Defesa da Universidade
Portarias são “precipitadas e unilaterais”, diz Faculdade de Educação. Reação ao retorno compulsório mobiliza FAU e Esalq
“A determinação verticalizada e impositiva feita pela Reitoria contraria o espírito republicano e democrático que deveria prevalecer na Universidade”, avaliou a Congregação da FE na sua reunião de 26/8. Na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, a decisão da diretora Ana Lanna de acelerar o retorno mediante a fixação de prazos exíguos, por meio da Portaria 24/2021, de 18/8 (que prevê até mesmo visitas em grupo à unidade), foi rejeitada por expresssiva plenária dos 3 setores realizada em 23/8
Reunida em 26 de agosto, a Congregação da Faculdade de Educação (FE-USP) manifestou “preocupação com a forma como a questão do retorno presencial das atividades foi conduzida pela Reitoria”, entendeu que as decisões expressas nas recentes portarias do reitor — e objeto de críticas generalizadas na reunião do Conselho Universitário de 24/8 — foram “precipitadas e unilaterais”, por desconsiderarem a diversidade existente na universidade e por não levarem em conta a necessidade de ampla e cuidadosa discussão do problema.
A resolução da Congregação destacou, inicialmente, que a preocupação se justifica pela situação geral da pandemia. “Em que pese o aumento do número de vacinados, fato que muito nos alegra, ainda não há uma porcentagem de vacinação suficiente para a retomada segura do conjunto de atividades que a universidade oferece”, adverte. “Além disso, é necessário cautela diante do avanço de variantes do vírus, em particular, a chamada Delta, que tem deixado os epidemiologistas em alerta”.
Outro aspecto levantado pelo colegiado diz respeito às questões internas da própria universidade. “Uma característica importante da USP é a sua diversidade, que se expressa também nas distintas condições locais das suas unidades de ensino e pesquisa, bem como de órgãos administrativos, institutos e museus. Destacamos ainda que as determinações da Reitoria deixam lacunas importantes acerca dos protocolos gerais nos campi e unidades, bem como acerca da multiplicidade de situações específicas que atingem o corpo de funcionários(as), docentes e estudantes”.
Desse modo, conclui, “as decisões expressas nas portarias 7.670 (de 12 de agosto de 2021) e 7.671 (de 20 de agosto de 2021) são precipitadas e unilaterais”, pois um tema de tamanha relevância “exige um debate amplo com toda a comunidade universitária, a começar pelas entidades representativas das diferentes categorias, e formas democráticas de deliberação”. Avalia ainda, que, “uma vez estabelecidas as diretrizes e protocolos mínimos aplicáveis a toda a Universidade, é necessário que seja garantida a autonomia para as unidades decidirem suas formas internas de organização do trabalho neste momento de transição, de modo a respeitar a pluralidade existente entre elas”.
Nesse sentido, a Congregação anuncia somar-se “ao pleito de que as decisões sobre o tema sejam revistas e precedidas do mais amplo debate com a comunidade”. O documento termina com uma severa crítica à atitude da gestão Vahan Agopyan-Antonio Carlos Hernandes: “A determinação verticalizada e impositiva feita pela Reitoria contraria o espírito republicano e democrático que deveria prevalecer na Universidade”.
Na FAU, Diretoria impõe retorno acelerado e plenária dos 3 setores reage
Na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU), a diretora Ana Lúcia Duarte Lanna deu sua contribuição ao autoritarismo da USP ao editar, em 18 de agosto, a Portaria 24/2021, que “estabelece diretrizes para a retomada das atividades presenciais nos edifícios da FAU, frente à pandemia Covid-19, tendo por base a Portaria USP GR 7.670/2021, que dispõe sobre o retorno às atividades presenciais na Universidade de São Paulo”. A portaria de Ana Lanna é uma coleção de exigências que, além de ignorarem a necessidade de segurança sanitária ainda imposta pela pandemia, devem ser executadas em prazos exíguos.
Já no seu artigo primeiro, a portaria define que no segundo semestre de 2021 “não haverá retorno integral de todas as atividades presenciais”, o que implica que haverá retorno ainda que parcial, e a seguir “divide” o semestre em “dois momentos”, a saber de 30 de agosto a 16 de outubro e de 18 de outubro a 21 de dezembro.
O artigo segundo, que trata da “situação vacinal”, estipula, no seu parágrafo terceiro, que se possa “organizar o retorno presencial de forma segura e respeitando as diretrizes da USP, os servidores técnico-administrativos devem informar às suas chefias imediatas sua situação vacinal até o dia 20 de agosto, impreterivelmente”, ao passo que o parágrafo quarto faz a mesma imposição aos docentes, e o parágrafo quinto estabelece o prazo de 27 de agosto, “impreterivelmente”, para que os discentes tomem idêntica providência.
Já o parágrafo sexto do artigo segundo repete a aberração contida na Portaria GR 7.671/2021, ao rezar que os “membros da comunidade FAU vacinados. mas ainda não imunizados, podem retornar às suas atividades”, isso quando o próprio Ministério da Saúde já admite a necessidade de uma terceira dose da vacina. Ana Lanna segue, assim, a prática iniciada por Rui Alberto Ferriani, diretor da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto (FMRP), que por essa razão foi guindado pelo reitor ao cargo de presidente da Comissão Assessora encarregada de elaborar as diretrizes para o retorno às atividades presenciais na USP.
Embora defina que as “aulas de graduação e pós-graduação permanecem virtuais”, a portaria da FAU determina que atividades presenciais “não obrigatórias para os discentes ocorrerão a partir de 18 de outubro”, que 50% da carga horária das disciplinas de graduação deverão ser presenciais,
que as atividades didáticas presenciais deverão contar “com a presença obrigatória dos docentes e não obrigatória dos discentes” e que elas consistirão em “orientações, acompanhamento de trabalhos, estudos de campo, uso dos laboratórios de apoio didático e da biblioteca, dentre outras”. Tais atividades “devem ser informadas pelos docentes aos seus departamentos até 10 de setembro, impreterivelmente”, sendo que os “discentes que não puderem acompanhar presencialmente estas atividades devem obrigatoriamente realizá-las em formato virtual”.
A diretora da FAU deixa claro que pretende imprimir um ritmo célere ao retorno às atividades presenciais. O inciso VII do artigo 3º determina que as comissões de coordenação de curso (COCs) “receberão estas informações e organizarão calendário com as atividades”, e que tal calendário “será amplamente divulgado aos discentes a partir de 17 de setembro”.
Na mesma linha, o artigo 7º da portaria, que trata do “acesso e uso dos edifícios [da] Cidade Universitária” e não tem caput, estipula: “§1º – Entre 30 de agosto e 1º de outubro serão organizadas visitas presenciais aos edifícios da FAU. §2º – As visitas serão conduzidas por docentes em grupos de até 10 alunos e deverão ocorrer entre 11h e 15h, de segunda a sexta, mediante agendamento”. O §5º autoriza docentes e discentes a utilizar alguns espaços da FAU já a partir de 30 de agosto, para realização de atividades acadêmicas.
A portaria de Ana Lanna foi rejeitada pela plenária dos 3 setores da FAU realizada no dia 27 de agosto. Descrita no seu documento-síntese como “primeira reunião geral de discentes, servidores docentes e técnico-administrativos da unidade desde o início da Pandemia”, a plenária contou com 177 participantes e manifestou várias inquietações e restrições ao retorno presencial preconizado nas portarias GR 7.670, GR 7.671 e FAU 24/2021.
De acordo com o documento-síntese, tais manifestações “pautaram-se pelo princípio de respeito à vida e à saúde física e mental de toda a comunidade FAU ampliada — o que inclui as famílias de discentes e servidores —, de forma igualitária, isto é, sem impor aos servidores técnico-administrativos condições de retorno obrigatório que os exponha a maior risco do que aqueles a que estarão expostos os demais membros da comunidade em atividades presenciais facultativas”.
Ademais, em consonância com a plenária dos 3 setores realizada na USP em 23 de agosto, a plenária dos 3 setores da FAU “evidenciou que o retorno presencial proposto é precipitado, coloca em risco a vida da comunidade universitária, não garante condições equânimes para os 3 setores, não contribui para a informação da sociedade quanto ao momento ainda grave da pandemia que o país e o estado de São Paulo atravessam, além de favorecer a fragilização das condições de saúde pública nos municípios em que a USP está inserida”.
Entendeu-se como “um grave problema a concepção expressa nos documentos da Reitoria (e da Diretoria da FAU) de que a vacina seria uma espécie de passaporte individual de imunização”, afinal de contas “pessoas vacinadas ainda podem adoecer (e, em alguns casos, até mesmo desenvolver a forma grave da doença ou vir a óbito, como tem ocorrido) e, sobretudo, podem transmitir a doença”, favorecendo o surgimento e a circulação de novas cepas do coronavírus.
A plenária decidiu encaminhar à Congregação as seguintes sugestões: “I. A afirmação da plena autonomia da FAU com relação às portarias GR 7.670 e 7.671; II. A revogação imediata do caráter compulsório do retorno presencial aos servidores técnico-administrativos; III. O reconhecimento do ‘Documento-base para Construção dos Planos Sanitários e Educacionais dos 3 setores da USP’ como um referencial para a construção de condições seguras de retorno presencial em 2022; IV. A constituição urgente de uma ‘Brigada pela Vida’ na unidade, com composição paritária entre os 3 setores, para a garantia das condições sanitárias indispensáveis a um retorno presencial; V. A implementação urgente de um Serviço de Acolhimento Psicológico na FAU, adiado desde o movimento de estudantes da FAU em 2016 (#nãoénormal), considerando como exemplo, dentre outros, o Centro de Apoio Educacional e Psicológico da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – CAEP-FMRP”.
Por fim, o documento-síntese reitera que “ansiamos todos por um retorno presencial das atividades e o pleno funcionamento da FAU” e da USP, contudo tal retorno “deve ser seguro, coletivamente construído, fundamentado em termos científicos, para acolher a diversidade e assim construir um contexto igualitário de condições sanitárias e educacionais para todos os membros da comunidade universitária”.
Retorno só com toda a população vacinada, dizem entidades na Esalq
Também na Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq), em Piracicaba, há forte mobilização contra as portarias reitorais, envolvendo as três categorias. “Retorno de atividades presenciais somente com a população vacinada por completo!”, diz panfleto preparado pela Adusp regional, DCE-Livre e Sintusp após realização de uma plenária dos 3 setores em 20/8. A primeira atividade de panfletagem foi agendada para 9/9.
O impresso lembra que a vacinação é uma estratégia de prevenção coletiva: “Os diversos estudos realizados sobre a Covid-19 e a eficácia de proteção da vacinação apontam que somente com imunização completa de aproximadamente 70% da população há segurança para relaxamento do isolamento social. Com a variante Delta em circulação, o cenário é ainda mais preocupante”.
Assim, continua o texto, “o retorno às atividades presenciais, mais uma decisão autoritária da Reitoria, tomada sem qualquer participação da comunidade, é imprudente e contradiz as orientações dos especialistas”. Por essa razão, “como membros de uma comunidade que valoriza a ciência e a vida”, docentes, funcionários e estudantes da Esalq, reunidos em plenária de 20/8, “se posicionam contra o retorno presencial neste momento, pois estamos em uma fase de instabilidade e de imunização incompleta”.
O impresso assinala que uma parcela do(a)s funcionário(a)s, estudantes e docentes utiliza transporte público para se deslocarem até o câmpus de Piracicaba, contexto no qual aglomerações são inevitáveis. “Além disso, os que residem com seus familiares correm o risco de transmitir o vírus a eles, que, mesmo estando vacinados, ainda apresentam probabilidade de serem contaminados e desenvolverem algum grau de sintoma, já que nenhuma vacina, individualmente, confere 100% de imunização”.
As condições sanitárias das instalações da Esalq também são questionadas no panfleto. “A principal forma de transmissão do coronavírus é por via aérea. Sendo assim, locais fechados, com janelas pequenas e pouca ventilação aumentam a probabilidade de transmissão. A maioria dos ambientes fechados do campus (como as salas de aula, as salas administrativas e os laboratórios) não possuem ventilação adequada”, diz o texto. Portanto, explica, não há garantia de que todos os protocolos de segurança — que incluem ventilação adequada dos ambientes, utilização de máscaras PFF2 e distanciamento seguro entre as pessoas — serão efetivamente realizados.
A plenária decidiu buscar reuniões com a Diretoria da unidade e a Prefeitura do câmpus, para expor sua objeção ao retorno neste momento. Além disso, os representantes das categorias tentarão garantir que, nas próximas reuniões das comissões de Graduação e de Pós-Graduação, sejam proibidas aulas presenciais. “A decisão de retorno das atividades presenciais deve ser tomada democraticamente, com a participação de funcionários, professores e alunos”, enfatiza o texto.
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