Defesa da Universidade
Falta de água no Crusp e outras falhas graves na permanência levam estudantes da USP a paralisar atividades nesta terça, 20/9
Problemas recorrentes no abastecimento de água do Conjunto Residencial da Cidade Universitária do Butantã (Crusp), ao lado de questões estruturais da moradia estudantil que se arrastam; ônibus sempre lotados; inexistência de alimentação e transporte nos finais de semana; bolsas de permanência de valor insuficiente e pagas com atraso apontam falhas nas políticas de permanência estudantil praticadas pela Reitoria da USP.
Estas questões, que nos últimos meses provocaram diversos protestos dos estudantes da USP, devem levar a uma nova e expressiva paralisação nesta terça-feira (20/9), com participação do Diretório Central dos Estudantes “Alexandre Vannucchi Leme” (DCE-Livre), da Associação de Pós-Graduandxs “Helenira ‘Preta’ Rezende” (APG-Capital) e de centros acadêmicos.
A decisão de paralisação foi tomada pelo(a)s estudantes em assembleia. Um exemplo para se ter ideia da força do movimento: na assembleia geral extraordinária de estudantes da Faculdade de Medicina Veterinária e Zootecnia (FMVZ) realizada nesta segunda-feira (19/9), 106 dos 118 alunos presentes votaram a favor da paralisação.
O DCE-Livre está divulgando o “Manifesto por Permanência Estudantil na USP”, que ainda está aberto a adesões de entidades representativas. De acordo com o documento, a “propalada excelência da Universidade de São Paulo e seu renome como ‘melhor universidade da América Latina’ são contrastados com as situações degradantes a que estão submetido(a)s, cotidianamente, aquele(a)s que constituem seu corpo e alma: estudantes, funcionário(a)s técnico-administrativo(a)s e docentes”. Segundo o manifesto, os sérios problemas de permanência estudantil existentes levam muito(a)s estudantes, em especial aquele(a)s de baixa renda, a abandonarem seus cursos.
“O exemplo mais recente foi a falta de água no Crusp”, cita o texto, lembrando que “o(a)s moradore(a)s sofreram com falta de água e até agora, passadas mais [de] duas semanas, ainda sofrem com instabilidade no abastecimento sem ter tido nenhuma resposta consistente da instituição para resolver o problema e sem nenhuma garantia de soluções tanto emergenciais”. O manifesto traça um paralelo entre a situação na moradia e um evento oficial que transcorria simultaneamente no campus da capital: “Enquanto muito(a)s estudantes não tinham água sequer para beber, dar descarga ou tomar banho, na mesma semana ocorria a Feira de Profissões da USP em que foram fornecidos vários galões de água para o público. Tal fato escancara a hierarquia de prioridades dessa instituição, que busca manter uma imagem externa de ‘excelência’, ao mesmo tempo em que vira as costas para o(a)s estudantes pobres, negando-lhes um dos direitos mais básicos que é o acesso à água”.
Além disso, prossegue o documento, há uma série de outros problemas que interferem na permanência estudantil e na qualidade de vida no campus, mas que continuam sem resposta por parte da Reitoria. “Temos poucas vagas na moradia em relação ao aumento da demanda e bolsas, recentemente reajustadas de 400 para 500 reais, que são completamente insuficientes para sustentar qualquer pessoa, muito menos pagar aluguel nos entornos da cidade universitária. Há a presença de uma base da Polícia Militar que não é apenas incapaz de proteger a comunidade uspiana como, na realidade, nos violenta, já tendo invadido espaços estudantis, além de frequentemente assediar e enquadrar estudantes, em geral estudantes negro(a)s”.
O texto cita ainda as “filas nos bandejões” e o fato de que os ônibus circulares “seguem lotados, resultado de uma enorme redução e até paralisação no funcionamento desses serviços que, precarizados, vulnerabilizam motoristas, cobradore(a)s e usuário(a)s”, e menciona “a ausência de acesso à alimentação e transporte aos finais de semana e feriados”, que afeta a qualidade de vida dos e das discentes. “Mesmo a volta dos sucos nos bandejões, que é algo relativamente simples e tem sido reivindicado por nós, até agora não foi solucionada pela Reitoria”.
