A Advocacia-Geral da União (AGU) enviou ao Supremo Tribunal Federal (STF), no último dia 28/6, um parecer no qual sustenta que o projeto que criou as “escolas cívico-militares” na rede estadual de São Paulo é inconstitucional.

O projeto foi aprovado por 54 votos favoráveis e 21 contrários na Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo (Alesp) no mês de maio. Durante a votação, estudantes secundaristas que protestavam contra a medida foram violentamente agredidos(as) pela Polícia Militar.

O texto da Lei Complementar (LC) 1.398/2024, que institui o Programa Escola Cívico-Militar, foi sancionado pelo governador Tarcísio de Freitas (Republicanos) em 27/5 e publicado no dia seguinte.

Poucos dias depois, em 31/5, o PSOL ingressou com Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) contra a lei. É no âmbito da tramitação dessa ADI (de nº 7.662) no Supremo Tribunal Federal (STF) que a AGU emitiu o parecer.

A AGU argumenta que os Estados não podem instituir um modelo educacional que não esteja previsto na Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB). Além disso, o órgão ressalta que a Constituição Federal não prevê que militares exerçam funções de ensino ou de apoio escolar.

Ao analisar a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional e a Lei que instituiu o Plano Nacional de Educação 2014-2024, constata-se a ausência de qualquer menção ou estratégia que inclua a polícia militar como participante dos esforços de política educacional na educação básica regular. Com efeito, o Congresso Nacional, ao debater e aprovar essas estruturas fundamentais da arquitetura normativa, não posicionou os policiais militares brasileiros como responsáveis ou corresponsáveis pela formulação, implementação ou execução de políticas públicas de educação básica”, diz o parecer (destaques no original).

Modelo foi implantado no Paraná na gestão de Renato Feder, hoje secretário de Tarcísio

“A alocação de militares da reserva para a execução de atividades relacionadas à educação básica fora do sistema de ensino militar formal, ainda que na condição de apoio ou monitoramento, não encontra respaldo nas normas fundamentais do sistema educacional brasileiro, nem previsão compatível com a finalidade constitucional dessas instituições”, prossegue a AGU.

“Portanto, resta demonstrada a inexistência de fundamento constitucional que permita a criação de escolas cívico-militares da forma como realizada pela legislação sob invectiva, haja vista que a Constituição Federal, mesmo considerando as características do modelo federativo, não outorga aos estados federados a competência legislativa para instituir um modelo educacional distinto daquele delineado pela Lei nº 9.394/1996. Em suma, verifica-se uma flagrante infração às normas promulgadas pela União, no exercício de sua competência constitucional privativa para legislar sobre ‘diretrizes e bases da educação nacional’, conforme previsto no artigo 22, XXIV da Constituição Federal”, afirma o parecer. “Por todo o exposto, conclui-se pela inconstitucionalidade formal da legislação impugnada na presente ação direta.”

O relator do caso no STF é o ministro Gilmar Mendes. Uma decisão da Corte pela inconstitucionalidade terá efeito sobre modelos semelhantes que vêm adotados em outros Estados, especialmente comandados por governos alinhados à extrema-direita.

O Supremo está julgando ainda o caso do Paraná por meio da ADI 6.791, ação movida pelo PT, PSOL e PCdoB. Em abril, a AGU também se manifestou pela inconstitucionalidade do Programa Colégios Cívico-Militares, implementado pela gestão de Ratinho Júnior (PSD) em 2020.

Não por acaso, o secretário da Educação do Paraná na época era Renato Feder, convidado por Tarcísio para assumir a pasta da Educação em São Paulo a partir de 2023.

Militarização não traz nada de positivo às escolas, avaliam docentes da USP

Docentes da USP ouvidos pelo Informativo Adusp Online fizeram várias críticas ao programa. “Se militarização tivesse alguma coisa interessante, as escolas nos países ricos, da elite, das classes dominantes, seriam militarizadas. Mas isso, evidentemente, não ocorre; militarizar é uma proposta dirigida apenas às escolas dos pobres”, avalia Otaviano Helene, docente sênior do Instituto de Física (IF).

“Evidentemente, militarizar não é algo que possa ter alguma coisa de positivo. As elites, as classes dominantes, sabem disso: suas escolas continuarão cuidando das coisas que contribuem para o desenvolvimento das crianças e adolescentes, para a formação profissional, para a cultura, para as artes, para as ciências”, prossegue.

Já o professor Fernando Cássio, da Faculdade de Educação (FE), ressalta que o projeto não tem motivação educacional. “Tem motivações ideológicas, motivações de deputados estaduais e federais, querendo fazer proselitismo eleitoral com seus acólitos em determinadas regiões do Estado, em determinados bairros”, afirma.

O Sindicato Nacional dos Docentes das Instituições de Ensino Superior (Andes-SN) se manifestou por meio de notas políticas contra a repressão ocorrida no dia da votação do projeto na Alesp e a regulamentação das escolas cívico-militares em São Paulo.

Em nota publicada no dia 25/6, o Andes-SN criticou a Resolução Conjunta das secretarias de Educação e de Segurança Pública do Estado que regulamentou o programa e impõe a participação de “monitores” para ministrar disciplina denominada “Projeto Valores”.

“Trata-se de mais um inaceitável ataque à educação pública e aos princípios da ciência e do conhecimento para a emancipação que a devem reger, em benefício de uma perspectiva de avanço da militarização e da doutrinação nas escolas públicas”, diz a nota.

Com informações do Andes-SN.

EXPRESSO ADUSP


    Se preferir, receba nosso Expresso pelo canal de whatsapp clicando aqui

    Fortaleça o seu sindicato. Preencha uma ficha de filiação, aqui!