Parecer

Processo 88.1.344.44.2
Interessado: Caetano Juliani
Assunto: Exclusão do RDIDP

 

1.      O recurso

Caetano Juliani, Professor Doutor, referência MS-3, sujeito ao RDIDP junto ao Departamento de Mineralogia e Geotectônica do IGUSP interpôs recurso (fls. 173-183, 12/09/2000) contra decisão do Magnífico Reitor – atendendo a apelo do Diretor da Unidade (fls. 170, 24/07/2000) – de lhe conceder mais um ano para apresentar relatório circunstanciado de suas atividades (fls. 172, 28/07/2000), uma vez que, por sugestão da CERT à autoridade máxima administrativa, o atual relatório não deveria ser aprovado (fls. 157, 25/04/2000), confirmando predisposição manifestada anteriormente de alterar o regime de trabalho do interessado do RDIDP para o RTP (fls. 149, 02/12/99) por insuficiência de desempenho naquele regime. Enfatize-se, pois, que a autoridade máxima administrativa, responsável por (EUSP, Artigo 42, VII) “estabelecer e fazer cessar as relações jurídicas de emprego do pessoal docente e não-docente da Universidade” e (EUSP, Artigo 42, II) “zelar pela fiel execução da legislação da Universidade” resolveu conceder ao docente mais um ano para que melhore seu desempenho, apesar da CERT – comissão específica do Reitor para análise de mérito em casos da espécie – ter opinado pela alteração do regime de trabalho. O recurso, que foi analiticamente apreciado pela douta Consultoria Jurídica (fls. 190-207), é tempestivo e deve subir à apreciação do colendo Co de acordo com as disposições do RG, artigo 254, uma vez que se trata de recurso contra decisão do Reitor.

2.      A trajetória do docente

O docente foi admitido na Universidade no ano de 1988, mediante contrato para o exercício de funções docentes no RDIDP. Findo o estágio probatório (6 anos), teve seu relatório aprovado pela CERT em 1994, mas com forte recomendação de que publicasse seus trabalhos científicos (fls. 96). O contrato foi então prorrogado por mais 3 anos e, em março de 1997, por ocasião de novo pedido de contratação, a CERT não acolheu a recomendação do Departamento de dar mais 3 anos ao docente, opinando pela contratação por apenas mais 2 anos, reiterando a recomendação anterior e destacando o fato de que o acompanhamento do desempenho do docente seria doravante mais rigoroso (fls. 119). Não obstante, antes do término do contrato docente foi aprovado em Concurso Público de Provas e Títulos para Provimento de Cargo de Professor Doutor no RDIDP, tendo sido nomeado em setembro de 1997. Apesar dessa nomeação ter sido aprovada pela presidência da CERT ad referendum do plenário, este último, determinou que o docente apresentasse até a data de 03/11/99 relatório circunstanciado e fundamentado de suas atividades de ensino e de pesquisa, reiterando a necessidade de que o docente divulgasse seu trabalho por meio de revistas especializadas.

Apresentando o relatório na data exigida, previamente aprovado pelo Conselho do Departamento e pelo CTA, a CERT manteve seu julgamento de que o desempenho do docente foi insatisfatório, pronunciando-se pelo parecer já citado de fls. 149 (ver item 1 deste Relatório).

Seguiram-se apelos do Conselho de Departamento e do Diretor em favor de uma revisão da posição da CERT. Esta, por sua vez, submeteu os pedidos de revisão do relatório a dois membros distintos do relator do primeiro parecer e a três assessores externos (fls. 157). Finalmente, a Comissão Especial de Regimes de Trabalho não alterou sua posição e remeteu suas recomendações ao Magnífico Reitor para sua apreciação (fls. 157) que, como já explicado, prorrogou a decisão por mais um ano.

