A Superintendência de Saúde da USP (SAU) publicou no último dia 30/1 a Portaria nº 1/2023, assinada pelo superintendente Paulo Andrade Lotufo, que estabelece os procedimentos a serem observados em caso de “reiterados afastamentos” de servidora(e)s por motivo de saúde que levem a “comprometimento ao serviço”.

As medidas se baseiam no disposto pela Portaria GR nº 7.844, de 30/11/2022, segundo a qual o(a) superior(a) hierárquico(a) poderá, nesses casos, “solicitar o encaminhamento do servidor à Superintendência de Saúde, para avaliação médico-ocupacional”.

Havendo “reiterados afastamentos”, a SAU “poderá solicitar o comparecimento do servidor a serviços próprios ou contratados da Universidade para avaliação médico-ocupacional”.

A SAU também invoca a Norma Regulamentadora 7 (NR-7), que traça as diretrizes do Programa de Controle Médico de Saúde Ocupacional (PCMSO), aplicada às organizações e aos órgãos públicos da administração direta e indireta, bem como aos órgãos dos poderes Legislativo e Judiciário e ao Ministério Público, que possuam empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).

A portaria da SAU estabelece que o(a) superior(a) hierárquico(a), com o apoio do Centro de Serviços Compartilhados em Recursos Humanos ou da Seção de Pessoal, deve informar à direção do órgão ou unidade as ocorrências em que “o afastamento repetitivo do(a) servidor(a) estaria comprometendo o serviço”.

Essa comunicação deve ser feita em memorando acompanhado de documentação comprobatória, incluindo cópia dos atestados médicos.

A direção do órgão ou unidade “poderá acolher ou não a denúncia apresentada”. Em caso positivo, deverá encaminhar a documentação protocolada à SAU.

No passo seguinte, o Departamento de Assistência à Saúde e a Divisão de Saúde Ocupacional da SAU “analisarão em conjunto a situação apresentada e elaborarão relatório” a ser encaminhado à/ao superintendente. Este(a), de posse do relatório, “poderá convocar o servidor para avaliação médico-ocupacional que será realizada por dois médicos de forma independente”.

O(a)s médico(a)s, prossegue a portaria, vão elaborar um “relatório sucinto” para apontar se foi possível identificar uma das seguintes situações: “1) uso inadequado de atestados para abono de falta por doença; 2) doença subjacente, identificada ou não, que implicará atendimento médico específico; 3) encaminhamento para Previdência Social para licença prolongada ou aposentadoria por invalidez; 4) denúncia sem materialidade por parte do superior imediato/mediato”.

Após esses trâmites, a(o) superintendente de Saúde avaliará o relatório da ocorrência e comunicará sua decisão à direção do órgão ou unidade. Aliás chama atenção, nas mudanças implantadas, o fato de que elas implicam maior centralização nas mãos da alta administração.

USP perdeu 23,5% do pessoal técnico-administrativo entre 2014 e 2021

Na avaliação da advogada Lara Lorena Ferreira, do Departamento Jurídico da Adusp, se os mecanismos previstos na portaria forem mal-utilizados, “podem dar ensejo a perseguições ou punições às/aos servidores”.

O maior problema da implementação da portaria, avalia Lara Lorena, é a definição de quem serão o(a)s médico(a)s avaliadore(a)s. “Devem ser, necessariamente, da área da Medicina do Trabalho porque, em tese, uma série de atestados sequenciais pode apontar para uma doença ocupacional ou ainda uma ocorrência de assédio no trabalho. Ainda, somente os médicos do trabalho podem avaliar o que seja ‘comprometimento do serviço’. Qualquer outra especialização não cumprirá o objetivo final de checar a legitimidade dos atestados para abono de falta em razão de doença ou fazer os demais encaminhamentos”, afirma.

A advogada considera que, concluindo-se por uma denúncia sem materialidade, o(a) superior(a) hierárquico(a) deveria ser responsabilizado(a), o que a portaria não prevê.

Lara levanta ainda a possibilidade do surgimento de conflitos éticos caso um(a) do(a)s médico(a)s avaliadore(a)s conteste atestados fornecidos anteriormente por outro(a)s profissionais.

Cabe lembrar que, por conta das políticas de congelamento de contratações impostas na USP desde 2014 e das duas edições do Programa de Incentivo à Demissão Voluntária (PIDV) em 2015 e 2016, o número de servidore(a)s técnico-administrativo(a)s da universidade vem caindo continuamente. De acordo com números oficiais do Anuário Estatístico da USP, havia 17,2 mil servidore(a)s em 2014, contra 13,1 mil em 2021 – uma queda de 23,5%.

No mesmo período, a universidade registrou expansão no número de cursos e de aluno(a)s, o que resulta em aumento da carga de trabalho do(a)s funcionário(a)s.

A sobrecarga e o envelhecimento do corpo funcional são fatores que indiscutivelmente contribuem para o adoecimento do(a)s servidore(a)s.

Conforme demonstrou pesquisa realizada em 2018, as doenças do sistema osteomuscular e do tecido conjuntivo (do grupo CID-10 M, de acordo com a Classificação Internacional de Doenças) são as que afastam o maior número de trabalhadore(a)s de suas funções na USP, mas aquelas que correspondem ao grupo dos transtornos mentais e comportamentais, classificadas como CID-10 F, são as mais frequentes e levam o(a)s servidore(a)s a se afastar por maior número de dias.

Um ponto crítico levantado pelo(a)s trabalhadore(a)s na pesquisa da assistente social Ariana Celis Alcantara é a avaliação de que o(a)s funcionário(a)s são excluído(a)s das decisões no ambiente de trabalho. Quanto pior a avaliação das relações socioprofissionais por parte do(a) servidor(a), maiores são as chances de afastamento por motivo de doença, concluiu a pesquisa.

EXPRESSO ADUSP


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