquisa realizada na Universidade deve ser garantida com financiamento público adequado e não deve ser submetida a contratos com cláusulas que impeçam a ampla e irrestrita divulgação de seus resultados;
  7. a extensão deve constituir-se em uma política institucional, com origem e destino no ensino e na pesquisa, tendo como referência a identificação e o acompanhamento de problemas sociais relevantes, em diálogo com as diversas comunidades que os enfrentam, e com respeito  aos saberes que produzem; o acesso a seus resultados deve ser posto em circulação gratuitamente, de modo a contribuir com o debate e educação públicos;
  8. o produtivismo acadêmico, adotado pelas agências de fomento, pelas sucessivas reitorias, pela Comissão Especial de Regimes de Trabalho (CERT) e pelas Comissões centrais de avaliação, deve ser rejeitado, pois não promove a reflexão crítica, sacrifica a qualidade do trabalho acadêmico e fragiliza os laços sociais, desdobrando-se em ambientes competitivos, não colaborativos e hostis;
  9. a Universidade deve adotar políticas afirmativas de atendimento efetivo, no acesso e na permanência, a estudantes pertencentes a grupos sociais economicamente desfavorecidos e historicamente discriminados por motivo de raça, etnia, gênero, sexualidade, deficiência ou nacionalidade;
  10. a Universidade deve promover um amplo debate sobre a inserção dos campi da USP nas cidades onde estão localizados, que contemple o acesso da população aos seus espaços e a mobilidade para se chegar à Universidade, com prioridade para o transporte público e ativo (como caminhadas e uso de bicicletas);
  11. a Universidade deve envidar esforços para restituir o direito à aposentadoria integral com paridade aos docentes e aos servidores públicos em geral;
  12. a Universidade deve elaborar um plano abrangente de atividades artísticas e culturais em seus diversos campi de forma a promover sua integração com a sociedade;
  13. a Universidade deve promover um amplo debate com todo o corpo da Universidade para elaborar e implementar um plano de segurança e vivência nas unidades e nos campi e extinguir o convênio entre a USP e Secretaria de Estado da Segurança Pública;
  14. a Universidade deve reconhecer e dialogar com entidades e movimentos sociais internos e externos à USP.
  15. a Universidade deve instituir políticas afirmativas efetivas para docentes, tais como reserva de vagas para pessoas negras e indígenas em concursos públicos e incentivo à progressão de carreira; deve ainda dedicar atenção ao letramento racial de todas as pessoas que dela participam, de maneira a tornar o ambiente e o cotidiano acadêmico seguros para pessoas negras e indígenas; tais medidas devem ser construídas com a participação da comunidade negra e indígena da USP;
  16. a Universidade deve, com a participação da comunidade de pessoas com deficiência, assegurar a inclusão de docentes e funcionáries com deficiência, garantindo acessibilidade física, pedagógica, comunicacional e tecnológica, bem como condições de trabalho que eliminem barreiras e promovam sua participação efetiva em todas as atividades acadêmicas e administrativas;
  17. a Universidade deve garantir a equidade de gênero na progressão na carreira docente, adotando medidas de correção das desigualdades que afetam mulheres e pessoas gênero-diversas;
  18. a Universidade deve combater todas as formas de discriminação, preconceito e violência, assegurando um ambiente acadêmico e institucional livre de racismo, sexismo, LGBTfobia, capacitismo, etarismo, xenofobia e quaisquer outras práticas excludentes.

II. Financiamento da Universidade

  1. a manutenção da Universidade pública é de responsabilidade exclusiva do Estado;
  2. a Universidade deve contribuir para a crítica das políticas fiscais e se valer do seu reconhecimento na sociedade para conter o subfinanciamento de direitos sociais, combatendo o desvio do fundo público para o setor privado;
  3. o financiamento das universidades estaduais paulistas e do Centro Paula Souza deve contemplar a destinação de 8,64% da Receita Tributária Líquida (RTL) do estado de São Paulo já a partir das próximas Leis de Diretrizes Orçamentárias (LDO), percentual que corresponde em média a 10% do ICMS-QPE, pouco acima dos atuais 9,57% praticados;
  4. devem ser extintas todas as parcerias entre entidades privadas e a Universidade pública que apresentem conflitos de interesse, nos termos na Lei nº 12.813/2013 que dispõe sobre conflito de interesses;
  5. nenhuma das atividades da Universidade deve ser delegada a entidades privadas, em especial organizações empresariais e fundações privadas ditas “de apoio”;
  6. deve ser vetado o estabelecimento de convênio entre a Universidade e qualquer empresa ou fundação privada que tenha em sua administração ou conselho curador docentes, servidories técnico-administratives, integrantes da administração da USP ou de seu Conselho Universitário;
  7. deve ser vetada a cobrança de quaisquer cursos na USP, bem como de quaisquer taxas para participação em concursos públicos promovidos pela Universidade.

