A continuidade do desmonte do HU¹
"Abraço no HU": manifestação de protesto dos movimentos sociais, em 24 de novembro de 2017 (foto: Daniel Garcia)

Relembramos aqui um pouco da história de construção do Hospital Universitário da Universidade de São Paulo (HU) e apresentamos uma série histórica de seus principais indicadores de desempenho, tendo como fonte os Anuários Estatísticos da USP de 2010 a 2024, com o objetivo de mostrar e tentar entender seu rápido desmonte, em especial após 2014, quando assumem a Reitoria Marco Antonio Zago e Vahan Agopyan, como reitor e vice-reitor, respectivamente.

O HU foi idealizado em 1966, repensado em 1969 e sua obra foi concluída em 1978, mas seu funcionamento se deu apenas a partir de 1981, por pressão de moradores(as) do Butantã, contando com o Laboratório Clínico e a Pediatria e, em seguida, também com a Maternidade. Em 1985, tiveram início a Clínica Médica no primeiro semestre e a Clínica Cirúrgica no segundo semestre.

Sobre suas funções, segundo o site do HU,

(…) além da sua importante função assistencial, [o HU] tem como função primordial o ensino, envolvendo as unidades de ensino da área de saúde da Universidade de São de Paulo (Medicina, Enfermagem, Odontologia, Nutrição, Psicologia, Fisioterapia, Terapia Ocupacional, Fonoaudiologia e Ciências Farmacêuticas). Todos os alunos realizam suas disciplinas de práticas clínicas e cirúrgicas dentro do HU.

Ainda segundo o mesmo site, anualmente, o HU atende cerca de 2.500 estudantes e produz muitas pesquisas. Trata-se de um equipamento de média complexidade, compondo o nível secundário de atenção em saúde, um hospital que realiza ensino, pesquisa e extensão de serviços à comunidade.2

De acordo com seu regimento, o HU “deve prestar serviços aos corpos docente, discente e de servidores técnicos e administrativos da USP, bem como à população da área geográfica correspondente ao Distrito de Saúde do Butantã”.3 Para melhor compreensão, segundo o regimento do HU,

Artigo 2º – Para a consecução de seus objetivos cabe ao HU:

I – estimular e promover o ensino e a pesquisa, servindo-lhes de campo de atividades e desenvolvimento;

II – desenvolver atividades assistenciais de prevenção e tratamento da doença, bem como de proteção e recuperação da saúde;

III – colaborar com as instituições de ensino no desenvolvimento de tecnologias assistenciais, educativas e operacionais.

Ao longo de seus 44 anos de funcionamento, o HU se consolidou com um hospital-escola que cumpre com muita competência suas funções, garantindo atividades de ensino, pesquisa e extensão. Contudo, as gestões reitorais têm tentado desqualificar as funções do HU, e o fazem usando estratégias deliberadas de desmonte, como veremos a seguir. Cabe registrar que tem havido forte resistência ao desmonte do HU por parte das entidades representativas da comunidade uspiana, a Associação de Docentes (Adusp), o Sindicato de Trabalhadores (Sintusp), o Diretório Central de Estudantes (DCE Livre “Alexandre Vannucchi Leme”) e do Coletivo Butantã na Luta (CBL), organização da comunidade atendida pelo hospital. Mas, apesar dessa resistência, não se conseguiu até o presente momento barrar a investida de sucessivas gestões na Reitoria da USP.

O estrangulamento do HU ficou mais evidente a partir da gestão Zago-Agopyan (2014-2017), que se utilizou da “omissão dos poderes públicos que deveriam financiar a saúde pública na região (Prefeitura e Estado), bem como a crise de financiamento da USP (acentuada pela [então] queda temporária na arrecadação de ICMS), como pretextos para um ataque truculento ao hospital, que incluía até mesmo a tentativa de ‘desvinculação’” (Estão atacando o Hospital da USP – A comunidade resiste!, Adusp, 2018, p. 3-4).

