Após sofrer assédio na EEFE, professor Bruno Gualano finalmente consegue transferência para a Faculdade de Medicina

O reitor Vahan Agopyan assinou, em 16/5/2018, portaria que efetivou a transferência do professor associado Bruno Gualano, do Departamento de Biodinâmica do Movimento do Corpo Humano da Escola de Educação Física e Esporte (EEFE) para o Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina (FM). Gualano faz pesquisas em colaboração com a FM desde 2010. A transferência fora solicitada em fevereiro de 2017, em razão do assédio moral que o docente vinha sofrendo na EEFE.

Daniel Garcia
Professor Bruno Gualano

Embora contasse com a concordância da FM, o pedido de Gualano foi rejeitado tanto por seu departamento de origem quanto pela Congregação da EEFE. Ele apresentou, então, um recurso ao Conselho Universitário (Co), que foi a voto em novembro de 2017, dividindo o plenário. Houve empate (40 x 40) e coube ao reitor M.A. Zago decidir. Ele votou contrariamente ao recurso, mas ao mesmo tempo assumiu o compromisso de trabalhar pela transferência do docente, em conjunto com o vice-reitor (e reitor eleito) Agopyan.

Relatório final da Comissão Sindicante instaurada pela Portaria 22/2017 da diretoria da EFEE, com a finalidade de investigar o caso de assédio moral na unidade, encontrou indícios de graves irregularidades no comportamento adotado pelo professor titular Antonio Herbert Lancha Jr. contra os docentes Bruno Gualano e Guilherme Artioli. Presidida pela professora Marina Helena Cury Gallottinni, da Faculdade de Odontologia (FO), a comissão sugeriu a imediata instauração de um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) contra Lancha, que ainda não foi concluído e permanece em sigilo.

O assédio moral, segundo o depoimento de Gualano à Comissão Sindicante, teve início em 2015, depois que ele denunciou atos de improbidade administrativa de Lancha Jr. à Promotoria de Justiça do Patrimônio Público e Social da Capital, do Ministério Público do Estado (MPE-SP), e à Ouvidoria da USP. A principal denúncia dizia respeito ao uso privado, por parte de professor titular e de terceiros, de um aparelho “Bod Pod”, adquirido pela Fundação de Apoio à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) e pertencente à EEFE, mas instalado numa clínica particular, o Instituto Vita, do qual Lancha Jr. era sócio.

Consequentemente, o MPE-SP ajuizou ação contra Lancha Jr., sua empresa Quality of Life e o Instituto Vita, por improbidade administrativa e enriquecimento ilícito. Assim, o professor titular tornou-se réu na 15ª Vara da Fazenda Pública. Por outro lado, por sugestão da Ouvidoria da USP, a diretoria da EEFE, por meio da Portaria 8/2016, abriu uma sindicância para apurar diferentes denúncias contra ele, mas a Comissão Sindicante optou por investigar exclusivamente a questão do equipamento “Bod Pod”. E concluiu pela existência de “elementos suficientes para justificar um processo disciplinar que aprofunde, com todas as garantias do devido processo legal, a apuração da possível prática de ato ilícito por parte do Prof. Dr. Lancha Junior, envolvendo o uso remunerado para fins privados do BodPod” (confira aqui o relatório).

Pedidos rejeitados no Departamento, na Congregação e no Co

Em 9/2/2017, o Conselho do Departamento de Biodinâmica do Movimento do Corpo Humano rejeitou o pedido de Gualano de transferência definitiva para a FM, onde desde 2010 vinha colaborando em pesquisas desenvolvidas pela professora Eloisa Bonfá no Laboratório de Investigação em Reumatologia (conhecido como LIM-17). Um pedido anterior, de “vinculação subsidiária” à FM, já fora negado pelo Conselho Departamental em 6/9/2016. Embora sem votar, o professor Lancha Jr. participou dessas reuniões do Conselho Departamental (do qual é suplente de chefia) e exerceu influência, manifestando-se contrariamente à transferência, conforme relatado na ata.

