A investigação das ilegalidades praticadas pela Finatec, uma entidade privada dita “de apoio” à Universidade de Brasília (UnB), é conduzida pelo promotor de justiça Ricardo Antônio Souza, da Promotoria de Tutela das Fundações e Entidades de Interesse Social do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios, que obteve na justiça a destituição dos seus cinco diretores, todos professores da UnB.

Reproduzimos nesta edição parte de entrevista concedida à jornalista Elizângela Araújo, do Andes-SN, em que Souza comenta em detalhes as práticas ilícitas da Finatec. Ele informa que a Receita Federal autuou a fundação em R$ 30 milhões em 2002.

A atitude firme do promotor do DF em defesa do patrimônio público, que tem recebido apoio de seus colegas, contrasta com a do promotor de fundações de São Paulo (capital), Airton Grazzioli. Este último sustenta o conceito de “administração pública gerencial”, combate todo e qualquer questionamento à atuação das entidades privadas ditas de apoio, e chegou a afirmar, demonstrando total desconhecimento da realidade, que as fundações “injetam mais recursos [na USP] do que o próprio Estado” (!).

A seguir, as declarações do promotor do Distrito Federal:

O que mais chamou a atenção do Ministério Público na investigação das contas da Finatec?

O que mais me impressiona é a forma de atuação com dispensa de licitação em todos os cantos do Brasil, desde consultoria administrativa até subcontratação de empresas privadas.A prestação de serviços por essas empresas deveria ser contratada mediante licitação, ou seja, há uma violação à garantia que a licitação oferece ao dinheiro público. E esses contratos sempre são feitos com sobrepreço. Há um superfaturamento explícito. Depois, surgiu dinheiro ocultado em contas de convênios, de um contrato com “sobra”, como eles chamam, que seria destinado à construção de um shopping center em Águas Claras [bairro de Brasília]. O que isso tem a ver com pesquisa? Há também os contratos de consultoria com várias prefeituras — São Paulo (SP), Vitória (ES), Recife (PE), Teresina (PI), Nova Iguaçu (RJ) — com subcontratação de outra empresa, a Intercorp. (…) Apareceram muitos elementos que demonstram como essas pessoas lidam com o dinheiro da Finatec. Todos os diretores da fundação conseguem bolsas de pesquisa. O laboratório de cada um deles é agraciado com uma bolsa e isso não foi registrado em ata com o intuito de esconder do Ministério Público. Então, o diretor pega o dinheiro que deveria ir para a pesquisa e sai por aí gastando em restaurantes, bares e viagens. Um deles gostava muito de viajar com a esposa com o dinheiro da fundação. Além disso, a Finatec também deixou de atingir sua finalidade, que é fomento e apoio à transferência de tecnologia e de pesquisa e pós-graduação. Isso é mais do que suficiente para o afastamento de todos os dirigentes.

Isso acontece todos os dias em grande parte das universidades públicas brasileiras, não só nas federais. Por que essas fundações continuam agindo sem freios?

Primeiro, cabe ao Ministério Público investigá-las. A responsabilidade é nossa. E temos investigado e denunciado. No caso da UnB, ou eu saio daqui, ou eles saem de lá. Não tem opção. Ou eles vão acabar com a inamovibilidade do promotor ou eles vão sair de lá, porque continuar fazendo isso com o dinheiro público, contrariando os interesses da universidade, não dá para permitir. E isso serve de exemplo para todas as fundações de apoio [na UnB], pois parece que todas elas estão agindo da mesma forma. (…)

Essas fundações que atuam na UnB já foram denunciadas pelo Ministério Público à justiça, no entanto, continuam agindo ilegalmente…

Isso vai de promotor para promotor. No entanto, essa questão precisa da conscientização dos docentes, dos alunos, das pessoas que realmente necessitam de uma bolsa de pesquisa. Tem muito mestrando na UnB que precisa de uma bolsa de estudos e não consegue, no entanto, os dirigentes da Finatec tinham suas bolsas para pagar até cerveja, e um deles ainda agraciou dois membros de sua banca examinadora com bolsas. Uma universidade pública tem que ser mantida com dinheiro público, e não com dinheiro privado! (…)

Quanto essas fundações têm movimentado nos últimos anos?

Cerca de R$ 100 milhões.

E quanto é destinado à pesquisa?

R$ 750 mil.

Para onde vai o restante?

O restante vai para o caixa da Finatec. Eles não gastam o dinheiro, não dão bolsas. É uma fundação que não quer gastar dinheiro próprio. A Finatec, hoje, é uma empresa que tem uma folha e um gasto na ordem de R$ 5 milhões, mas nos seus editais de fomento gasta R$ 750 mil. Então, são R$ 5 milhões para pagar faxina, segurança, empregados para receber e pagar (a especialidade dela é receber e pagar). E estão deixando esse dinheiro lá para, por exemplo, construir um shopping center, investir em construção civil. A Receita Federal já a autuou em R$ 30 milhões de reais em 2002, e cada ano de atividade gera um passivo tributário de R$ 30 milhões, que eles não pagam.

 

Matéria publicada no Informativo nº 252

EXPRESSO ADUSP


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