É por essas questões, conclui o manifesto, que os e as estudantes “deliberaram por paralisar suas atividades no dia 20/9/2022, exigindo uma resposta da Reitoria aos problemas aqui apresentados”. No tocante ao Crusp, elenca as seguintes reivindicações: resolução imediata do problema de abastecimento de água, “com respostas emergenciais e a longo prazo”; reformas estruturais e democráticas no Crusp, com um espaço de decisão do(a)s moradore(a)s que seja reconhecido institucionalmente; ampliação do horário de funcionamento da Zeladoria, incluindo finais de semana e feriados, e maior eficiência e rapidez da Zeladoria na resolução dos problemas da moradia; devolução dos Blocos K e L para a moradia estudantil.
O documento exige, ainda, a retirada da base da PM do campus; bolsa no valor de R$ 1 mil; aumento das frotas de ônibus inclusive aos finais de semana; passe-livre estudantil para estudantes da moradia; redução das filas dos restaurantes universitários e abertura dos restaurantes aos feriados e finais de semana; volta do fornecimento de sucos nos restaurantes universitários; recomposição dos quadros de docentes e funcionário(a)s técnico-administrativo(a)s; reajuste salarial; respeito aos espaços e autonomia estudantis.
A questão da falta de água é tratada por outros documentos assinados pelo DCE-Livre e por outras entidades estudantis e representantes discentes. Num deles, encaminhado à Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) e à Sabesp em 19/8, há um relato detalhado dos problemas de desabastecimento que vinham afetando o Crusp desde o mês de agosto, e um pedido para que fossem providenciados caminhões-pipa para socorrer os moradores.
A PRIP, no entanto, nega que venha ocorrendo falta de água no Crusp nos últimos dias. Em comunicado divulgado nesta segunda (19/9), a pró-reitora Ana Lúcia Duarte Lanna afirma que a PRIP monitora “diariamente o abastecimento de água e o nível dos reservatórios” do conjunto e que “não há registro de falta de água desde o dia 4 de setembro”. Segundo ela, a Sabesp realizou manutenção nos dias 2/9 e 9/9, e em 18/9 houve vazamento de água do reservatório auxiliar. “A PRIP foi acionada. Não houve falta de água nos apartamentos”.
Além disso, acrescentou, no dia 6/9 ocorreram intervenções no bloco F, e foi necessário o fechamento dos registros para a realização dos reparos. Nos dias 9 e 16/9, diz, a Sabesp realizou intervenções no bloco G. “Esse tipo de manutenção predial corretiva é comum em qualquer edifício”. Reitera o compromisso com o(a)s moradore(a)s de “comunicar quaisquer manutenções preventivas que precisem interromper temporariamente o fornecimento de água aos apartamentos”.
Ainda segundo a pró-reitora, outras ações têm sido implementadas no Crusp. “Iniciaremos um levantamento das condições físicas das habitações ainda em setembro para orientação das ações de curto, médio e longo prazo a serem implementadas. A visita aos apartamentos será acompanhada por estudantes. A proposta foi apresentada as(aos) moradoras(es) e terá seu cronograma discutido na assembleia do Crusp desta semana (19 a 23 de setembro)”, diz o comunicado de 19/9.
“Criamos caminhos institucionais para que as ações sejam discutidas com moradoras(es) e representantes estudantis. Importante dizer que foram realizadas reuniões em 30 de agosto, 2 e 16 de setembro de 2022. A primeira contou, além da representação estudantil, com a participação do Superintendente do Espaço Físico da USP”. Na ocasião, explica, foram discutidos caminhos para a melhoria da estrutura física do Crusp. “A melhoria das condições de moradia estudantil é prioridade dessa gestão”, reitera.
Consulte aqui o comunicado anterior da PRIP, “Abastecimento de água”, que comenta a atuação da Sabesp — “A concessionária diminui a pressão da água na rede. Isso impede que a água chegue aos reservatórios a tempo de repor a quantidade utilizada nos blocos em períodos de maior consumo, das 18h às 23h” — e indica providências que estavam sendo examinadas para reduzir o impacto do racionamento de água.
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