Gualano, então, recorreu à Congregação da EEFE contra a decisão departamental, mas teve seu recurso rejeitado em 6/4/2017. Depois, recorreu à própria Congregação, buscando que esta reconsiderasse sua decisão. Em 9/6/2017, esse colegiado rejeitou o novo recurso, impedindo a transferência. A chefe do departamento sustentou na Congregação que “a transfe­rência sem permuta implica a perda de um docente”, e ao responder à pergunta de um dos membros do colegiado sobre “qual fato novo foi apresentado no pedido do interessado”, afirmou que “não foi apresentado fato novo”. O recurso foi rejeitado por 18 votos, com uma abstenção, sem que a Congregação tivesse sequer procedido à leitura e discussão do recurso apresentado por Gualano. Portanto, não houve oportunidade de contraditório em relação à manifestação da chefe do departamento de que não havia “fato novo” no recurso.

Após estas sucessivas negativas, só restava a Gualano recorrer ao Co, que colocou em votação seu pedido na reunião de 21/11/2017, resultando no surpreendente empate de 40 votos a 40, com sete abstenções. No seu voto de minerva, o então reitor M. A. Zago endossou o parecer da Comissão de Legislação e Recursos, contrário ao pedido de Gualano. Entretanto, sensibilizado pelas diversas e contundentes intervenções de conselheiros em apoio a Gualano, e pelo empate que representou uma vitória simbólica do docente, Zago afirmou na ocasião que iria “juntamente com o futuro reitor, me comprometer a buscar uma solução do caso para a pessoa do professor Bruno”.

Em mensagem de agradecimento enviada a colegas, alunos e à equipe da Adusp (“pelo irrestrito apoio ao longo do processo”), Gualano menciona “a metade do Co que, corajosamente, votou contra o assédio moral na Universidade”. “Sinto-me bastante aliviado em poder retomar minhas funções acadêmicas plenamente na Universidade, e isso só se fez possível graças ao apoio de muitos”, escreveu. “Neste ano, completei 15 anos na EEFE, onde me formei, construí minha breve carreira e conquistei amizades que carregarei para a vida. Pela EEFE, portanto, prefiro nutrir gratidão a qualquer tipo de ressentimento. Que este ciclo que se inicia venha com novos desafios e trabalho árduo, mas também com a harmonia e serenidade de que todo docente necessita para desempenhar bem suas funções”, concluiu o professor.

“Foi uma vitória graças à postura altiva do professor Bruno Gualano, que veio a público expor a verdadeira situação absolutamente incompatível com a ética e as normas mais básicas do serviço público, que foram contrariadas de forma sistemática na EEFE”, avalia o professor Ciro Correia, que faz parte do Departamento Jurídico da Adusp. “Se ele não fizesse isso, não contaria com o respaldo de todo um setor da universidade que o apoiou votando a favor do recurso que solicitava sua transferência para a Faculdade de Medicina, no Co. A expressiva votação a seu favor resultou num empate, decidido contra ele com o voto de minerva do então reitor M.A. Zago. Esse resultado, que dividiu o Co, acabou forçando a Reitoria a buscar uma solução”.

“A transferência foi o mínimo que poderia acontecer para não prejudicar uma carreira dedicada e brilhante. Situações como esta, de perseguições e assédio moral contra docentes por parte da oligarquia que se nega a democratizar a USP, infelizmente, parecem não ser tão raras na universidade”, afirmou o professor Correia. “Fica o registro deste evento como exemplo de que o enfrentamento é o caminho mais consequente nestes casos de assédio.A Adusp sempre esteve e permanecerá sempre acessível e disponível para lutar contra esse estado de coisas e dar suporte jurídico e político a todos os colegas que a procurem para tanto”.

EXPRESSO ADUSP


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