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Integrantes do Movimento SOS Instituto Butantan voltaram a questionar vereadores(as) no dia 12

O Colégio de Líderes da Câmara Municipal de São Paulo decidiu nesta terça-feira (12 de agosto) que a segunda votação em plenário do Projeto de Lei (PL) 691/2025, que autoriza uma série de intervenções deletérias na área do Instituto Butantan, não acontecerá nesta semana, conforme estava previsto.

A decisão foi tomada após a realização da segunda audiência pública sobre o PL, realizada na Câmara na manhã da terça-feira, e foi saudada pelo Movimento SOS Instituto Butantan, que se opõe ao desmatamento e à construção de fábricas de vacinas na área e defende mais tempo de debate antes da votação final do projeto.

No entanto, outra reivindicação feita pelo movimento na audiência, e endossada pelo vereador Nabil Bonduki (PT), docente da Faculdade de Arquitetura, Urbanismo e Design (FAU) da USP, não deve ser acatada, por conta de determinação do vereador Rubinho Nunes (União Brasil).

A proposta era de que a Comissão de Política Urbana, Metropolitana e Meio Ambiente da Câmara, presidida por Nunes, discutisse o agendamento de uma terceira audiência pública sobre o projeto, a ser realizada no bairro do Butantã e no final de semana, propiciando a participação de mais moradores(as). Porém, o vereador cancelou a reunião semanal da comissão, que ocorre todas as quartas-feiras. A manobra impediu que a comissão deliberasse sobre o tema na reunião que ocorreria no dia 13 e praticamente anulou a chance de que o pleito do movimento seja atendido.

O líder do governo, Fabio Riva (MDB), rechaçou a sugestão de realização de nova discussão do projeto e disse que a segunda audiência era a “derradeira”. A vereadora Silvia da Bancada Feminista (PSOL) lembrou que o regimento da Casa prevê no mínimo duas audiências, mas nada impede que outras sejam convocadas, inclusive no próprio território, como reivindicou o movimento — que “tem toda a legitimidade para fazê-lo”, afirmou a vereadora.

A aprovação do PL 691 chancelaria a expansão do Butantan, que planeja construir fábricas de vacinas em sua área, tombada desde 1981 pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do Estado de São Paulo (Condephaat) e inserida numa região densamente povoada.

A realização das audiências é necessária para que o projeto possa ir ao segundo turno de votação. No primeiro turno, realizado no final de junho, antes do recesso parlamentar, o PL foi aprovado por 33 votos favoráveis, seis contrários e oito abstenções.

Novo texto apresentado à Câmara desmente Esper Kallás, diretor do Butantan

Na primeira audiência, realizada no dia 5 de agosto, os representantes do Butantan disseram que havia sido elaborado um substitutivo ao projeto, resultante de colaboração do instituto com a liderança do Executivo na Câmara. As informações a respeito, no entanto, foram repassadas de forma sucinta e superficial, apenas com alguns slides contendo mapas. O texto do substitutivo não foi apresentado.

De acordo com o Butantan, a área das intervenções no novo projeto incluiria somente o atual parque fabril e os terrenos onde já há construções, excluindo os locais de alta densidade arbórea que constavam da proposta anterior. Dessa forma, não haveria mais a necessidade da supressão de cerca de 6,6 mil árvores no terreno, como propunha o texto original. Pela nova proposta, o desmatamento atingiria “apenas” 1,5 mil árvores.

“A gente, com isso, apresenta a proposta para ter esse projeto de lei e ajudar a consolidar a capacidade do Butantan de produzir vacinas, produzir imunobiológicos e ajudar a combater problemas de saúde da população brasileira”, disse na audiência o diretor do instituto, Esper Kallás, docente da Faculdade de Medicina da USP.

O suposto “recuo” do Butantan foi saudado em reportagens publicadas por meios jornalísticos como o G1 e o UOL.

Ao contrário do que disse Kallás, porém, o texto do substitutivo, que foi apresentado no final da tarde da última sexta-feira (8 de agosto) e publicado no Diário Oficial da Cidade nesta segunda (11), prevê intervenções ainda mais radicais do que a versão original do PL 691.

