Levantamento da Adusp, ainda não concluído, revela que 100 dos 166 pós-doutorandos contratados por intermédio do chamado Programa de Atração e Retenção de Talentos (PART) já têm experiência anterior como docentes em instituições de ensino superior, em alguns casos até mesmo no exterior. Deverão ser contratados, no total, 220 pesquisadores, possuidores ou não de bolsas de pós-doutorado. Robusto, o dado refuta alegações apresentadas pelo pró-reitor de Pesquisa, Sylvio Accioly Canuto, para justificar o PART: de que o programa possui “caráter de formação acadêmica” e de que, graças à “experiência de atuar em sala de aula”, os pós-doutorandos deverão adquirir “uma formação complementar”.
Informações públicas do Currículo Lattes dos pós-docs recém contratados revelam que a maior parte deles leciona, ou lecionou por um ano ou mais, seja em instituições privadas, seja em instituições públicas de ensino superior, no Brasil ou fora do país. Um deles atuou como professor visitante na instituição Delft University of Technology (TU Delft), da Holanda. Outro foi professor-pesquisador visitante da Universidade de Barcelona (UB).
Há também quem seja ou tenha sido docente temporário da própria USP. Um dos contratados/as, por exemplo, é professor colaborador de uma unidade da USP com carga horária de 8 horas e responsável por uma disciplina desde 2018. Há pelo menos um caso similar. Os nomes e unidades do(a)s docentes são preservados, nesta matéria, para que ninguém seja alvo de eventuais constrangimentos.
Caso interessante é de um pós-doc que desde 2008 é docente num centro universitário privado onde já exerceu os cargos de coordenador da Comissão Própria de Avaliação e coordenador do Programa de Iniciação Científica. Além disso, atua na educação básica há mais de vinte anos e desde 2015 é diretor de um colégio. Outro exemplo digno de nota é o de pós-doc que leciona desde 2013 em um programa privado de mestrado, no qual atualmente exerce a coordenação adjunta.
São exemplos contundentes, que derrubam a alegação de que o programa presta-se a garantir experiência docente aos pós-docs. A fragilidade de conjunto do PART tornou-se evidente já na liminar que suspendeu o processo de contratações, concedida pela juíza Simone Gomes Rodrigues Casoretti, da 9ª Vara da Fazenda Pública, que em janeiro deste ano acatou a medida proposta pela Adusp em ação civil pública. Além disso, chegou à Adusp relato de que mais tarde, quando derrubada a liminar pelo Tribunal de Justiça (TJ-SP), a Pró-Reitoria de Pesquisa (PRP) operou de modo a acelerar as contratações, entrando em contato direto com direções de unidades e chefes de recursos humanos, o que leva a crer que muitas dessas contratações precárias tenham sido realizadas sem os devidos cuidados.
Divulgado no final de junho de 2019 (Resolução 7.754), o PART sequer foi discutido pelo Conselho de Pesquisa. Os membros do Conselho de Pesquisa só tiveram notícia da criação do programa na reunião de agosto, sendo que dois dias depois foi publicado o edital, sem nenhuma transparência. Desde logo a Adusp se opôs ao programa, apontando seu caráter de precarização da carreira docente.
O levantamento baseado nos currículos dos pesquisadores contratados desmente com facilidade outra narrativa com que a Reitoria busca defender o programa, que é de “valorização” dos pós-docs: o que se constata, na realidade, é que se trata de jovens pós-doutoras e pós-doutores em geral bastante qualificados, que apesar disso receberão salário mensal de R$ 1.279,15 — irrisório e indigno da sua capacidade e dedicação.

EXPRESSO ADUSP


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