Estudantes do Instituto de Biociências pedem reunião aberta sobre convênio com empresa canadense; Diretoria garante que transparência “é permanente”

Fotos: divulgação

Estudantes do IB fizeram caminhada para marcar
entrega do abaixo-assinado
Estudantes do Instituto de Biociências (IB) protocolaram na última sexta-feira (3/6) um abaixo-assinado no qual requerem que o diretor da unidade, professor Marcos Buckeridge, e os membros da Comissão de Gerenciamento da Reserva Florestal do instituto (RFIB) participem de uma reunião aberta com a comunidade para debater os termos e consequências do convênio firmado com a Greenheart Brasil Empreendimentos em Ecoturismo e Conservação Ambiental Ltda.
Assinado em fevereiro de 2021, o convênio prevê “o desenvolvimento conjunto de um projeto em benefício da Reserva Florestal do IB-USP”, a chamada “Matinha”.
O grupo de estudantes marcou a entrega da carta aberta com uma caminhada que seguiu do Centro Acadêmico da Biologia (CABio) até o prédio da Administração, onde o documento foi protocolado.
O abaixo-assinado, que contava com mais de 500 subscrições na sexta-feira e ainda está aberto a adesões, é um dos resultados da mobilização de boa parte da comunidade do IB, para quem há vários pontos do convênio que suscitam dúvidas e que não foram suficientemente discutidos entre aluna(o)s, servidora(e)s e docentes.
Os principais questionamentos se referem a temas como confidencialidade, propriedade intelectual e gerenciamento de recursos financeiros. Nem o protocolo de intenções nem a redação final do convênio foram discutidos no Conselho Técnico-Administrativo (CTA) da unidade, sendo aprovados ad referendum na Congregação — ou seja, sem debate nesse colegiado.
Uma reunião da Comissão de Gerenciamento da Reserva Florestal que estava marcada para o dia 25/5 e na qual essas questões poderiam ser retomadas e discutidas foi cancelada, alegadamente por problemas de agenda.
“Solicitamos que se tornem explícitos os processos institucionais envolvidos e todos os termos do contrato, como garantido pela Lei de Acesso à Informação (Lei n° 12.527, de 18 de novembro de 2011)”, demanda o abaixo-assinado entregue pela(o)s aluna(o)s. “Dado o estágio avançado dessa discussão, requeremos que a plenária ocorra o mais rápido possível, no máximo até a terceira semana de junho de 2022, em um horário que abarque a troca de turnos entre o período integral e o noturno, assim garantindo uma maior participação de toda a comunidade do IB.”