Kallás, por sinal, não compareceu à segunda audiência, na qual a única fala em nome do Butantan coube ao analista ambiental Renan Rodrigues da Costa, que não é funcionário de carreira do instituto, mas sim contratado pela Fundação Butantan, entidade privada dita “de apoio” que na prática tem ditado os rumos da instituição pública. Costa limitou-se a apresentar um “projeto de readequação ecológica” para manejo arbóreo e substituição gradual das árvores exóticas ou invasoras por espécies nativas,

O substitutivo apresentado pelo governo foi alvo de duras críticas dos(as) vereadores(as) presentes e dos(as) representantes do SOS Instituto Butantan. “A minuta não é mais restritiva, não traz mais instrumentos de proteção à área, mas sim é muito mais permissiva, especialmente quanto ao zoneamento”, declarou na audiência do dia 12 a vereadora Renata Falzoni (PSB).

“A proposta de substitutivo apresentada sexta-feira pelo governo não garante nada do que foi conversado na semana passada”, afirmou Nabil Bonduki. “O substitutivo faz uma coisa correta, que é estabelecer o uso do solo para o conjunto da área, mas para nossa surpresa, ao contrário do que o Esper apresentou na semana passada, comprometeria toda a área do Butantan com uso industrial categoria Ind-2, uma categoria de uso de indústria de alto impacto”. Além disso, caso aprovado, permitirá que “50% da área do Butantan, que é de 750 mil metros quadrados”, seja utilizada para novas intervenções.

Diretor do instituto não comparece à audiência pública, e vereadora critica

As bancadas do PT, PSB e Rede apresentaram uma proposta alternativa de substitutivo que limita, nas áreas em que já existem instalações fabris em operação no instituto (cerca de 150 mil metros quadrados), a verticalização prevista pelo PL 691, e desejada pelo Butantan — a construção de prédios de até 48 metros de gabarito, o equivalente a 16 andares.

O substitutivo alternativo cria quatro perímetros. O maior deles teria 470 mil metros quadrados e seria destinado à preservação e à recuperação ambiental, bem como ao lazer e fruição cultural. Dentro da área industrial haveria ainda “uma espécie de corredor verde” entre essa região e o câmpus da USP, explicou Bonduki.

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Vereadores(as) da oposição defendem mudanças no substitutivo apresentado pelo Executivo

De acordo com o vereador, a proposta protegeria por volta de 80% da área do Butantan dos efeitos do aumento de gabarito. “É uma contribuição para que a gente possa superar essa questão com um consenso que garanta a necessidade de produção de vacina no essencial, mas garanta o direito da vizinhança e a proteção ambiental”, argumentou.

Apelos à liderança da bancada de apoio ao prefeito Ricardo Nunes (MDB) foram feitos por outros(as) vereadores(as), que defenderam a necessidade de negociar para melhorar o projeto e atender as reivindicações da população. “Que o governo tenha sensibilidade para a gente construir essa proposta da melhor maneira possível”, solicitou Luna Zarattini, líder da bancada do PT.

“O substitutivo piora a proposta, e isso é muito assustador porque também diz sobre a confiança que a população pode ter nas instituições”, disse Marina Bragante (Rede).

“A fala do povo é contra o projeto, e o governo precisa ouvir o povo”, afirmou Silva da Bancada Feminista. “Não se pode ficar mudando a lei de zoneamento a bel prazer. A cidade tem zonas industriais, e também há zonas industriais próximas, na Raposo Tavares, com terrenos disponíveis.”

A vereadora Luana Alves (PSOL) chamou a atenção para a ausência de Kallás na segunda audiência pública. “A gente fez uma série de perguntas, e ninguém respondeu até agora. Qual seria o custo de fazer a produção nas propriedades do Instituto Butantan, como a fazenda em Araçariguama, a menos de 60 quilômetros?”, questionou. Aqueles(as) que votarem a favor do projeto “têm que saber que estão sacrificando os interesses da população”, prosseguiu.

