Conjuntura Política
Queda de Milton Ribeiro obriga Bolsonaro a nomear quarto ministro para o MEC, sem contar o “quase” Decotelli
30/03/2022 16h04
A renúncia do reverendo Milton Ribeiro, que deixou o cargo de ministro da Educação nesta segunda-feira (28/3) depois que veio à tona, dez dias antes, um esquema de troca de favores com pastores evangélicos, mediante o qual instituições religiosas beneficiavam-se de verbas do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), obrigou o presidente da República a nomear, nesta quarta-feira (30/3), o quarto ministro desta pasta na sua gestão: Victor Godoy Veiga, auditor fiscal de carreira e até então secretário-executivo do MEC.
Milton Ribeiro havia sido vice-reitor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, mesmo sem nunca haver exercido regularmente a docência. Seus predecessores no MEC, Ricardo Vélez Rodriguez e Abraham Weintraub, eram ambos docentes universitários, mas, como Ribeiro, não apresentavam reconhecidas credenciais acadêmicas. Weintraub era o mais próximo de Jair Bolsonaro e o único com assumida militância política na extrema-direita.
Todos os três, porém, envolveram-se em controvérsias públicas e graves erros administrativos ou políticos que os levaram a perder o cargo de ministro. Ainda mais bizarra foi a nomeação e renúncia antes da posse do suposto oficial naval Carlos Alberto Decotelli da Silva, aquele que “foi, sem nunca ter sido”, posto a pique depois que se tornaram conhecidas diversas fraudes no seu currículo Lattes.
O hoje ex-ministro Ribeiro era adepto de concepções que o professor Daniel Cara, da Faculdade de Educação da USP, designou como “calvinismo educacional”. Mas o que os jornais O Estado de S. Paulo e Folha de S. Paulo revelaram foi um grave esquema de corrupção instalado no próprio coração do MEC. O caso vinha sendo investigado pela Controladoria-Geral da União (CGU) desde agosto de 2021.
Em 18/3, o Estadão publicou a reportagem “Gabinete paralelo de pastores controla agenda e verba do Ministério da Educação”, segundo a qual os pastores Gilmar Santos e Arilton Moura intermediavam ilegalmente o repasse de verbas federais para prefeituras. De acordo com o jornal, Gilmar dos Santos é líder do Ministério Cristo para Todos, um dos ramos da Assembleia de Deus, e presidente da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros de Assembleias de Deus no Brasil Cristo para Todos. Arilton Moura, ex-presidente estadual do Podemos no Pará, seria o “braço direito” de Gilmar. Ambos são próximos de Jair Bolsonaro.
Áudio comprometedor e depoimentos de prefeitos agravaram a situação de Ribeiro
No dia 21/3, a Folha publicou a reportagem “Ministro da Educação diz priorizar amigos de pastor a pedido de Bolsonaro; ouça áudio”, que traz gravação na qual o então ministro Ribeiro declara que sua “prioridade é atender a todos que são amigos do pastor Gilmar” e que tal conduta decorre de “um pedido especial que o presidente da República fez p’ra mim sobre a questão do Gilmar […] é apoio sobre construção das igrejas”.
A ministra Carmen Lúcia, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou a Polícia Federal a avançar nas investigações do caso. “Pelo menos dez prefeitos atestam que pastores atuaram na intermediação de recursos ou no acesso direto ao ministro da Educação, Milton Ribeiro. Desse grupo, três já admitiram que ouviram pedido de propina em troca da liberação de verbas federais para escolas. Eles serão intimados a prestar depoimento à Polícia Federal”, noticiou o Estadão em 25/3.
No dia 23/3, o Andes-Sindicato Nacional, a Fasubra e o Sinasefe divulgaram uma nota conjunta intitulada “O Bolsolão do MEC é criminoso! Exigimos demissão imediata do ministro da Educação, Milton Ribeiro!”. No entender das entidades, o esquema exposto pelos jornais é inadmissível e deve ser investigado imediatamente e com rigor. “Os recursos do fundo devem ser destinados para ações de reestruturação e modernização das instituições de ensino, para garantir assistência estudantil a estudantes de baixa renda, ampliar o número de escolas, investir em pesquisa e contratar professores, e não para beneficiar a construção das igrejas”, diz a nota.
Antes da nomeação de Veiga, circulava na mídia a informação de que o nome mais provável para assumir o MEC seria o de Anderson Ribeiro Correia, reitor do Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), que já havia sido cogitado para substituir Weintraub e, posteriormente, o “quase ministro” