No último dia 10/3, a Pró-Reitoria de Inclusão e Pertencimento (PRIP) anunciou, em comunicado “à comunidade”, que na véspera foi assinado um protocolo de intenções com a Prefeitura Municipal de São Paulo, “com o intuito de realizar estudos técnicos visando a futura instalação de um Centro de Educação Infantil no antigo prédio da Creche/Pré-Escola Oeste”.

Ainda segundo o comunicado, o protocolo de intenções “terá vigência de 24 meses, a partir da data de sua assinatura, e todos os termos do futuro convênio entre a Universidade e a Secretaria da Educação do Município de São Paulo serão definidos ao longo desse período”, sendo que o Centro de Educação Infantil atenderá crianças de 0 a 3 anos e 11 meses e “será uma unidade conveniada para atender a comunidade externa, contudo, há previsão de um percentual de vagas, ainda não definido, para a comunidade USP”.

Acrescenta que, uma vez “instalado em parceria com a Universidade, o CEI promoverá ações voltadas para o ensino, pesquisa e extensão”, e informa que o pró-reitor adjunto de Graduação, Marcos Neira, “será o representante da USP nesse processo de conveniamento”. O Jornal da USP também publicou notícia a respeito.

A Creche Oeste encontra-se fechada desde 16 de janeiro de 2017, quando teve suas atividades brutalmente interrompidas, sem aviso prévio e sem o devido processo administrativo, por decisão da gestão reitoral M.A. Zago-V. Agopyan, interessada em desmantelar tudo que entendia como “atividade meio” e “assistencialismo”, e revelando ignorância em relação às pesquisas desenvolvidas na unidade.

À época, a questão foi judicializada, ocorreu um movimento de ocupação do prédio (“Ocupação Creche Aberta”), mas pais e funcionária(o)s não conseguiram reverter a truculenta medida da Reitoria. Apesar disso, o próprio juiz Danilo Mansano Barioni, da 1ª Vara da Fazenda Pública, ao julgar pedido da USP de reintegração de posse, surpreendeu-se com a conduta irresponsável da Reitoria.

“Levando em conta o que foi dito ao longo dessas duas horas e meia de audiência”, registrou o magistrado, “mesmo mantendo o entendimento de que favorável à autora [USP] a questão possessória, o fechamento da Creche Oeste ocorreu de forma inexplicavelmente abrupta, sem o mínimo planejamento e sem dimensionamento de eventual comprometimento da estrutura montada no imóvel, específica e complexa, voltada ao atendimento de menores. Mais que isso, ficou claro que não existe qualquer planejamento relacionado ao destino do imóvel”.

A assinatura do protocolo de intenções confirma o alinhamento da gestão Carlotti Jr.-Maria Arminda com os paradigmas de suas predecessoras. Anuncia-se que a gestão da creche será compartilhada entre a Prefeitura da capital e a USP e até mesmo que caberia à universidade selecionar o pessoal a ser contratado. Porém, a Reitoria está abrindo mão de uma unidade que se tornou referência em educação infantil, formação de quadros, pesquisas reconhecidas, e opta por um convênio com a Prefeitura, que notoriamente vem terceirizando suas creches.

Obviamente não é por falta de recursos, pois a Reitoria dispõe de cerca de R$ 5 bilhões em caixa e liberou quase R$ 2 bilhões em “investimentos” nem sempre transparentes. Trata-se, na verdade, de uma decisão enquadrada nos marcos do projeto de mercantilização da universidade. Existe a promessa de “ações voltadas para o ensino, pesquisa e extensão”, mas a USP não precisa da municipalidade para levar a cabo tais ações.

“A Prefeitura está privatizando toda a educação infantil”, declarou ao Informativo Adusp uma ex-funcionária da Creche Oeste. “Faz bastante tempo já que ninguém consegue vaga em creche direta. Eles estão só esperando todo mundo se aposentar ou morrer de desgosto, igual na USP”.

Reunião de esclarecimentos de 15/3 buscou “apaziguar”

Nesta quarta-feira (15/3), a PRIP realizou uma reunião virtual com funcionárias(os) das creches e com famílias interessadas, com a finalidade de “poder esclarecer e principalmente apaziguar” (sic) em relação ao aludido protocolo de intenções firmado com a Prefeitura paulistana. De acordo com a coordenadora de Vida no Campus da PRIP, Marie Claire Sekkel, “se tudo der certo, se tudo caminhar bem com esse protocolo de intenções”, o antigo prédio da Creche Oeste “será cedido para uma creche pública”.

A coordenadora apresentou um retrospecto da questão. Citou reunião realizada na PRIP em 1º/6/2022 com diversas entidades representativas, as quais apresentaram, em carta, o pedido de reabertura da Creche Oeste. “Esta carta foi enviada para o reitor Carlotti, nós aguardamos pela resposta, e a resposta foi ‘não vai ser possível nesse momento reabrir a Creche Oeste’, por vários motivos, havia um limite de possibilidades de contratação, a contratação era muito expressiva, são 40 funcionários. Enfim, a resposta foi um categórico não”.