3.      As alegações do docente em face da lei

Alegação 3.1 (itens 1, 2 e 3 do recurso). O docente alega que tendo encerrado o período de experimentação e apresentado relatório, que foi aprovado por todas as instâncias universitárias, não cabe à CERT exigir a apresentação de relatórios extemporâneos, mas apenas na época de renovação de contrato. Como ele, docente, foi aprovado em Concurso Público de Provas e Títulos tendo sido indicado para prover um cargo, já não estava mais sob contrato e por isso infenso a exigências da CERT, uma vez que tendo completado os 6 anos de estágio probatório já estaria no RDIDP em “caráter permanente”. Finalmente, alega o recorrente, que à CERT cabe apenas opinar e não deliberar,  propor ou executar a aplicação da legislação pertinente, sendo inequívoco que compete ao Conselho do Departamento indicar em qual regime deverá servir o docente.

Análise 3.1.Dentre os diversos órgãos que compõem a Reitoria está a CERT (Estatuto, Artigo 34, Inciso XI) que tem a seguinte atribuição (Estatuto):

Artigo 91 – À Comissão Especial de Regimes de Trabalho, a que se refere o inciso XI do artigo 34, incumbe analisar as admissões de docentes, opinar acerca do regime de trabalho, orientar e coordenar a aplicação da legislação pertinente, bem como zelar pelo cumprimento das respectivas obrigações.

Parágrafo Único – A Comissão a que se refere o “caput” deste artigo opinirá após manifestação circunstanciada do Conselho do Departamento, ouvida a Congregação.

Ora, o parágrafo único do Artigo 91 é claríssimo: a CERT somente opina após manifestação dos órgãos da unidade. Seria totalmente ilógico que ela opinasse para os mesmos órgãos que já se manifestaram. Ignora-se o ordenamento jurídico da Universidade de São Paulo ao alegar que a contratação de docentes e seu regime de trabalho são estipulados pelo Conselho do Departamento. Os Conselhos de Departamento com a aprovação das Congregações (ou CTAs) manifestam esse desejo ou conveniência ao Reitor que é (Estatuto):

  Artigo 35 – O Reitor é o agente executivo da Universidade.

E cabe a ele (Estatuto, Artigo 42):

VII – estabelecer e fazer cessar as relações jurídicas de emprego do pessoal docente e não docente da Universidade.

Por isso, estipula a Resolução 3531 de 22 de junho de 1989:

Artigo 1º – A Comissão Especial de Regimes de Trabalho (CERT), prevista no inciso XI do artigo 34 do Estatuto da USP, é a Comissão supervisora e fiscalizadora dos regimes de trabalho do corpo docente da Universidade de São Paulo.

Artigo 2º – A CERT, incluindo seu Presidente e Vice-Presidente, será composta por 13 (treze) Membros, escolhidos pelo Reitor, dentre os integrantes da carreira docente da USP, que tenham se destacado nas atividades acadêmicas.

Artigo 6º – Compete à CERT:

…………………………………………………………..

IV – opinar sobre ingressos, reingressos, permanências, exclusões, licenças, afastamentos, transferências, comissionamentos, nomeações, admissões, contratos, renovações de contratos e alterações dos regimes do pessoal docente da Universidade.

 

Em obediência ao Regimento Geral:

Artigo 201 – A permanência em um determinado regime de trabalho não é definitiva, podendo o docente: a qualquer tempo, por decisão prévia do Conselho do Departamento, ouvido o CTA, com anuência da CERT, ser transferido de um regime de trabalho para outro.

e

Resolução 3533, de 22 de junho de 1989:

Artigo 3º – A CERT poderá, sempre que necessário, inteirar-se das atividades que venham sendo desenvolvidos pelo docente em RDIDP, mediante entrevista, visita ou solicitação de relatórios.

Artigo 8º – Por proposta circunstanciada da Unidade, aprovada pela CERT, ou por iniciativa desta, o docente em RDIDP poderá ser desligado do Regime quando seu relatório de atividades for considerado insuficiente.