III. Democratização da Universidade

  1. a Universidade deve ser democrática e transparente em seu modo de funcionamento, nas suas deliberações e na destinação de sua produção. Sua administração deve estar fundada em organismos democráticos, com a participação da categorias docente, funcionáries técnico-administratives e estudantes, em proporção que não ultrapasse 70% de docentes, conforme disposto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/1996, LDB);
  2. departamentos ou órgãos equivalentes e unidades devem ser valorizados no que concerne às políticas de natureza acadêmica, científica e de avaliação institucional e do trabalho docente;
  3. devem ser estabelecidos mecanismos democráticos para eventuais impedimentos de chefias de departamentos, diretorias de unidades, pró-reitorias, vice-reitorias e reitorias;
  4. a carreira docente deve ser desvinculada da estrutura de poder, abolindo-se as exigências de titularidade para os cargos de chefia, presidências de comissão, direções e reitoria;
  5. deve ser criada a função de docente pleno, com os mesmos direitos estatutários e regimentais das e dos professores titulares. Para ascender à categoria de docente pleno, as pessoas docentes deverão se submeter a um concurso público nos mesmos moldes daquele para titular, exceto pelo fato de não haver cargo público envolvido;
  6. deve ser implementada a descentralização das decisões administrativas, orçamentárias e acadêmicas;
  7. deve ser democratizada a elaboração do orçamento da USP e garantir transparência na execução orçamentária, com a extinção dos Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira (Resoluções 7.344/2017 e 7.783/2019);
  8. deve ser criado um Conselho Fiscal, que viabilize com agilidade a fiscalização do destino dos recursos na USP;
  9. deve ser instituído um Conselho Social permanente, que cumpra o papel de interlocução com a sociedade;
  10. a administração da Universidade deve respeito irrestrito à Lei nº 12.527/2011 (Lei de Acesso à Informação, LAI);
  11. a eleição para Reitoria deve ocorrer por voto direto e paritário, sem lista tríplice e com possibilidade de candidatura de qualquer docente, assegurando que os votos das categorias docente, técnico-administrativa e estudante tenham o mesmo peso no resultado final.

IV. Condições de trabalho acadêmico

  1. o RDIDP deve ser o regime prioritário de trabalho na Universidade, proporcionando condições para o pleno atendimento de seus objetivos;
  2. a defesa do RDIDP pressupõe a valorização da carreira docente e a recuperação das perdas históricas e recentes dos salários. A possibilidade de “flexibilização do RDIDP” deve ser retirada dos Estatutos da Universidade;
  3. A Universidade deve adotar uma política salarial adequada, que assegure remuneração digna e estável, não podendo ser substituída ou compensada por expedientes precários como bônus e vales;
  4. a progressão nas carreiras de docentes e de funcionáries técnico-administratives deve ser determinada por critérios públicos, bem definidos após serem amplamente debatidos;
  5. deve ser atribuída importância efetiva ao ensino e à extensão na progressão na carreira docente e nos concursos de ingresso;
  6. a avaliação do trabalho docente deve ser qualitativa e global e se dar no âmbito das unidades, contemplando ensino, pesquisa, extensão e engajamento institucional, respeitando as condições específicas das diversas áreas do conhecimento e tendo precedência sobre qualquer procedimento externo ou centralizado de avaliação na universidade, sendo vedada a consideração de cursos de extensão pagos nesse processo;
  7. devem ser criados mecanismos internos à Universidade para o financiamento da pesquisa, que tenham caráter distributivo e cujo julgamento seja feito com base em critérios acadêmicos próprios, não vinculados àqueles utilizados pelas agências de fomento, empresas e entidades privadas;
  8. deve ser elaborado um programa para moradia estudantil e creches, de forma a fomentar adequadamente a permanência estudantil e contemplar toda a demanda qualificada, contribuindo para diminuir a evasão;
  9. no âmbito dos cursos de licenciatura, deve estar garantida a existência de uma instância que reúna periodicamente as coordenações de cursos, nos moldes da Câmara de Licenciaturas e Apoio Pedagógico, instituída em 2019;
  10. deve ser eliminada a terceirização de pessoal na Universidade;
  11. não devem existir contratos precários;
  12. a Universidade deve repor e ampliar o corpo de docentes e de funcionáries técnico-administratives, visando à qualidade das atividades de ensino, pesquisa, extensão e do engajamento institucional;
  13. o ambiente de trabalho e de estudo deve prezar pela qualidade de vida e de convívio visando, principalmente, à manutenção da saúde de docentes, servidories e estudantes;
  14. a Universidade deve construir procedimentos e protocolos para o enfrentamento das diversas formas de assédio. Deve assegurar celeridade na averiguação das denúncias e na garantia de proteção e não revitimização das pessoas denunciantes e das eventuais testemunhas, com possível afastamento das pessoas denunciadas;
  15. a Universidade deve atuar no sentido da aprovação do PLP 143/2020 (aprovado na Câmara dos Deputados em 26/08/2025 e enviado ao Senado Federal), que autoriza os estados, municípios e o Distrito Federal a efetuarem o pagamento retroativo de anuênios, quinquênios e licenças-prêmio, suspensos entre 28 de maio de 2020 e 31 de dezembro de 2021 pela Lei Complementar 173/2020;
  16. a Universidade deve cumprir de forma imediata e irrestrita a LC 191/2022, que garante a restituição da contagem de tempo aos profissionais da saúde;

