Curso de Letras da FFLCH paralisou atividades em 10/5 para exigir que a Reitoria contrate docentes
Chico, do CAELL, fala aos colegas durante a manifestação na Reitoria (foto: Daniel Garcia)

Nesta quarta-feira (10/5), estudantes de diferentes habilitações do curso de letras da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) paralisaram as atividades dos respectivos departamentos para protestar contra a situação de colapso iminente e exigir imediata reposição de docentes — e também de funcionário(a)s técnico-administrativo(a)s. Eles seguiram em passeata até o prédio da Reitoria, onde realizaram um ato público e conseguiram que uma comissão fosse recebida pelo Gabinete do Reitor.

Também participaram da manifestação na Reitoria: Vanessa Martins do Monte, professora do Departamento de Letras Clássicas e Vernáculas (DLCV) e diretora da Adusp; Adrián Fanjul, chefe do Departamento de Letras Modernas (DLM); Maite Celada e Tércio Redondo, igualmente docentes do DLM. Ao lado de três estudantes, Vanessa e Adrián compuseram a comissão que conversou com Edmilson Dias de Freitas, coordenador-executivo do Gabinete do Reitor.

A mobilização desta quarta, decidida em assembleia discente, foi subsidiada por um dossiê elaborado pelo Centro Acadêmico de Estudos Linguísticos e Literários “Oswald de Andrade” (CAELL), repleto de dados que detalham a gravíssima situação de insuficiência de docentes nos departamentos de letras e literatura da FFLCH, que não será resolvida pelas contratações previstas pela atual gestão da Reitoria. “Chega de Ca(r)lote, contratação de professores já”, provocava uma faixa, brincando com o sobrenome do reitor.

“A gente reduziu vagas de habilitações por causa da falta de contratações. O CAELL apresentou um dossiê muito bom, que levanta toda a situação dos cinco departamentos, mostrando que a previsão de contratação não dá conta de nem metade das perdas que tivemos nesse período, e considerando todas as aposentadorias até 2026”, explica Vanessa ao Informativo Adusp. Ela relatou que, a princípio, o coordenador-executivo do Gabinete do Reitor pareceu não compreender a seriedade dos problemas existentes e das reivindicações apresentadas pela comissão.

“Os pedidos de claros foram reprovados no ano passado, a gente teve que reformular, e ele falou que é uma questão do Tribunal de Contas. Eu disse que não. A gente tem que fazer uma justificativa de contratação seguindo um modelo totalmente empresarial, dizendo de impacto, de metas de longo prazo para os docentes, sendo que a justificativa está explícita, que é a falta de docentes, são habilitações fechando, disciplinas obrigatórias não sendo oferecidas. Então não é uma questão jurídica”, esclarece a professora, que é vice-presidente da Comissão de Graduação da FFLCH e coordenadora da Licenciatura.

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Professor Tércio Redondo, do DLM, dirige-se aos estudantes de Letras

A comissão citou, em seguida, a portaria que passará a valer a partir de 2025, segundo a qual a reposição regular se dará em 50% das contratações e a reposição dos outros 50% das perdas dependerá de editais de mérito. “Adrián defendeu que não pode haver uma competição para as atividades-fim da universidade, porque isso inviabiliza a organização das grades curriculares de cada uma das habilitações, de cada um dos cursos”.

Ao final, Edmilson informou, à guisa de encaminhamento, que vai propor à vice-reitora Maria Arminda, presidente da Comissão de Claros Docentes (CCD), que se reúna com estudantes e professores do curso de Letras, para tratar das demandas apresentadas pelo movimento. “Essa será a sugestão dele, que ele não sabe se será aceita ou não, nem quando terá uma resposta para esse encaminhamento”, diz Vanessa.

Dossiê do CAELL denuncia redução de vagas nas habilitações

O dossiê elaborado pelo CAELL indica que em três departamentos há necessidade urgente de contratações em número muito maior que o calculado pela Reitoria. Ao Departamento de Línguas Orientais (DLO), por exemplo, foi garantida a contratação de um único claro docente para os próximos três anos. “Isso é um insulto ao departamento e [às] suas sete habilitações. É urgente a contratação de 13 docentes para repor o patamar docente das sete habilitações, além de mais sete docentes para oferecerem as disciplinas de Metodologia do Ensino de cada língua na licenciatura”, diz o dossiê.

O quadro de funcionários do DLO também passou por uma redução desde 2014: de 5 funcionários, restam 3. “Exigimos a contratação de mais dois funcionários para o DLO para que o serviço prestado pelas secretarias volte ao patamar anterior, sem sobrecarga dos atuais funcionários nem diminuição do tempo de atendimento aos estudantes”.