Ainda segundo Claire, a partir dessa negativa da Reitoria foram desenvolvidas conversas entre o pró-reitor adjunto Marcos Neira e a secretária municipal de Gestão, Marcela Arruda. “[Ele] conversou um pouco sobre a situação da creche, e se cogitou a possibilidade de fazer um convênio, alguma atividade conjunta com a Prefeitura, pensando no prédio da Creche Oeste, no sentido dele ser ocupado novamente pelas crianças”.

Com esse intuito, informou a coordenadora de Vida no Campus, uma conversa formal entre a PRIP e o secretário municipal de Educação, Fernando Padula, foi realizada no dia 6/7/2022. “A gente conversou, foi uma coisa bem inicial, sem nenhuma proposta definida”, mas a Prefeitura demonstrou interesse no equipamento. Num segundo momento, a PRIP realizou uma reunião virtual com funcionária(o)s das creches, os quais inicialmente teriam recebido bem a possibilidade de um convênio com a municipalidade.

Uma nova reunião com as entidades que haviam pleiteado a reabertura da Creche Oeste foi então realizada. “As entidades, nesse primeiro momento, gostaram. A gente chegou num consenso nessa reunião, todos que estavam ali aprovaram inicialmente a ideia”, garantiu Claire, que citou nominalmente Sintusp, Adusp, DCE, APG e Rede Não Cala.

Porém, na reunião seguinte, em 22/9/2022, os representantes retornaram com a posição de suas entidades, “e aí o que aconteceu foi que algumas entidades gostaram, outras não, então aquilo que estava inicialmente consensual ficou fragmentado”, alegou, sem citar quem continuou apoiando e quem rejeitou a proposta.

A coordenadora de Vida no Campus relatou, então, que, frente à inexistência de consenso, “a gente [Reitoria] resolveu que nós seguiríamos adiante, independentemente da coesão das entidades, e levamos adiante uma proposta nossa de fazer esse convênio, informamos o reitor sobre isso, e demos seguimento. No dia 9 de março foi assinado o protocolo de intenções para a realização desse convênio”.

Claire anunciou ainda, na reunião de 15/3, que a PRIP pretende desocupar o prédio o quanto antes, retirando os ocupantes que ali se encontram. “O primeiro movimento nosso é o de retomar a posse da Creche Oeste, para poder fazer a reforma do espaço. A USP é quem vai fazer a reforma e ela pretende, ao longo desse processo, de construir essa proposta de creche conveniada, entregar o prédio em condições, adaptado”, afirmou. “Então o que a Prefeitura exigiu de nós, que não era nossa ideia inicial, é que essa creche atenda só creche mesmo, de zero a três anos e onze meses, porque a outra faixa etária, de pré-escola, a Prefeitura já tem um serviço abrangente”.

Ela disse também que é intenção da PRIP criar uma política de creches dentro da Universidade, “que a gente possa apresentar no Conselho de Inclusão e Pertencimento, e no momento em que essa política for aprovada as creches não poderão ser fechadas, como foi o caso da Creche Oeste, num ato unilateral de um reitor”. Para serem fechadas, “a decisão terá de passar pelo Conselho de Inclusão e Pertencimento”.

No final da reunião, o pró-reitor adjunto Marcos Neira reforçou a justificativa para a não (re)abertura da Creche Oeste, “neste momento”, com base no supostamente grande número de contratações necessárias. A alternativa, defendeu, “é conversar com a Prefeitura de São Paulo, que simplesmente é uma rede de ensino muito respeitada pela sua história”, sustentou.

De acordo com Neira, o protocolo de intenções foi escrito com participação equivalente da USP e da Prefeitura, “não é uma ideia que a Prefeitura está impondo para a gente, eles estão na expectativa de que essa experiência de participação da universidade possa alimentar uma política outra de formação de professores da rede municipal e que possa ser benéfica para a população de São Paulo”.

Ainda segundo o pró-reitor adjunto de Graduação: “Nós estamos querendo atender as nossas crianças e queremos o mesmo padrão de qualidade que as creches da USP, do seu conjunto, possuem. Por isso que o documento tem a participação da USP na gestão, na formação, e essa creche será, caso ela venha a acontecer, também um espaço de ensino, pesquisa e extensão dos nossos universitários”.

“Na reunião do dia 10/3, foi anunciada a assinatura do protocolo de intenções pela USP e pela Prefeitura Municipal de São Paulo. No entanto, não tivemos ainda acesso ao texto do protocolo”, explica a professora Vanessa Martins do Monte, 1ª secretária da Adusp. “O conhecimento deste documento é fundamental para que o assunto seja discutido pela diretoria da Adusp e possamos tirar nossa posição. De qualquer modo, somos contrárias à desvinculação da Creche Oeste”.

EXPRESSO ADUSP


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