Produtivismo
Produtivismo: Novos debates devem aprofundar o tema, dizem professores
Que impressões deixou entre os docentes o debate promovido pela Adusp em 11/3, “Produtivismo: a que veio? A quem serve?”, reunindo o presidente da Capes, Jorge Guimarães, o representante da Fapesp, Luis Henrique Lopes, e os professores Yaro Burian Jr., Eunice Durham e Lucídio Bianchetti (Informativo Adusp 302)? Pedimos a alguns colegas que avaliassem a iniciativa, levando em conta o teor das discussões travadas no auditório da História.
“O debate teve o mérito de reunir docentes e gestores de agências financiadoras. Resta ver se estes últimos começam a fazer a lição de casa. Esperemos que o modelo possa mudar em breve, em função de debates como este”, diz o professor Ademar Ferreira (EP). “O pesquisador tem que ser capaz de encontrar na própria pesquisa que faz a motivação para a busca incessante e a eventual criação de algo novo, e partilhar tal experiência com seus alunos. Não pode ser pautado por agências de fomento a exigir-lhe continuadamente produtividade em forma de publicações”.
A professora Lucília Borsari (IME) considera que o debate “cumpriu o papel de trazer à discussão pública um tema que nos assombra cotidianamente”. Graças a ele, pôde observar “a fragilidade dos argumentos” de colegas que estão, ou estiveram, à frente das instituições de fomento, em sua defesa da avaliação “meramente quantitativa” do trabalho acadêmico: “Confesso que, em alguns momentos, vivenciei a sensação de constrangimento ao ver nosso trabalho sendo resumido a mero produto. Por outro lado, constatei a força de instrutivos exemplos e histórias que denunciam os muitos desvirtuamentos que a quantificação gera no trabalho e nas relações universitárias”.
Ao mesmo tempo, pondera Lucília, a mesa redonda não foi inteiramente satisfatória: “Frustrou-me um pouco não ver abordadas de modo mais completo as indagações propostas, ou seja: a que veio e a quem serve essa perspectiva produtivista? Talvez a continuidade desse debate possa nos ajudar a encontrar respostas”. Preocupação semelhante foi apontada pelo professor Marcos Barbosa (FE): “É animador que a Adusp esteja promovendo este debate, mas também precisaria haver uma discussão mais aprofundada, que trouxesse o histórico do problema”.
Já a professora Marie Claire Sekkel (IP) deixou o local com o sentimento, “algo desolador”, de que o debate “não foi uma boa experiência no sentido de instigar boas questões”, tendo em vista alguns comentários de debatedores, como “saudosismo” e “choradeira”, os quais na sua opinião depreciam a crítica. “São termos que desqualificam o interlocutor”, frisa ela. A “rebarba positiva” em meio a essa impressão desanimadora veio posteriormente, quando leu um dos textos recomendados por Bianchetti.
Indagações
O professor Barbosa comenta a ênfase dada pelo professor Luis H. dos Santos, representante da Fapesp, à avaliação por pares. Ele disse que não pôde permanecer até o final do debate, do contrário teria encaminhado duas indagações ao professor: 1) quem, ou qual instituição ou órgão, deve designar a pessoa que vai distribuir o projeto entre os pareceristas, já que essa pessoa termina por concentrar um poder muito grande em suas mãos; 2) a má qualidade de alguns pareceres sugere que determinados pareceristas, pressionados para produzir seus próprios trabalhos acadêmicos, dedicam pouco tempo à avaliação dos projetos que lhe são confiados pela Fapesp (“um projeto de orientando que encaminhei recebeu parecer vergonhoso; protestamos e foi refeito”).
Barbosa informa que pretende assistir ao vídeo do debate, disponível na página eletrônica www.adusp.org.br, para ouvir detidamente as declarações da professora Eunice Durham. “Fiquei com a impressão de que ela estaria desvalorizando a avaliação qualitativa por pares. Mas é o que deveria ser mais valorizado, em vez dessa avaliação quantitativa”, opina o professor.
A professora aposentada Judith Klotzel (ICB), ex-presidente da Adusp (1985-1987), considera muito positiva a iniciativa da entidade: “Foram vários depoimentos importantíssimos”. Ela destaca a denúncia da professora Eunice quanto a “pessoas que assinam todos os trabalhos em seu departamento, sem que tenham contribuído”.
Judith também se declara “muito preocupada com a posição da Capes”, pois está “completamente baseada em princípios terríveis e que acabam comprometendo completamente a qualidade e a finalidade da pós-graduação”.
Marie Claire vai além, avaliando como “esmagadora” a fala do professor Jorge Guimarães, “em vários sentidos”. No entender da professora do IP, a Capes enxerga os docentes como “um produto entre os produtos”. Em outras palavras: “Somos os produtos que produzem”, define ela, que notou no discurso do presidente da Capes “um tom de impermeabilidade ao diálogo”.
O professor Ferreira segue a mesma linha de raciocínio: “Entendo por produtivismo o modelo de promoção e avaliação da pesquisa científica e formação de pessoal que privilegia a métrica de desempenho pelo número de papers publicados anualmente. Tal modelo, difundido no Brasil e no mundo a partir dos anos 1990, introduz enorme distorção no processo da pesquisa científica, produzindo efeitos danosos aos docentes e à própria atividade de pesquisa. Pesquisar para publicar, sob pena de não mais ter acesso a financiamento e alunos, é frustrante e contraproducente”, critica. “Os jovens pesquisadores deveriam ser formados em ambiente mais livre, sem o peso, às vezes desumano, de produzir papers em processo de extrema competitividade”.
Informativo n° 303
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