A assembleia geral da Escola de Artes, Ciências e Humanidades (EACH-USP) realizada na manhã de 10/3 no Auditório da História, no campus do Butantã, com a participação numerosa de docentes, estudantes e funcionários, mostrou que cresce a indignação com as atitudes dúbias da nova gestão reitoral no tocante ao descalabro imposto à unidade, que desembocou na interdição judicial do campus leste em janeiro último.

O descumprimento da promessa do reitor Marco Antonio Zago de que o ano letivo de 2014 teria início em 10/3, qualquer que fosse o local das aulas, bem como a fixação de uma nova data, 24/3, apostando na desinterdição e sem que a USP tenha providenciado um local alternativo para abrigar provisoriamente a EACH, foram objeto de forte crítica por vários docentes engajados no movimento.

Também foi destacado o fato de que a Reitoria tem descartado a opinião dos membros da Comissão Ambiental da unidade, criada por portaria do reitor na gestão anterior, com a atribuição expressa de participar das decisões relacionadas aos problemas ambientais da EACH. Foi relatado que a Superintendência do Espaço Físico (SEF) toma decisões unilaterais e formula documentos sem a participação da Comissão Ambiental.

Petição da Adusp

Na assembleia, o professor Francisco Miraglia, diretor da Adusp, apresentou os termos da petição que a entidade encaminhou à 2a Vara da Fazenda Pública em 6/3. Nesse documento, a Adusp manifesta seu entendimento de que “as ações que a USP alega já terem sido empreendidas para as regularizações ambientais pertinentes, na verdade, se revelam insuficientes e incipientes a fim de dar efetividade às exigências impostas pela Cetesb”.

A petição cita como exemplo o auto de inspeção lavrado pela Cetesb em 8/1/2014, segundo o qual não foi apresentada “a comprovação do recobrimento de todas as áreas permeáveis do solo do campus da USP Leste da Gleba I com solo livre de contaminação e plantio de gramíneas, o que poderá acarretar novas sanções legais”.

Critica a constituição, pela Reitoria, “sem qualquer interlocução com a comunidade da EACH a esse propósito”, da chamada Comissão de Notáveis, por sobrepor-se às competências da Comissão Ambiental e do Grupo de Trabalho Técnico, já existentes (Portarias 6388 e 6389 de 2013), e deslegitimá-las.

Por fim, reforça a grave advertência da Comissão Ambiental quanto ao risco de um eventual retorno ao campus leste sem que tenham sido tomadas todas as medidas preventivas e de remediação recomendadas pela Cetesb, expressando a preocupação da Adusp “em caso de desinterdição próxima do campus sem as providências adequadas para garantir a saúde e a segurança da comunidade” (vide íntegra da petição).

Questionamentos

A discussão sobre os próximos passos da luta e sobre o “Plano B” revelou que há um grupo, no movimento, que apoia a desinterdição imediata, portanto sem que haja a implantação completa das medidas determinadas pela Cetesb. Nesse sentido, alguns professores se disseram contrários à petição apresentada pela Adusp, considerada por eles “intempestiva”.

O professor Andrea Cavicchioli manifestou ser “um tiro no pé apoiar a interdição”, enquanto o professor Alessandro Silva alegou que a petição foi encaminhada “sem que a assembleia fosse consultada”. Já a professora Graziela Perosa propôs a retirada da petição: “Deveríamos apoiar a Reitoria na desinterdição”, disse.

Vários dos presentes, porém, defenderam a petição e o acerto de seu encaminhamento. A professora Adriana Tufaile, diretora da Adusp e participante de primeira hora do movimento da EACH, informou que a iniciativa foi solicitada pela Comissão Ambiental. “A gente tinha pressa, porque a juíza deu um despacho e tínhamos a informação de que a USP poderia levantar a desinterdição no dia 6. Os membros da Comissão Ambiental têm essa prerrogativa”. Ela recordou que “em praticamente todas as assembleias surge pedido de intervenção judicial da Adusp”, e que a vistoria realizada pelo Corpo de Bombeiros também foi solicitada pela Adusp, a pedido de uma assembleia anterior.

“Nossa compreensão do movimento da EACH não é interdição versus desinterdição. É obtenção de condições dignas e saudáveis de trabalho na EACH”, explicou o professor Miraglia, respondendo às críticas em nome da Adusp. “A assembleia da Adusp tomou a decisão de defender os docentes e a comunidade da EACH”.

Ele leu os trechos finais da petição, enfatizando que “não há, por parte desta entidade representativa, qualquer oposição à liberação do campus, é bem verdade que gostaríamos muito que não tivesse sido necessária tal medida, e bem melhor seria se a comunidade pudesse retornar às suas atividades rotineiras confortavelmente”, mas “não antes de se afastar os riscos imediatos e mediatos para o retorno dessas atividades, condição essa que, infelizmente, a Administração da Universidade não logrou demonstrar ter alcançado ou estar próxima de alcançar”.

A professora Bete Franco, que coordenou a assembleia, acrescentou que a Comissão de Mobilização apoia a petição da Adusp. A funcionária Fabiana Pioker, em uma intervenção contundente, disse ter perdido totalmente a confiança na Reitoria: “Participei da elaboração da petição, concordo com ela e assinaria novamente”, destacou.