Já o DLM, que oferece cinco habilitações na graduação (Alemão, Espanhol, Francês, Inglês e Italiano) e diferentes programas de pós-graduação, perdeu 35% de seus docentes desde a gestão de “austeridade fiscal” do reitor M.A. Zago (2014-2017), que congelou as contratações: de 72 docentes em 2014, agora conta com apenas 47.

“A habilitação em Inglês já sofreu redução de vagas ofertadas no ranqueamento (processo seletivo interno do curso de Letras que ocorre ao final do Ciclo Básico) e recentemente a habilitação em Espanhol anunciou também uma redução das vagas a partir dos próximos editais da Fuvest. Se a reposição de docentes aos parâmetros de 2014 não for garantida, parte destas habilitações terá de ser fechada no período noturno, a exemplo do que aconteceu com a maioria das habilitações oferecidas pelo DLO, excluindo dessas línguas os estudantes que trabalham durante o dia e estudam durante a noite”. Como agravante, há previsão de 10 aposentadorias no DLM nos próximos três anos.

Ainda de acordo com o dossiê do CAELL, a situação chegou, no ano de 2023, “a um patamar nunca antes visto no departamento: a quantidade de docentes da área do Espanhol não foi suficiente sequer para garantir o oferecimento de todas as matérias obrigatórias, deixando cerca de 60 estudantes sem aulas da disciplina de Língua Espanhola III no período ideal”. A CCD teria agido com descaso, deixando de atender em tempo hábil a solicitação do DLM referente à contratação de um(a) docente temporário(a) e assim garantir o oferecimento da disciplina.

Outro que sofre com a falta de docentes é o DLCV, “maior departamento da FFLCH”, responsável pelo oferecimento de inúmeras disciplinas obrigatórias de Português, Latim e Grego, além de disciplinas do ciclo básico. “Abarca inúmeras áreas distintas e apresenta uma situação de sobrecarga tremenda, com docentes tendo que aceitar dezenas e dezenas de requerimentos todos os semestres muito acima da capacidade ideal de uma sala de aula. Um exemplo de como a quantidade de docentes é insuficiente é o fato de que o próprio diretor da FFLCH está tendo que lecionar aulas no Ciclo Básico do curso”, registra o dossiê.

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Vanessa, Adrián e estudantes reúnem-se com coordenador do Gabinete

Embora a Reitoria tenha destinado 11 claros docentes para o DLCV, essa quantidade “é extremamente insuficiente”, aponta o estudo do CAELL. “Para recompor o patamar de 2014 levando-se em conta as aposentadorias previstas e para que estudantes de Latim e Grego tenham disciplinas de Metodologia do Ensino de Grego/Latim I e II, exigimos a contratação de mais 21 docentes além dos 11 já anunciados”. Além disso, restaram apenas cinco funcionários dos 10 que havia em 2014: “Exigimos a contratação de mais cinco funcionários para repor o quadro de funcionários do DLCV em 2014”.

“Desmonte do maior curso da USP é opção política”, adverte documento

O dossiê foi elaborado por deliberação de uma assembleia dos estudantes do curso de Letras realizada em 21/3/2023. “Seu intuito é sistematizar, documentar e expor o nível de desmonte do maior curso da Universidade de São Paulo”, desmonte esse que é “fruto da política de sucessivas reitorias e governos estaduais que atacaram a educação pública, precarizando o ensino e as condições de trabalho de docentes e funcionários”, caso da gestão M.A. Zago.

“Sua portaria GR 6.517 reafirma no artigo 3º que ao reitor compete, conforme o disposto na lei 14.782/2012, “criar os cargos docentes, por ocasião da vacância dos cargos hoje ocupados, desde que não tenham sido criados por lei anterior”. Portanto, conclui o dossiê, o reitor, a Alesp e o governo estadual têm a responsabilidade de garantir a reposição do quadro docente. “Não o fazem por opção política”, destaca.

“Este dossiê demonstra como o corpo docente foi reduzido drasticamente no nosso curso sem a devida reposição”, continua o CAELL na apresentação do documento, depois de lembrar que “dinheiro tem”, uma vez que a USP dispunha de nada menos do que R$ 5,7 bilhões em caixa no final de 2022. “Sabemos que o problema da falta de professores não afeta somente nosso curso e exigimos que a universidade garanta a imediata reposição do quadro docente geral de acordo com a necessidade de cada curso, ao invés de definir um número prévio de novos claros docentes extremamente insuficiente e rateá-los entre as unidades”.

O texto repudia, ainda, o formato de contratação por “mérito” em detrimento da reposição automática após aposentadoria ou desligamento. “Essa medida abre precedente para mais estrangulamento de cursos que não sejam de interesse político/econômico para o governo e introduz uma lógica de mercado na gestão da universidade. Todos os cursos da USP merecem docentes”.

EXPRESSO ADUSP


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