Verifica-se, pois, que a contratação, nomeação e atribuição do regime de trabalho constituem um ato complexo que envolve deliberações sucessivas e hierarquicamente ascendentes de modo que autoridade máxima administrativa tome sua decisão de forma consciente. Por hipótese e apenas para exemplificar é possível que Conselho de Departamento, Congregação e CERT apontem para uma solução e o Reitor decida, motivadamente, por outra solução, eis que as decisões da Unidade e o parecer da CERT não são vinculantes. O Reitor pode legalmente tomar essa atitude porque – pelo artigo 42 do Estatuto – é ele que assina e manda publicar no Diário Oficial. Portanto, quando o legislador escreveu que a “CERT opinará” ele estava dizendo que a opinião era emitida para o Reitor e não para o Conselho de Departamento. Seria absurdo haver um órgão central ligado ao Reitor para “opinar” para mais de 200 Departamentos, cada qual com sua política específica. Além disso, vê-se pela legislação, que a CERT, isto é, o Reitor, pode, a qualquer tempo, solicitar relatório de quem quer que seja, esteja ou não em estágio probatório do RDIDP ou do RTC e seja ou não efetivo, pois, a efetividade é no cargo e não no regime de trabalho. Finalmente, deve ser esclarecido que o termo “ingresso no RDIDP em caráter permanente” é uma expressão que apenas indica que o docente não é obrigado a regularmente apresentar relatórios para sua permanência no RDIDP, sem prejuízo de que a qualquer tempo a autoridade possa exigir esse relatório. Portanto, ninguém é permanente no regime de trabalho que é decorrente dos interesses acadêmicos e das possibilidades financeiras da Universidade.

Alegação 3.2. (itens 4, 5, 6, 7, 8) – O docente alega que a CERT não poderia tomar atitude tão drástica tal como mudar-lhe o regime de trabalho uma vez que ele cumpre, à vista de todas as evidências, suas obrigações docentes e que seu relatório não atende a apenas um item, o de “publicações” que nem consta da relação de critérios para análise de relatórios no artigo 6º, § 3º, da resolução 3533/89. Os demais itens do recurso giram em torno do mesmo problema, exceto o item 6 que foi muito bem respondido no parecer da CJ e sobre o qual  não vou me deter.

Análise 3.2.– Sobre as alegações acima gostaríamos de evitar entrar no mérito, pois, a CERT é uma comissão de avaliação docente que presta serviços à autoridade máxima e embora sujeita a um balizamento genericamente imposto pelas regulamentações, suas decisões estão sujeitas a um grau importante de discricionariedade que decorre do entendimento de seus 13 membros sobre o que significa desempenho acadêmico. Esse é o motivo pelo qual exige-se que o Reitor escolha para membro da CERT quem tenha se destacado em suas atividades acadêmicas. Isso sem falar das instruções que tenham recebido do Magnífico Reitor uma vez que mesmo que ele não as tenha dado, a sua responsabilidade final é inarredável. Afinal, os membros da CERT são de livre nomeação do Reitor e, portanto, demissíveis ad nutum. A CLR não pode entrar no mérito da avaliação acadêmica, pois, estaria, se o fizesse, extrapolando suas funções. O caso presente é semelhante aos recursos impetrados contra comissões examinadoras de concurso. A CLR tem sempre defendido a posição de que se as bancas de concurso não infringirem regras e regulamentos devem ter toda a liberdade de manifestar sua opinião da forma que julgarem mais conveniente.