“Lance midiático”

Muitas das intervenções na assembleia consolidaram a avaliação de que a atual gestão da Reitoria repete erros da gestão precedente, e de que seria um grave equívoco desinterditar o campus leste e retomar as atividades sem atender às 13 exigências da Cetesb: “Que mal há em lutar por um campus que seja saneado ambientalmente?”, indagou o professor Marcos Bernardino de Carvalho, da Comissão Ambiental, para acrescentar: “Chamar uma Comissão de Notáveis é um lance midiático. Há alguém mais habilitado para opinar sobre os problemas ambientais da EACH do que o Grupo Técnico?” Por fim, opinou que “não há hipótese de esse campus ser desinterditado num horizonte próximo”.

A professora Michele relatou haver conversado com técnicos da Weber Ambiental (empresa contratada pela USP para substituir a Servmar), os quais “estão assustados porque estão encontrando muito metano” logo abaixo do piso, e chamou atenção para a questão da segurança: “Não sei que riscos estou correndo na EACH, porque não temos uma avaliação de risco do campus tudo” .

“Quero voltar para a EACH, estudar na Zona Leste, mas estudar com qualidade e segurança”, disse Bia Michele, estudante de pós-graduação. “Rodas foi totalmente negligente. Zago, mesmo aberto ao diálogo, também se mostra negligente. A USP é incapaz de conseguir um espaço para a EACH?”

Outro aluno da EACH, Daniel Vartanian, procurou dialogar com os docentes que defendem a volta imediata ao campus contaminado e passível de explosões, dirigindo-se diretamente a eles: “Vocês são doutores. Vocês chegaram a ver os laudos, a juíza decidindo a favor da interdição. Como é possível alguém pensar que estava tudo bem? [Antonio] Massola, [ex-dirigente] da SEF, é doutor da Poli, no entanto todas as construções da EACH são irregulares. A gente vai voltar, vai se acomodar a essa situação?”

“Cadê a Poli?”

O professor Alberto Tufaile relatou sua conversa com Zago, quando da visita deste à EACH com a Comissão de Notáveis: “O reitor colocou que não estava sabendo como resolver”. Ele lembrou que foi a própria Reitoria (SEF), ao colocar a placa de interdição da área do aterro ilegal em 2013, quem alertou para o grave problema da contaminação do campus. Zago “falou grosso” que as aulas começariam em 10/3, mas não cumpriu, assinalou o docente. Em outra intervenção, fez referência ao anúncio da Reitoria, na gestão de J.G. Rodas, de que a Escola Politécnica abriria cursos no campus leste: “Cadê a Poli, gente?”

A professora Bete Franco chamou o movimento a manter e “costurar uma unidade”. Diferenças de posição não podem virar ataque pessoal, advertiu. Considerou absurda e irresponsável a decisão de marcar o dia 24/3 para o início das aulas, “sem dizer onde”. “Não quero voltar para a EACH nesta condição, me sinto desrespeitada. Se o coletivo de professores não processar a USP, vou processar individualmente”, revelou. “Temos que nos desapartar da instituição”, finalizou, destacando a dimensão histórica da luta política que vem sendo conduzida pelo movimento.

Fabiana Pioker detalhou as inverdades que vêm caracterizando o comportamento da Reitoria, inclusive no relacionamento entre a SEF, agora dirigida por Osvaldo Nakao, e os membros da Comissão Ambiental, da qual a funcionária faz parte. “Mentiram quanto ao objeto do contrato com a Weber”, exemplificou. “Não iniciaram o processo de retirada da terra [contaminada]. Nomearam notáveis e ignoram a Comissão Ambiental. E agora temos de ouvir de colegas que estamos exagerando?” Foi muito aplaudida ao encerrar sua fala: “Se voltarmos para lá sem a implantação das medidas, sabe quando elas vão acontecer? Nunca!”

Direção criticada

Houve críticas à nova direção da EACH, que participou da assembleia. A diretora, professora Maria Cristina Motta de Toledo, comentou genericamente as críticas, afirmando que “todo e qualquer comentário, mesmo os mais ásperos, serão considerados uma oportunidade de aperfeiçoamento”.

A professora Michele Schultz ponderou que, embora não haja uma crise de confiança do movimento na diretoria, a mudança de postura em relação à gestão anterior não se concretizou. Na mesma linha, o professor Marcelo Nerling expressou que “não existe ruptura nem na Reitoria, nem na EACH”, verificando-se uma continuidade, e que a Congregação continua se furtando de mudar o regimento interno. Já o professor Alessandro Silva afirmou que a nova direção assumiu apenas em janeiro e que “é injusto acusá-la como se estivesse lá há anos”.

Na assembleia, Maria Cristina disse, a propósito da possível inoperância ou desinteresse da Reitoria em localizar um imóvel capaz de abrigar temporariamente a EACH, que “as buscas estão sendo feitas” e que “não é [tratado como] segredo”.

Encaminhamentos

Nova assembleia geral da EACH foi convocada para 17/3. Seria precedida por assembleias setoriais. Confira as decisões da setorial dos docentes.

Informativo nº 377

EXPRESSO ADUSP


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