A gestão seguinte, Vahan Agopyan-Antonio Carlos Hernandes (2018-2021), respectivamente reitor e vice, manteve a política anterior, mostrando igual indiferença frente à situação do HU. “O governo estadual, por sua vez, manteve-se omisso diante do processo de estrangulamento do hospital, recusando-se a fornecer-lhe uma maior parcela de recursos” (Estão atacando o Hospital da USP…, p. 7). Pouco resultaram também as tentativas do Ministério Público do Estado de São Paulo (MPE-SP), em especial via ações do promotor de justiça Arthur Pinto Filho e equipe, da área de atuação em Saúde Pública, visando contribuir para a solução do problema então já recorrente. Carlos Gilberto Carlotti Júnior e Maria Arminda do Nascimento Arruda, atuais reitor e vice, respectivamente, embora tivessem se comprometido com a recuperação do HU no início da gestão, em 2023 declararam no Conselho Universitário que não recuperariam o hospital por ser “um serviço extremamente caro”.

Vejamos, a seguir, os principais dados de desempenho do HU no período citado, que permitem verificar, por exemplo, a perda de pessoal e a diminuição de leitos, ambas notáveis e propositais, que propiciaram e ainda propiciam uma inacreditável queda no atendimento à comunidade USP e à comunidade SUS-Butantã no período 2013-2024.

O desmonte do HU-USP em números

Analisamos os dados dos Anuários Estatísticos da USP de 2014 a 20254, referentes ao desempenho do HU, adotando gráficos de variações relativas percentuais, pois eles permitem comparar a variação de grandezas diferentes em uma mesma escala.

Fonte: Anuários Estatísticos da USP, 2014 a 2025, elaboração da(o)s autora(e)s.

Tomamos o ano de 2013 (0% no gráfico) como referência para comparação, pois desde pelo menos 2009, no geral, é o que apresentou números maiores de atendimentos dos indicadores de desempenho considerados, sendo que em publicação anterior (já citada) é possível verificar tais indicadores em anos anteriores. No período 2019-2024 em comparação com 2013 o número de cirurgias realizadas a cada ano foi diminuindo, com ligeiro aumento em 2023, mas posteriormente retornando em queda, e neste mesmo período as consultas médicas foram decrescendo, subindo um pouco em 2022, mas voltando a cair a partir de então e os exames complementares sofreram queda, embora tenham apresentado um crescimento de 2020 a 2023, mas descrescendo a partir de então.

É curioso notar que após 2019 certamente os dados já refletem as decorrências da pandemia de Covid-19 e, como seria de se esperar, os dados numéricos dos quesitos considerados, sobretudo de consultas e exames, deveriam estar ampliados, mas isto não ocorreu. Seja como for, em síntese, considerados os indicadores de desempenho em questão, é de difícil compreensão a pequena contribuição do HU para o atendimento da comunidade USP e da comunidade SUS-Butantã no período.

Fonte: Anuários Estatísticos da USP, 2014 a 2025, elaboração da(o)s autora(e)s.

Em comparação com 2013 (0% no gráfico), o número referente às internações diminuiu, chegando a uma defasagem de mais de 40% em relação àquele de 2019, tendo ligeiro acréscimo até 2020 e depois voltando a diminuir até 2023, quando volta a subir em 2024, mas atingindo apenas cerca da metade do desempenho de 2013. O número de partos diminui até 2019, depois sobe até 2020, quando houve deslocamento dos atendimentos de obstetrícia do Hospital das Clínicas para o HU por causa da pandemia de Covid-19, voltando a cair até 2021 e a partir daí subindo novamente até 2023, com pequena diminuição até 2024. De novo, é muito evidente o contraste entre o atendimento nesses dois quesitos em 2013 e sua diminuição numérica até 2024, o que demanda uma explicação sobre o ocorrido, pois não é razoável supor que se trate apenas de uma “fotografia” que expressa as contingências do período ao qual as comunidades da USP e do SUS-Butantã estão submetidas; é bem mais plausível que resulte de condições às quais o HU tem sido sujeitado por sucessivas gestões da Reitoria da USP.

Fonte: Anuários Estatísticos da USP, 2014 a 2025, elaboração da(o)s autora(e)s.

A rigor, o título deste gráfico deveria ser “Principais condicionantes de desempenho do HU de 2019 a 2024”, pois sem dúvida alguma os “insumos” essenciais para o funcionamento adequado de qualquer instituição pública (não só delas) são a(o)s trabalhadora(e)s, no caso a(o)s servidora(e)s no HU, e as condições materiais que lhes são propiciadas para que possam bem exercer suas funções, aqui simbolicamente tomado como exemplo o número de leitos disponibilizados no HU pela USP.

Se o número de funcionária(o)s havia subido até 2013, chegando a cerca de 1.850, ele pouco oscilou entre 1.458 (2020) e 1.303 (2023), chegando a 1.310 em 2024 – registrando uma perda de cerca de 543 profissionais em onze anos! O fato dispensa comentários adicionais se não a constatação de opção pelo “enxugamento” de pessoal nos moldes preconizados pela Reforma do Estado. O número de leitos, que já havia tido uma queda grande até 2018-2019, subiu um pouco até 2020, possivelmente devido à pandemia de Covid-19, e depois retornou ao patamar de 2019. Assim, a equivalência relativa entre os números de funcionária(o)s e de leitos no período 2020-2024, que poderia ensejar o não acúmulo de trabalho da(o)s profissionais da saúde no HU, certamente não deve ter ocorrido por mero acaso, mas isto não autoriza sugerir que a política adotada para o HU tenha, por exemplo, “amenizado” a intensa rotina da(o)s profissionais que lá trabalham, sendo bem mais provável que se trate de opção por contenção de despesas.

Fonte: Anuários Estatísticos da USP, 2014 e 2020 a 2025, elaboração da(o)s autora(e)s.

Embora esses dados já tenham sido objeto de considerações feitas após os gráficos apresentados anteriormente, é sempre interessante observá-los em sua objetiva expressão numérica, pois eles podem melhor aquilatar a grandeza que expressam intrinsecamente. Assim sendo, o que significa diminuir os exames complementares de 1.413.605 em 2013 para 540.160 em 2024? Ou restringir as consultas médicas de 416.789 em 2013 para 76.085 em 2024? Ou ainda, cercear o número de cirurgias de 5.159 em 2013 para 2.634 em 2024? Sim, porque é assaz importante lembrar que “diminuir”, “restringir” e “cercear” procedimentos relativos à saúde para a comunidade universitária e para a comunidade SUS-Butantã têm a ver com a amplitude do respeito que as gestões reitorais outorgam às pessoas que estudam e trabalham na USP.

Novamente, é notório o fato de que todos os dados referentes ao desempenho do HU — cirurgias, internações, consultas, partos, exames complementares — sofrem queda acentuada, sobretudo a partir de 2014, início da gestão Zago-Agopyan, sendo que as gestões Agopyan-Hernandes e Carlotti Jr.-Arruda deram sequência ao progressivo desmonte do HU.

Sobre o potencial de atendimento já alcançado pelo HU

Fonte: Anuários Estatísticos da USP, 2010 a 2025, elaboração da(o)s autora(e)s.

Este quadro mostra, em especial, o atendimento já realizado anteriormente pelo HU, comprovando seu potencial de desempenho enquanto unidade de ensino, pesquisa e extensão da USP. Assim, entre os vários dados disponíveis nos Anuários Estatísticos de 2010 a 2025, destacamos o dado que indica “maior desempenho” e o ano em que isto ocorreu (segunda coluna, 100%); a seguir comparamos com o dado mais recente (2024, coluna 3); e, em seguida, registramos o que este dado mais atual representa em relação ao maior desempenho já alcançado anteriormente (coluna 4).5

Comparação quantitativa como a aqui adotada não tem a intenção e nem permitiria concluir, necessariamente, que os serviços promovidos pelo HU foram de “melhor qualidade”; ela apenas revela o potencial de atendimento em termos de cada item que consta da coluna 1 do quadro. Assim, de forma geral, o HU pode propiciar um atendimento mais amplo em todos os quesitos citados, de modo que a mera constatação do contraste desses dados requer explicação à comunidade uspiana, à comunidade SUS-Butantã e à sociedade paulista, pois soa no mínimo indefensável que o HU realize bem menos do que já mostrou ser capaz fazê-lo.

