Em depoimento à CPI das Universidades da Alesp, Carlos Graeff alertou os deputados para o fato de que jovens pesquisadores já estão abandonando a carreira por falta de perspectiva e de que cada vez mais cientistas qualificados vão deixar o Brasil. “Essa é a maior tragédia para o país, porque são milhões investidos para formar os docentes numa das nossas três universidades. Estamos entregando para os outros países todo esse talento”, lamentou

O pró-reitor de Pesquisa da Unesp, professor Carlos Frederico de Oliveira Graeff, qualificou como “uma tragédia a médio e longo prazo” a realidade dos sucessivos cortes de bolsas e de recursos das agências de fomento, principalmente por parte do governo federal. Ouvido pela CPI das Universidades da Assembleia Legislativa de São Paulo (Alesp) nesta segunda-feira (9/9), Graeff alertou os poucos deputados presentes para o fato de que os cortes de verbas têm reflexos imediatos e também graves consequências no futuro, como a fuga de cérebros das instituições brasileiras.

“O que mais preocupa atualmente a nossa comunidade são os cortes na Capes [Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nìvel Superior], previstos em quase 50%. Isso quer dizer que metade das pesquisas que envolvem alunos de pós-graduação – e não há como separar formação de pessoal da pesquisa científica nas universidades – vai desaparecer”, afirmou Graeff.

O pró-reitor reforçou que não se referia apenas à questão imediata dos jovens pesquisadores que já estão desistindo da carreira por falta de perspectivas, mas também ao cenário de fuga de cérebros. “Se não tenho pessoal e recursos aqui, vou procurar em outro lugar. Essa é a maior tragédia para o país, porque são milhões investidos para formar os docente numa das nossas três universidades. Estamos entregando para os outros países todo esse talento”, prosseguiu. “Um ambiente como esse é uma tragédia de médio e longo prazo. Nós não vamos ver as consequências imediatamente, no ano que vem, que possivelmente será trágico porque um corte desse nível nunca se viu, mas daqui a cinco ou dez anos veremos essa debandada daquilo que temos de melhor, a nossa elite que vai sair [do Brasil].”

Graeff, que já foi professor da Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras de Ribeirão Preto (FFCLRP) da USP e coordenador do mestrado profissional na área 47: Materiais da Capes, também citou o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) como outra vítima de “contingenciamentos terríveis”, cujo subfinanciamento já havia sido determinado pela Lei Orçamentária. “Para cobrir o déficit, será necessário publicar uma nova lei para que tenhamos recursos até o final do ano”, lamentou.

Perguntas dos deputados repisam os mesmos temas

A situação descrita por Carlos Graeff – ao responder a perguntas do deputado Paulo Fiorilo (PT), suplente da CPI – não pareceu sensibilizar os demais parlamentares, que não se aprofundaram no tema. Tanto o pró-reitor da Unesp quanto seu congênere da Unicamp, Munir Salomão Skaf, também ouvido pela comissão, foram questionados sobre os mesmos tópicos que se repetem na CPI, ou seja, basicamente procedimentos burocráticos referentes a diárias, viagens ou questões ligadas a carreiras e salários.

Instalada em abril, a comissão atravessa os meses oferecendo palco para agressões variadas ao vernáculo e à lógica e também para demonstrações do imenso desconhecimento dos parlamentares quanto ao universo acadêmico. Seu presidente, Wellington Moura (Republicanos), por exemplo, questionou Graeff sobre cumprimento de carga horária e recebimento de salário, já que o docente estaria “em afastamento” para atuar como pró-reitor em São Paulo e portanto não cumpriria integralmente seu horário como professor e pesquisador em sua unidade de origem, em Bauru.

As únicas questões que fugiram do script habitual das sessões também partiram de Fiorilo, que perguntou sobre a relação da Unesp com as 17 fundações privadas ditas “de apoio” que atuam na universidade. O deputado quis saber como essas entidades são auditadas. Quem respondeu foi a subchefe da Assessoria Jurídica da Unesp, Melyssa Tomasini, que afirmou que “quaisquer ajustes formalizados com a universidade em que haja ingresso de dinheiro público ou privado, independentemente de ter a interveniência de uma fundação, são auditados pelo Tribunal de Contas do Estado [TCE]”. Fiorilo disse que vai apresentar requerimento à CPI para solicitar essas auditorias ao TCE.

A CPI está caminhando bem nesse aspecto de levantar essa provocação”, diz deputada

Munir Skaf, pró-reitor de Pesquisa da Unicamp, dirigiu-se na maior parte do tempo a apenas duas deputadas que permaneceram no plenário Dom Pedro I da Alesp até o final da sessão: Valeria Bolsonaro (PSL), relatora da comissão, e Carla Morando (PSDB), vice-presidenta. Até o presidente já havia deixado a sala.

Entre os dados que apresentou, Skaf citou o número de projetos que receberam verbas próprias da universidade por meio do Fundo de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Extensão (Faepex) da Unicamp: entre 2011 e 2019, foram quase 11 mil projetos. A extensa documentação referente a cada um deles será enviada à CPI para atender ao requerimento de Carla Morando, que solicitou às três universidades estaduais a relação completa de pesquisas realizadas com recursos próprios no período.

Valeria Bolsonaro, por sua vez, repetiu os costumeiros questionamentos que faz aos representantes das universidades sobre a relevância das pesquisas especialmente na área das Ciências Humanas. “Até que ponto os critérios para as pesquisas que estão sendo desenvolvidas estão voltados para que as coisas sejam aplicadas realmente como resultado?”, perguntou. “As universidades nos colocam gráficos maravilhosos de publicações, mas o impacto social, o resultado, a qualidade disso, não nos é mostrada nesses gráficos”, prosseguiu. Na visão da deputada, “a CPI está caminhando bem nesse aspecto de levantar essa provocação”.

O pró-reitor da Unicamp ressaltou que a preocupação em apresentar sua relevância à sociedade existe nas universidades do mundo inteiro. “Mas não é a troco de nada que estamos no segmento de 1,5% das melhores universidades do mundo. Não são os nossos indicadores, e sim indicadores mundiais que contemplam diferentes aspectos.

Nossa qualidade é aferida por [observadores] externos, e é importante deixar isso bastante claro”, apontou. Skaf também defendeu a importância da pesquisa em todas as áreas e disse que as aplicações e resultados dependem não apenas da universidade, mas também da recepção do poder público e da própria sociedade.

A CPI entra em suas últimas semanas de funcionamento – o prazo de encerramento dos trabalhos é o dia 9/11 –, e por isso as sessões agora ocorrerão duas vezes por semana. Moura lembrou aos sub-relatores que o prazo para a entrega de seus relatórios é o dia 2/10.

EXPRESSO ADUSP


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