As discussões sobre como fazer com que o potencial da reserva do IB como floresta urbana integrada à sociedade seja melhor aproveitado remontam a 2019. A Comissão de Gerenciamento, formada por aluna(o)s, docentes e servidora(e)s do IB, elaborou um projeto prevendo a construção de centro de visitantes, mirante, trilha suspensa, trilha monitorada e plataforma de observação e passou a procurar parcerias para captação de recursos.
Nesse momento entrou em cena a Greenheart Brasil, cuja matriz, a Greenheart Conservation Company, tem sede no Canadá. Sandra Steinmetz, que assina o convênio como sócia-diretora da empresa, é ex-aluna de graduação e mestrado do IB.
“O contato com a Greenheart foi muito frutífero, e as interações iniciaram em torno das ideias do projeto realizado pela Comissão da RFIB. A empresa se prontificou a ajudar o Instituto na busca de financiamentos para o projeto e para tanto, vimos que era necessário um convênio entre o IB e a empresa”, afirma a Diretoria do IB em comunicado enviado a estudantes, docentes e servidora(e)s nesta segunda-feira (6/6), cuja íntegra está reproduzida abaixo.
A Diretoria não esclarece como exatamente “surgiu o contato com a empresa Greenheart”, limitando-se a afirmar que as conversas se deram a partir do momento em que ficou claro que “a dimensão financeira necessária para regenerar a reserva seria de grande monta, sendo inviável realizar o que é necessário apenas com verba da própria USP”.
De acordo com o comunicado, os termos do plano de trabalho do convênio “foram enquadrados dentro da minuta padrão proposta pela Procuradoria-Geral (PG-USP), e houve a aprovação ad referendum da Congregação, a fim de que o texto pudesse ser apreciado nas instâncias seguintes da Universidade”.
A versão final do convênio, prossegue a Diretoria do instituto, “foi enviada para aprovação pela Congregação do IB, após solicitação de modificação na cláusula de propriedade intelectual a pedido da Agência USP de Inovação (Auspin)”. “É importante notar que as cláusulas de propriedade intelectual e sigilo são colocadas pela própria Procuradoria-Geral e são obrigatórias para os convênios. Trata-se, na realidade, de proteger a USP”, sublinha o comunicado, segundo o qual a Auspin e a PG-USP são “instâncias superiores”.
A Diretoria ressalta que “as cláusulas presentes no convênio com a Greenheart valem exclusivamente no âmbito dos termos do projeto”. Portanto, continua, “não é verdade que a captação de verba a ser feita junto com a Greenheart leve a qualquer alteração na produção científica do IB, como alguns afirmam”.
“O IB publica cerca de 500 trabalhos científicos por ano e muito poucos, em certos anos nenhum, têm qualquer dado produzido a partir de experimentos na mata. Mesmo que tivéssemos, não há qualquer restrição de publicação prevista no projeto”, prossegue o comunicado.
A Diretoria encerra o texto dizendo que a transparência “é permanente, uma vez que toda a documentação que envolve questões importantes do IB passa pela Congregação, que é o órgão máximo de decisão do Instituto” e que “é impossível realizar qualquer projeto institucional sem a passagem pelos órgãos colegiados competentes”, o que teria ocorrido “no que se refere à interação entre o IB e a Greenheart”.