Repare-se que neste quadro tivemos a preocupação de apresentar em separado o atendimento à comunidade USP (1) do atendimento à comunidade SUS-Butantã (2), pelo fato de constatar que, no geral, o atendimento à primeira sofreu uma queda maior no período considerado (2009-2024), o que certamente não terá acontecido por acaso e demanda uma explicação/justificativa por parte da administração universitária.

Quais motivos “justificariam” que o HU tenha reduzido substancialmente o atendimento prestado, seja em cirurgias, consultas médicas, exames complementares, internações e partos? Por que ocorreu uma diminuição do número de funcionária(o)s — cerca de 30% no período 2009-2024? Por que aconteceu uma redução de leitos — queda para quase a metade no mesmo período?

Como explicar que o hospital já tenha sido capaz de realizar um atendimento à comunidade USP de 1) 1.170 cirurgias em 2010 e tenha realizado apenas 297 em 2024?; 2) 163.035 consultas médicas em 2013 e tão somente 43.912 em 2024?; 3) 398.756 exames complementares em 2012 e 108.582 em 2024?; e 4) 1.472 internações em 2009 e apenas 236 em 2024?

E, ainda, já tenha sido capaz de realizar um atendimento à comunidade SUS-Butantã de: 1) 4.179 cirurgias em 2013 e tenha realizado apenas 2.337 em 2024?; 2) 280.399 consultas médicas em 2011 e tão somente 32.173 em 2024?; 3) 1.045.989 exames complementares em 2013 e 431.578 em 2024?; e 4) 11.635 internações em 2013 e apenas 6.253 em 2024?

É público e notório que a partir de março de 2020 o país foi atingido pela pandemia de Covid-19 e a USP e o HU não ficaram isentos, o que explica em parte a queda no desempenho de quase todos os índices a partir de então. Mas os dados de anos anteriores já revelavam que o hospital vinha sendo submetido a um amplo processo de desmonte, conforme já citado. Como entender a omissão da USP em relação ao HU?

Isso tudo mostra o potencial de atendimento dessa importante unidade de ensino, pesquisa e extensão da USP. E todas essas quedas registradas nos diferentes tipos de atendimentos precisam ser explicadas, sendo que a responsabilidade por esta explicação é da administração central — sem ignorar, contudo, a contribuição das gestões da Superintendência do HU no processo degenerativo a que ele foi submetido, sobretudo após 2014. Tal processo teria a ver só com a insuficiência de recursos?6

As quedas de alguns indicadores gerais como, por exemplo, a do número de funcionária(o)s: 1.853 em 2013 (melhor ano) e 1.310 em 2024; assim como a do número de leitos: 233 de 2010 a 2013 (melhor período) e 128 em 2024 resultaram na inviabilidade da manutenção dos melhores desempenhos já apresentados pelo HU na série histórica considerada. A queda desses dois indicadores sem dúvida faz parte das consequências das duas etapas do Programa de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV) adotadas a partir de 2014 e 2016, respectivamente,7 e é provável que resultem também de diretrizes do projeto “USP do Futuro”, coordenado a soldo pela consultoria McKinsey&Company, sobre o qual ainda muito pouco se sabe. Assim, a questão central que se coloca é: quais teriam sido os objetivos do desmonte do HU?

Considerações finais

Vigora na USP uma cultura de “avaliação”8, cujo ponto de partida deveria ser obrigatoriamente a verificação de dados que expressam as atuações de suas unidades (também do HU) em termos de ensino, pesquisa e extensão, permitindo a realização de diagnósticos que, por um lado, propiciassem a constatação de práticas adequadas, que precisariam ser reproduzidas, e, por outro, a identificação de condutas que deveriam ser abandonadas ou corrigidas. Um dos aspectos centrais nos processos avaliativos é a elaboração de planejamentos estratégicos que definam objetivos a serem alcançados (consideradas as condições de base de infraestrutura física e de pessoal), segundo o que se espera de um funcionamento institucional adequado.