V. Da diversidade das pessoas docentes

  1. a Universidade deve assegurar que os processos de avaliação do trabalho docente levem em conta as desigualdades de gênero, raça, sexualidade, deficiência e neurodiversidade, de modo a não reproduzir exclusões e garantir equidade de condições;
  2. a Universidade deve reconhecer o direito à parentalidade e todas as suas demandas nas avaliações dos estágios de experimentação e probatório das pessoas docentes, bem como em todos os processos de avaliação;
  3. a Universidade deve envidar esforços para superar o déficit na proporção de docentes negros e indígenas, aproximando-a da representação demográfica da população do Estado de São Paulo;

CONDIÇÕES PARA A IMPLEMENTAÇÃO DESTE PROGRAMA

  1. revogação dos “Parâmetros de Sustentabilidade Econômico-Financeira da USP”;
  2. extinção da CERT;
  3. revogação das mudanças estatutárias e regimentais que estabeleceram o “Estatuto do Docente” e a “Nova CPA” (Comissão Permanente de Avaliação);
  4. descentralização da distribuição de claros docentes e reposição automática das vagas resultantes de aposentadorias, falecimentos e rescisões aos locais de origem;
  5. ampliação do quadro de docentes e de funcionáries técnico-administratives, de modo proporcional à expansão ocorrida na universidade nas últimas duas décadas e com reposição das perdas causadas pelos Programas de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV 1 e 2);
  6. quando da contratação de docentes temporários em casos de licenças, afastamentos e editais em andamento, que os contratos sejam de no mínimo 24 horas/semana com garantias de condições dignas de trabalho e com vigência de acordo com o calendário do semestre letivo;
  7. reversão do desmonte a que a USP vem sendo submetida, que atinge em especial os hospitais, as creches, restaurantes universitários, a Escola de Aplicação, os museus e laboratórios, entre outros órgãos;
  8. garantia de adequado financiamento à luz da reforma tributária;
  9. instauração de um amplo processo de debate sobre a estrutura de poder da universidade, com vistas à democratização de todas as suas instâncias decisórias;
  10. restituição da reserva de 175 vagas para docentes negros e indígenas, correspondente às vagas não reservadas nos 276 concursos excluídos da política de cotas aprovada em 2023;
  11. compatibilização das normas da USP com o ordenamento constitucional e infraconstitucional vigente no país;
  12. implementação das mudanças estatutárias e regimentais necessárias para que o presente programa possa vigorar.

Este documento foi deliberadamente escrito em linguagem inclusiva e neutra, empregando o sistema elu/delu para sua maior acessibilidade. Para maiores informações consulte: https://is.gd/linguagemneutra e também http://www.sies.uem.br/trabalhos/2017/3112.pdf12.

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