“Prezados colegas, para dirimir dúvidas sobre as questões recém levantadas sobre o convênio feito com a empresa Greenheart com o Instituto de Biociências, a Diretoria do IB vem informar o seguinte:
1) A gestão da RFIB [Reserva Florestal do Instituto de Biociências] é feita pelo Instituto de Biociências, sendo essa reserva florestal parte da infraestrutura do Instituto, que deve, assim como toda a infraestrutura deste, ser mantida pela direção. Tal manutenção deve incluir o acesso à mata com segurança e permitir que pesquisas, ensino e extensão, desenvolvidos sob o comando dos professores do IB, sejam feitos no local;
2) Em 2020, dado o estado de abandono em que a reserva se encontrava, foi restabelecida a Comissão de Gestão da RFIB pelo diretor seguindo as atribuições e obrigações que lhe cabem. O objetivo de restabelecer o funcionamento da comissão foi o de assessorar a diretoria na resolução de uma série de problemas de acesso à RFIB, bem como de seu uso;
3) Com a comissão restabelecida, foi solicitado a ela que realizasse um plano de recuperação e uso no sentido de que esta pudesse servir melhor à educação (graduação e pós-graduação), pesquisa e extensão;
4) Esta nova comissão, formada por professores, funcionários e alunos, realizou muito bem seu trabalho, produzindo um plano que se encontra disponível no rotativo na página do IB na internet. O plano mostrou claramente que a dimensão financeira necessária para regenerar a reserva seria de grande monta, sendo inviável realizar o que é necessário apenas com verba da própria USP;
5) A partir desse ponto, começou-se a pensar em possibilidades de buscar verba externa que pudesse ajudar o IB a recuperar adequadamente a RFIB e colocá-la em uso pelos professores e alunos, assim como a sociedade em geral, já que a USP é uma universidade pública e o campus poderia ser aberto para a visitação de escolas. Foi então que surgiu o contato com a empresa Greenheart, que além de ter em seu curriculum excelentes trabalhos na área de uso sustentável e preservação de florestas, tem como uma das proprietárias uma ex-aluna do próprio IB e, portanto, conhece o contexto e as necessidades de ter uma reserva florestal bem preservada e útil na USP;
6) O contato com a Greenheart foi muito frutífero, e as interações iniciaram em torno das ideias do projeto realizado pela Comissão da RFIB. A empresa se prontificou a ajudar o Instituto na busca de financiamentos para o projeto e para tanto, vimos que era necessário um convênio entre o IB e a empresa;
7) Para firmar o convênio, a Comissão da RFIB e a Greenheart discutiram os termos do plano de trabalho, que foram enquadrados dentro da minuta padrão proposta pela Procuradoria-Geral (PG-USP), e houve a aprovação ad referendum da Congregação, a fim de que o texto pudesse ser apreciado nas instâncias seguintes da Universidade;
8) A versão final do convênio foi enviada para aprovação pela Congregação do IB, após solicitação de modificação na cláusula de propriedade intelectual a pedido da Agência USP de Inovação (Auspin). É importante notar que as cláusulas de propriedade intelectual e sigilo são colocadas pela própria Procuradoria-Geral e são obrigatórias para os convênios. Trata-se, na realidade, de proteger a USP;
9) Quando um documento destes é enviado para a Congregação, mesmo que tenha sido aprovado ad referendum, fica disponível para consulta pelos membros do colegiado, que podem solicitar esclarecimentos e até votar contra a aprovação. A pauta da Congregação é acessível aos representantes das diferentes categorias na congregação através do processo democrático representativo que temos na USP;
10) Após o período de acesso ao documento, este foi aprovado por unanimidade na Congregação número 460 de 7/4/2021, e seguiu para aprovação nas instâncias superiores (Auspin e PG-USP), antes da assinatura;
11) Uma vez aprovado o Convênio, a Comissão da RFIB teve a missão de modernizar o seu próprio regimento, o que foi feito e aprovado posteriormente pela Congregação. Notar que a composição da comissão (item “a” do regimento) consiste em um (1) representante titular e suplente de cada um dos departamentos, bem como dos funcionários e do corpo discente;
12) A comissão trabalhou assiduamente e, com o apoio da Greenheart – que NÃO cobrou por qualquer serviço – montou uma planilha detalhada de gastos para investimento nas necessárias reformas da cerca, colocação de câmeras e o reparo da entrada principal da mata, que foi danificada pela queda de uma grande árvore. As câmeras já foram instaladas com o auxílio da Superintendência de Segurança da USP e neste momento, seguindo as regras da USP, uma licitação está em curso para iniciar a reforma da cerca e refazer a escada de acesso. Com o término das obras, teremos novamente acesso à mata;
13) Sobre a questão da propriedade intelectual, o IB segue estritamente as normas de convênios da USP e se pauta pela Procuradoria-Geral e pela Agência USP de Inovação (Auspin). As cláusulas presentes no convênio com a Greenheart valem exclusivamente no âmbito dos termos do projeto. Portanto, não é verdade que a captação de verba a ser feita junto com a Greenheart leve a qualquer alteração na produção científica do IB, como alguns afirmam. O IB publica cerca de 500 trabalhos científicos por ano e muito poucos, em certos anos nenhum, têm qualquer dado produzido a partir de experimentos na mata. Mesmo que tivéssemos, não há qualquer restrição de publicação prevista no projeto.
14) Dois dos papéis mais importantes da Greenheart no projeto elaborado pela comissão foram o de dar apoio à primeira fase do projeto (o que já foi feito) e o de captar verba para projetos maiores. Mas qualquer novo projeto terá que ser submetido à discussão na Comissão da RFIB e qualquer novo convênio formado terá que passar pela Congregação. Deverá inclusive considerar os resultados da pesquisa efetuada e, se necessário, realizar outras pesquisas conforme o conhecimento sobre o valor da RFIB se amplie na USP. Portanto, o IB tem e terá total controle sobre o que poderá ou não ser feito na RFIB, já que tudo terá que ser analisado pela comissão e pela congregação;
15) Sobre a transparência, ela é permanente, uma vez que toda a documentação que envolve questões importantes do IB passa pela Congregação, que é o órgão máximo de decisão do Instituto. A Congregação tem representações de todos os departamentos e categorias e tem, assim, acesso a todos os documentos. Podem-se obter ou solicitar mais informações durante as reuniões. O projeto foi amplamente divulgado no site do IB e em toda a USP. Portanto, é impossível realizar qualquer projeto institucional sem a passagem pelos órgãos colegiados competentes. E esse foi o caso no que se refere à interação entre o IB e a Greenheart.”

EXPRESSO ADUSP


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