Mas nada disso parece estar sendo respeitado, quando se observa a situação à qual o HU tem sido submetido. Os dados do quadro anterior mostram o descaso de sucessivas gestões — sobretudo as de 2014 em diante — para com a unidade de ensino, pesquisa e extensão da USP. No que foram secundadas por gestões do próprio hospital e talvez até com alguma eventual conivência de gestões das outras unidades que demandam o HU, sendo que várias delas têm assento em seu Conselho Deliberativo.9 Ou seja: soa incompreensível que a administração central e a Superintendência do HU não tenham se preocupado com os dados de desempenho; e, portanto, também não tenham se ocupado da identificação das causas que provocaram esses dados e de suas correções.

Diante dessa situação, sugerimos a apreciação de três hipóteses eventualmente explicativas do quadro adverso. A primeira delas é a de que pode não ter interessado às gestões citadas a situação do HU, ou mais grave, pelo menos no que se refere à gestão Zago-Agopyan, se considerarmos a fala do então reitor em outubro de 2016 ao jornal Valor Econômico: “Zago: (…) E há outros gastos que parasitam a vida da universidade. Valor: Como o quê? Zago: Um hospital universitário, por exemplo, chamado HU.”

Ou seja: o então reitor já revelava uma visão do HU no mínimo distorcida, que pode ter sido introjetada por seu sucessor na Reitoria, na medida em que não se tem notícia de que Agopyan tenha contestado a visão de Zago. O fato de ignorarem a queda de todos os indicadores de desempenho do HU e, portanto, de não proverem as condições para que o hospital voltasse a ostentar o desempenho de anos anteriores, impõe questionar: teria sido apenas um lapso da gestão Zago-Agopyan? Ou ela teria pleiteado, por exemplo, entregar sua gestão para a Secretaria de Estado da Saúde de São Paulo?10

Uma segunda hipótese, também potencialmente explicativa, é a de que as gestões Zago-Agopyan, Agopyan-Hernandes e Carlotti Jr.-Arruda teriam aderido à política dos governos de privatizar o que fosse possível, buscando delegar a gestão do HU a uma “organização social de saúde” (OSS)11, algo à semelhança do que já ocorreu com o Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC/Centrinho) da Universidade de São Paulo e com vários hospitais estaduais e, de certo modo, também está em curso no Hospital do Servidor Público Estadual (HSPE), na esteira da Reforma do Estado (eixos: privatização, terceirização e “publicização”)12, em vigor no país desde meados dos anos 1990.

Uma terceira hipótese seria a de que as gestões citadas, assim como também as que as sucederam, tenham adotado uma postura mais condizente com os interesses dos governos vigentes do que da representação para a qual foram eleitas. Isto parece evidente, por exemplo, quando se constata o empenho raquítico ou mesmo a omissão dessas gestões durante a definição das principais peças de planejamento orçamentário do Estado, em especial da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO, anual) e da Lei Orçamentária Anual (LOA), momentos de disputa do fundo público, sobretudo porque a USP, a Unesp e a Unicamp dependem da destinação de 9,57% do ICMS quota-parte do Estado, que tem sido insuficiente. Sem mencionar a omissão das reitorias quanto ao financiamento das universidades estaduais paulistas com advento da reforma tributária que, inevitavelmente, mudará a base de cálculo das peças orçamentárias. Isto não condiz com o que se espera de dirigentes de instituições públicas.

Outras hipóteses explicativas poderiam ser formuladas, mas o que a “vista permite alcançar” sugere a prevalência de alguma das hipóteses já citadas, ou mesmo da intersecção delas. Contudo, o mais importante no caso é a grave constatação de que o HU foi sendo celeremente desmontado — e, por certo, só ainda não entrou em colapso pela dedicação de todo o pessoal que lá trabalha diuturnamente.

Assim sendo, em síntese, uma lição precisa ser apreendida dessa saga antissocial que inclui a demorada construção e o célere desmonte do HU, cabendo à Reitoria atuar não só para seja explicado o desmonte ocorrido, mas, sobretudo, para recuperar o pleno funcionamento do HU — isto faz parte da incumbência da instituição que ela representa. Vejamos o que nos dizem as candidatas e os candidatos a ocupar a Reitoria entre 2026 e 2029.

