Daniel Garcia

Na aula inaugural do segundo semestre realizada na FAU em 4/8, como parte da agenda de greve da Comissão de Mobilização da Adusp, o professor Vladimir Safatle, do Departamento de Filosofia da FFLCH, falou sobre os desafios da universidade nesse momento em que “mais do nunca temos que refletir”. A auditório da FAU ficou lotado por professores, funcionários e, sobretudo, estudantes de várias unidades da USP.

Como seria a universidade em 2018 (ano do início da próxima gestão reitoral)? Para Safatle, poderíamos pensar em uma universidade que tivesse seu reitor eleito de uma forma democrática, assim como os membros do Conselho Universitário, que passaria a ser composto por estudantes, funcionários, professores, pesquisadores com importância nacional. “Isso [esse panorama] poderia permitir uma definição melhor de prioridades, assim como teria permitido também uma racionalização dos gastos. No entanto, sabemos que nada dessa visão conciliatória ocorrerá”.

Em 2018, prosseguiu, “é bem provável que nós estaremos em guerra” (interna). “Depois de várias tentativas, eu diria que a casta burocrática, que controla a Reitoria há algumas décadas, pressionada por um governo privatista, vai tentar implementar uma reforma baseada na cobrança de anuidades, na flexibilização dos regimes de trabalho dos professores e fechamento de cursos de baixa procura”. Sobre o impasse atual vivido pela USP, comentou: “Estamos diante do sintoma brutal do esgotamento completo do nosso sistema universitário”.

Burocracia acadêmica

Safatle avalia também que entre dois modelos de universidade — um no qual os administradores estão separados da academia; e outro no qual o reitor é eleito dentre membros de um conselho por voto paritário de toda a comunidade acadêmica — a USP não segue nenhum e, muito pelo contrário, conjuga os defeitos de ambos: “No nosso modelo, as atividades acadêmicas e administrativas são desempenhadas igualmente pelo mesmo corpo, que é de professores. Mas o Conselho Universitário e as instâncias que vão constituindo a política dentro da universidade são opacos, têm uma representação profundamente distorcida e, por causa dessa e de outras características, esse sistema privilegiou o aparecimento de uma burocracia acadêmica”.

“Da elite cafeeira paulista, que fundou nossa universidade, a USP herdou seu sistema de eleição farsesca. Esse sistema produziu o desenvolvimento de uma classe de burocratas que consegue agir com completa autonomia com muita pouca equação. Eles se afastam gradativamente das atividades de docência, de pesquisa; eles passam de um cargo para outro na universidade, independentemente das mudanças de gestão; sua maior preocupação passa a ser a sua autopreservação. Na verdade, o Brasil deve ser um dos poucos países em que você pode produzir um deficit de 1 bilhão de reais em uma universidade e depois ser promovido a conselheiro. Você pode ainda participar ativamente de uma administração que produziu esse deficit, se tornar reitor afirmando nada saber sobre o problema.”

Na opinião de Safatle, o fato de o reitor ser nomeado pelo governo estadual — “poder exterior que pode colocar a universidade de cabeça para baixo”, por ser uma “instância político-partidária” — faz com que a USP tenha de prestar contas ao governador e não à sociedade, o que contribui mais ainda para a impunidade. E defende que a racionalidade administrativa só seria garantida com a participação da comunidade na tomada de decisões.

“Infelizmente, essa não será a primeira instituição no Brasil onde a sua incapacidade crônica de se renovar e de se democratizar efetivamente leva, em última instância, ao seu colapso completo. A incapacidade de compreender que a democracia é a melhor maneira para que você possa ter as melhores decisões, para que você possa fazer coisas mais representativas, para que você possa ter uma situação universitária à altura daquilo que a nossa universidade pode ser e pode realizar quanto ao seu destino e sua vocação”.

 

EXPRESSO ADUSP


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