No entanto, é necessário, de uma vez por todas explicar o que se exige do RDIDP. Esse regime foi implantado para promover a atividade daqueles que se dedicam à investigação científica ou atividade equivalente nas áreas de humanidades, admitindo-se que todos os docentes – isto é todos os docentes sujeitos aos três regimes: RTP, RTC e RDIDP – devotem-se igualmente às atividades docentes. Sua implantação em 1963 foi um dos pilares do desenvolvimento científico no Estado de São Paulo, além da instalação da FAPESP no mesmo ano e da consolidação da pós-graduação na década de 70. Portanto, o diferencial do RDIDP (e do RTC) em relação ao RTP é a atividade científica. Ora, a atividade científica tem uma dinâmica própria e um processo de avaliação internacionalmente consensual. Como a atividade científica gera resultados, pois, parte-se de hipóteses que devem ser provadas ou rejeitadas, admite-se que o autor conte ao mundo o que fez, pois, caso contrário, que interesse haveria para a sociedade se um cientista obtivesse resultados e não os divulgasse? Admite-se, por princípio, que um cientista sem resultados não tenha trabalhado, uma vez que seus resultados positivos ou negativos são sempre passíveis de sistematização em relatórios, trabalhos e congressos, dentre outros. Aos que avaliam, cabe decidir sobre a qualidade dessas atividades que, no geral, é atestada por pessoal da área isento e acreditado, isto é, assessores das melhores revistas na área ou, quando não há publicações que atestem a qualidade do trabalho, assessores de projeção na área. Nesse sentido, o procedimento da CERT não é diferente daquele adotado pelos órgãos de apoio à pesquisa como o CNPq e a FAPESP.

4.      Voto

Desde 1994, o docente vem sendo alertado pela CERT sobre a insuficiência de sua atividade científica, componente importante nas atividades dos docentes sujeitos ao RDIDP. Por isso, não se pode alegar que o ato final da CERT, recomendando alteração no regime de trabalho do docente, seja atrabiliário ou esteja eivado de sentimento de intolerância. É possível, no entanto, que tenha havido um descompasso entre a percepção do docente e o que, de fato, significam as leis que regem o RDIDP. No entanto, não é a primeira vez que o fato ocorre e, no passado, parece-me que tenha ocorrido com maior freqüência do que no momento presente. Julgo que o ato do Magnífico Reitor, concedendo-lhe um ano para apresentar um relatório de melhor qualidade indica tolerância, uma vez que a proposta da CERT é a alteração imediata do regime.

De qualquer forma, a fim de orientar o colendo Co é importante que se enfatize que não cabe à instância máxima de decisão decidir se o Reitor pode ou não proceder como está procedendo, uma vez que isso lhe é garantido pelo Estatuto. Nem pode o Conselho votar pela extensão do RDIDP do recorrente para além do que foi recomendado pela CERT e decidido pelo Reitor porque se assim procedesse estaria invadindo atribuições administrativas que fogem à sua alçada. A CERT pode fazer o que está fazendo e as Universidades têm autonomia para baixar as suas normas, respaldadas que estão pelo Artigo 207 da Constituição Federal.

É evidente que se a manutenção do docente no RDIDP por mais um ano for seguida por uma avaliação insatisfatória, é necessário que a motivação que justificará a alteração do regime do docente deve estar bem mais fundamentada do que o foi presentemente, isto é, a CERT deverá explicar o que significa o docente não ter “publicações mesmo em revistas nacionais”, pois, certamente, na esfera do poder judiciário os valores da Universidade deverão ser melhor explicados para que sejam inteiramente compreendidos.

Ao Conselho cabe votar este parecer que, sem entrar no mérito das decisões de cunho acadêmico da administração central, afirma que a Universidade tem o direito de ter suas próprias leis e de enfatizar aquelas que entende serem importantes na manutenção da qualidade. As instâncias finais na cadeia de avaliação docente começam no Departamento e passam pela Congregação, são a CERT e o Reitor. O voto favorável ao parecer, que é o que a CLR recomenda, permitirá que o assunto volte ao âmbito dessas instâncias. O voto contrário a este parecer torna sem eficácia – embora não o revogue – o disposto no Artigo 3º da Resolução 3533, de 22 de junho de 1989 e, indiretamente, o artigo 201 do Regimento Geral que lhe dá abrigo doutrinário. Neste último caso, o Conselho Universitário estaria eliminando, na prática, qualquer tipo de controle da CERT sobre todos os docentes que já terminaram o estágio probatório.

É o meu parecer, s.m.j.

São Paulo, 29 de outubro de 2000.

Walter Colli
Relator

EXPRESSO ADUSP


    Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui

    Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!