___________

1) Este artigo foi publicado anteriormente no Jornal da USP de 10/5/2022 e está disponível — sem as notas de rodapé — aqui. Esta versão teve seus dados atualizados em função do Seminário sobre o HU a ser realizado em 11/11/2025.

2) “Como [instituição hospitalar de] Nível Secundário, estão as Clínicas e Unidades de Pronto Atendimento, bem como Hospitais Escolas. Nesses são realizados procedimentos de intervenção bem como tratamentos a casos crônicos e agudos de doenças.” Disponível aqui. Acesso em 22/3/2022.

3) A referência ao Distrito de Saúde do Butantã corresponde atualmente à Supervisão Técnica de Saúde Butantã, que engloba cinco Distritos Administrativos: Butantã, Morumbi, Raposo Tavares, Rio Pequeno e Vila Sônia, cuja população segundo o Censo de 2022 era de cerca de 470 mil pessoas. Estima-se que somadas a população citada e a comunidade USP chega-se a muito mais de 500 mil pessoas. Disponível aqui.

4) O Anuário de um determinado ano contém dados do ano anterior e assim por diante, ou seja, há sempre uma defasagem anual. Indicamos os anos nos quais os dados ocorreram e somamos os números referentes à comunidade uspiana e à comunidade SUS-Butantã, que aparecem em separado nos Anuários.

5) Gestões reitorais: 2005-2009, Suely Vilela Sampaio e Franco Maria Lajolo; 2010-2013, João Grandino Rodas e Hélio Nogueira da Cruz; 2014-2017, Marco Antonio Zago e Vahan Agopyan; 2018-2021, Vahan Agopyan e Antonio Carlos Hernandes; 2022-2026, Gilberto Carlotti Jr e Maria Arminda do Nascimento Arruda.

6) Cabe registrar que em 2014 ocorreu uma greve de docentes e funcionária(o)s, cuja pressão certamente obrigou o Cruesp a enviar o Ofício 17/2014 à relatoria da LDO-2015 na Alesp e o Ofício 24/2014 à Secretaria da Ciência, Tecnologia, Desenvolvimento Econômico e Inovação, ambos tratando da insuficiência de recursos para as três universidades estaduais paulistas, postura institucional inédita, mas que não voltou a se repetir, embora a insuficiência de recursos persista e não é só um problema para o HU-USP. Disponíveis aqui.

7) Ver a Resolução USP 6.987/2014, de 13/11/2014 (Disponível aqui) e a Resolução USP 7.229/2016, de 13/7/2016 (Disponível aqui).

8) Que nada tem de diagnóstica, mas sim de forte teor produtivista quando se refere ao trabalho de docentes e funcionária(o)s técnico-administrativa(o)s e, no mínimo, omissa sobre o desempenho do HU.

9) Compõem o Conselho Deliberativo do HU: a(o)s diretora(e)s das unidades: Enfermagem, Ciências Farmacêuticas, Medicina, Odontologia, Saúde Pública e Psicologia, além das representações de discentes, de servidora(e)s técnico-administrativa(o)s e de usuária(o)s do Distrito de Saúde do Butantã (um de cada). Ver Artigo 6° do Regulamento do Hospital Universitário da USP.

10) A gestão Zago-Agopyan propôs e a reunião do Conselho Universitário de 26/08/2014 aprovou a desvinculação do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC), o Centrinho de Bauru.

11) “No caso das Organizações Sociais da área da Saúde (OSS), a Lei Complementar estadual [LC n° 1.243/2014] define, dentre outras características, que a organização [privada] sem fins lucrativos comprove possuir serviço de saúde há mais de 5 (cinco) anos.” Disponível aqui.

12) Publicização é o conceito forjado por Bresser Pereira, significando o processo que delega a entidades públicas não estatais, sem fins lucrativos, a prestação de serviços antes realizados pelo Poder Público.

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