Douglas Ferreira/Rede CâmaraDouglas Ferreira/Rede Câmara
Esper Kallás, na audiência do dia 5: discurso contestado pelo novo texto do PL 691

A vereadora também criticou a postura subserviente da gestão do prefeito Nunes em relação ao governo de Tarcísio de Freitas (Republicanos)-Felicio Ramuth (PSD). Na segunda-feira (11), Nunes e Tarcísio se reuniram num almoço com vereadores(as) da base governista na Câmara. No cardápio, entre outros temas, estava a defesa da construção das fábricas na área do Instituto Butantan e da aprovação do PL 691.

Produção de vacinas pode ocorrer sem abate de árvores, diz SOS Butantan

As manifestações dos(as) representantes do Movimento SOS Instituto Butantan e da comunidade foram contundentes e reforçaram a postura de defesa do investimento na produção de vacinas, porém “em local adequado e de forma sustentável”, como ressaltou Patrícia Coelho, moradora da região do Butantã. “O apelo legítimo da importância das vacinas não pode ser usado como justificativa para atropelar direitos fundamentais”, afirmou.

Lucas Randolli, representante discente da pós-graduação no Conselho Gestor do Câmpus do Butantã, afirmou que “transformar uma área de preservação tombada numa zona industrial movida a energia termelétrica é um absurdo”. O estudante do Instituto de Química (IQ) da USP classificou a postura da instituição de anunciar um projeto e apresentar outro como “praticamente um estelionato com a população e com a imprensa que dialogou com o Butantan”.

Randolli alertou ainda para o fato de que um acidente numa planta industrial como essa numa zona densamente habitada “apresenta sim um risco à saúde pública” e que “é evidente que ao longo das próximas décadas a vegetação vai acabar sendo suprimida”.

Vanderlei da Cruz questionou: “Onde estão os alvarás de funcionamento das instalações, que procuramos em todos os canais e não localizamos?”

Marisa Batista Reis disse que o Plano Diretor de Desenvolvimento Integrado (PDDI) do Butantan, que fundamenta todas as intervenções na área do instituto, “já nasceu irregular, e o dossiê produzido pelo movimento mostra isso”.

reprodução de rede socialreprodução de rede social
Ao lado de Kallás, Tarcísio fala a vereadores(as) em encontro sobre o PL 691 no Palácio dos Bandeirantes no dia 11/8

Ernesto Maeda, integrante do movimento e do Conselho Municipal do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável (Cades) do Butantã, salientou que o comportamento da direção do instituto, ao dizer uma coisa na primeira audiência e apresentar outra depois, foi “desrespeitoso com a comunidade”.

“Nós estamos atentos e vamos lembrar nas próximas eleições o voto de cada vereador e cada vereadora”, disse. “Nós vamos fazer barulho, vamos denunciar.”

O líder da bancada de Nunes, Fabio Riva, não gostou da fala e rebateu Maeda a seguir. “Cada vereador tem a sua consciência de votar de acordo com aquilo que lhe convém. Aqui não é local de ameaça a qualquer um dos vereadores”, disse.

Mais tarde, em sua intervenção, a vereadora Luana Alves enfatizou que divulgar os votos de cada parlamentar “não é uma ameaça, isso está no site da Câmara, é uma informação pública, e as pessoas vão saber”.

A professora Shirley Schreier, docente sênior do IQ e vizinha do instituto, também se manifestou, de forma remota, na audiência. “Infelizmente sabemos que as fundações são frequentemente problemáticas. Essa fundação está destruindo toda a história do Butantan”, afirmou, referindo-se à entidade privada que praticamente “engoliu” o instituto público.

“Além disso, está destruindo o futuro. Os vereadores e governantes têm família, têm filhos e netos, e só quero saber que mundo eles querem deixar para os seus descendentes. Um mundo onde dá para sobreviver ou não dá para sobreviver?”, concluiu a professora.

No final da sessão, Riva deixou claro que a bancada do governo quer a aprovação do projeto, levando em conta “o interesse do instituto, que é essa ampliação, que é aquilo que o doutor Esper falou aqui na última audiência pública”. O vereador deixou aberta a possibilidade de que haja o “aprimoramento” de uma proposta a ser levada ao plenário para segunda votação — o que, tudo indica, deve acontecer já na próxima semana.

EXPRESSO ADUSP


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