“A Universidade de São Paulo em tempos de Coronavírus vai realizar as atividades via moodle. O detalhe é que a moradia estudantil que fica dentro do campus não tem acesso de qualidade à Internet”. O relato no Facebook é de Ronaldo Andrade, doutorando do Instituto de Biociências (IB) e morador do Conjunto Residencial da USP (Crusp), cujos problemas se agravaram com as restrições provocadas pelo combate à epidemia.

“‘Acesso à Internet’ é tão genérico”, ironiza o estudante Tiago Campos, da FFLCH, em outra postagem na mesma rede social. “O cara com celular trash e 2 gigabytes de plano de dados móveis por mês tem ‘acesso à Internet’, mas se assiste [a] 10 ou 15 vídeos já esgota os dados móveis. Muita gente não tem notebook ou desktop ou Internet banda larga e sofre dez vezes ou mais para fazer o curso virtualmente, do que outros”. “E tem professor mandando e-mail falando para as pessoas comprarem um pacote de Internet mais caro. Absurdo!”, completa a aluna Lorrana Guimarães.

Essas evidências óbvias de dificuldade de acesso à Internet de expressiva parcela dos estudantes da USP, num momento em que o vestibular tornou-se mais permeável às camadas mais pobres da população graças às cotas, estão sendo totalmente ignoradas pelas pró-reitorias de Graduação e Pós-Graduação e por direções de unidades, que decidiram constranger docentes para que convertam disciplinas presenciais em disciplinas a distância. Os estudantes não têm alternativa. Como resultado dessa diretiva da Reitoria, muitas disciplinas já estão sendo oferecidas nesses moldes. Uma exceção importante é a Faculdade de Educação, que decidiu que não converterá ensino presencial em a distância.

Unidades estão consultando formalmente os estudantes para que informem as condições materiais de equipamentos e acesso à Internet que dispõem, por meio do preenchimento de um formulário criado pela Reitoria, disponível em https://docs.google.com/forms/d/e/1FAIpQLSfswWwpzH4D5ZPZxci3osuxwDcul5ljht-RpXPPc8Nzmg14IQ/viewform?usp=pp_url.

Em comunicado dirigido aos docentes e alunos da Graduação, a direção e a Comissão de Graduação da FFLCH avisam que “serão enviados formulários relativos a ferramentas de Educação a Distância (EaD) a ambas as categorias”. Tais formulários, “que devem ser respondidos em caráter de urgência, buscam obter informações sobre as reais condições e necessidades de professores e alunos de graduação da unidade quanto à utilização de — e ao acesso a — tais ferramentas (as de EaD)” (destaques no original).

“Assim sendo”, prossegue, “e até a consecução e a tabulação do citado levantamento — período estimado para término em 8 de abril de 2020 —, as atividades de disciplinas que já estejam se valendo de tais ferramentas — as de EaD — deverão ser desenvolvidas normalmente sem, entretanto, haver cômputo de frequência ou avaliações que impliquem nota” (destaques no original).

Mensagem semelhante foi enviada pela direção da Escola de Comunicações e Artes (ECA) aos seus estudantes. “Apartir do anúncio da suspensão das aulas presenciais devido ao avanço da pandemia do novo Coronavírus, os Departamentos de Ensino da ECA, as CCPs (Comissões Coordenadoras de Programas de Pós-graduação) e as CoCs (Comissões Coordenadoras de Cursos) têm se esforçado em encontrar maneiras de dar continuidade, da melhor forma possível, às atividades acadêmicas do primeiro semestre”, principia.

Porém, o teor do comunicado da ECA é mais impositivo que o da FFLCH: “Desde então, Chefias de Departamentos, CoCs e CCPs estão em contato com os docentes, levantando dados sobre particularidades de cada disciplina, quais serão ministradas integral ou parcialmente on-line, quais só poderão ser ministradas após o período de quarentena, bem como sobre quais os recursos necessários aos alunos para seu acompanhamento. Na próxima semana, assim que esses dados estiverem consolidados, estudantes de graduação e pós-graduação receberão essas informaçõespor e-mail enviado pelas coordenações de seus cursos” (destaques no original).

O parágrafo seguinte da mensagem deixa claro que há uma decisão já tomada: “Diante de uma situação gravíssima e sem quaisquer precedentes, cabe ainda agradecer os esforços de professores (aqui copiados), funcionários e estudantes da ECA em dar andamento à maior parte das atividades programadas e preservar ao máximo o compromisso pedagógico de cursos de graduação e programas de pós-graduação”.

“O que me parece surpreendente nessa política é achar que os estudantes em quarentena dentro de casa estão com condições psicológicas para assistir todas essas aulas — 20 ou mais horas por semana. Incrível a falta de sensibilidade da direção da USP”, deplora o presidente da Adusp, professor Rodrigo Ricupero.

EXPRESSO ADUSP


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