Conjuntura Nacional
Após sofrer ameaça de morte por e-mail, vereadora Rai Almeida, de Piracicaba, recebe ampla solidariedade
No último dia 2 de março, Jair Bolsonaro esteve na cidade para receber título de "Cidadão Piracicabano", concedido pela Cãmara Municipal em 2023
No dia 3 de março, a vereadora Rai de Almeida (PT), de Piracicaba, recebeu mensagem por e-mail na qual é ameaçada de morte, estupro e tortura. O remetente é explícito, sendo mais provável tratar-se de uma invasão, pelo autor das ameaças, da conta de outra pessoa. Enviada para o endereço eletrônico institucional da vereadora, a mensagem descreve com detalhes as violências que seu autor diz que pretende praticar, além de conter declarações pedófilas, ameaças à população em geral e até, no final, uma saudação nazista.
“Confesso que ao fazer a leitura eu fiquei impactada com o conteúdo e a violência que está inserida na mensagem”, declarou a vereadora ao Jornal de Piracicaba, segundo reportagem de André Thieful publicada no dia 5 de março. “É um fato que chama atenção e é importante dizer que é a apologia ao nazismo”.
Acompanhada de sua advogada e assessores, Rai de Almeida compareceu ao plantão policial para registrar boletim de ocorrência. “A Polícia Civil registrou o caso e deu início imediato à investigação a partir do nome e endereço eletrônico que aparecem no e-mail”, informou em nota a vereadora. “Tomamos todas as medidas de segurança necessárias para o momento. Trata-se de uma violência contra esta vereadora e também contra o papel que ela representa no cenário político local como política e como mulher”, declarou.
“Não vamos nos intimidar. Vamos auxiliar a Polícia no que for preciso para que encontremos o autor dessa mensagem e a justiça possa dar a ele o que prevê a lei. Não vamos descansar até encontrar o autor dessas ameaças”, acrescentou a vereadora do PT. A Presidência da Câmara Municipal afirmou que também está tomando medidas para ampliar a segurança do órgão e de quem circula nas suas dependências.
Rai vem recebendo inúmeras manifestações de solidariedade, de entidades como Apeoesp-Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo, Sindicato dos Trabalhadores do Centro Paula Souza (Sinteps), Sindicato dos Jornalistas Profissionais no Estado de São Paulo, Sindicato dos Professores de Campinas (Simpro Campinas), Sindicato dos Bancários de Piracicaba, Acampa Brasil pela Paz e o Direito a Refúgio, e de diversos parlamentares. O Diretório Estadual do PT emitiu nota oficial sobre o caso. A Adusp também manifesta total solidariedade a Rai, repudiando energicamente um tal propósito de violência, que deve ser plenamente combatido na semana do Dia Internacional da Mulher.
Na sessão realizada no dia 4 de março na Câmara Municipal, vereadores de diferentes partidos repudiaram, da tribuna, a ameaça dirigida a Rai e se solidarizaram com ela, relatou o Jornal de Piracicaba. “A Rai é uma pessoa combativa, luta pelos direitos humanos, luta pelas mulheres”. “Isso é uma falta de respeito e de escrúpulos”, assinalou Silvia Morales (PV). “Momentos como esse não deveriam existir em pleno 2024, essa violência, esses ataques por conta de não pensar igual”, deplorou Pedro Kawai (PSDB). “Isso é uma tamanha covardia, canalhice. Sei da sua bravura, sua competência, seu trabalho aguerrido nesta Casa”, disse Paulo Campos (Podemos).
No último dia 2 de março, sábado, o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) esteve em Piracicaba para receber o título de “Cidadão Piracicabano”, que lhe foi concedido em 14 de dezembro do ano passado pela Câmara Municipal, por ampla maioria de votos. Naquela ocasião, apenas duas vereadoras votaram contra o projeto: Rai de Almeida e Sílvia Morales. Porém, não há evidências, ao menos por enquanto, de vinculação entre o voto desfavorável de Rai e as ameaças que recebeu por e-mail.
“Câmara Municipal submete Piracicaba a um vexame”, diz IPEDD
A homenagem prestada a Bolsonaro pela Câmara Municipal expõe essa casa, e por extensão a cidade de Piracicaba, a um “vexame nacional”, diz uma nota emitida em 1o de março pelo Instituto Piracicabano de Estudos e Defesa da Democracia (IPEDD).
Trata-se de uma “chaga [que] ficará impregnada para sempre na imagem e no prestígio do poder legislativo local, envergonhando o povo de Piracicaba”. Isso porque o ex-presidente é alguém que, na avaliação do IPEDD, “salvo falência múltipla das instituições da República, sentará em breve no banco dos réus e será, muito provavelmente, condenado por crime contra a democracia brasileira”.
O documento lembra que Bolsonaro, quando da aprovação do projeto pela Câmara Municipal, já havia sido punido pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que o impediu de candidatar-se a qualquer cargo público por oito anos, e, “ademais, o estágio das investigações a respeito do envolvimento do ex-presidente na trama golpista contra a democracia brasileira, na ocasião, já apontava fortes indícios do seu acumpliciamento como principal responsável”.
Desde então, “as investigações avançaram celeremente, a partir da coleta de computadores, celulares e outros materiais comprometedores, e de prisões, tendo inclusive sido resgatado um vídeo que reportava na íntegra reunião ministerial comandada pelo ex-presidente no dia 5 de julho de 2022, quando ficou nítido o intento golpista”.
Depoimentos de pessoas detidas associados ao exame da documentação apreendida confirmaram as motivações de outros encontros de articulação golpista, completa o IPEDD, citando em especial os que trataram da minuta de um decreto presidencial que propunha o estado de defesa e, como decorrência, as prisões de Rodrigo Pacheco, presidente do Senado, e dos ministros Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
“Não restam mais dúvidas sobre o intento conspiratório contra a democracia brasileira e igualmente sobre o papel central do ex-presidente Jair Bolsonaro nesse desiderato”, destaca o documento do instituto. “No ato na Avenida Paulista no último dia 25 de fevereiro, o ex-presidente admitiu a existência da minuta do golpe, avaliando cinicamente que tal decreto não foi assinado e, portanto, não constitui crime”.
Por outro lado, aponta, os próprios golpistas, dentre eles Bolsonaro, “cientes de sua condição”, clamam agora por anistia que os beneficie. “Admissão da existência da minuta do golpe e o clamor pela anistia aos implicados significa inapelavelmente a confissão do crime!”.
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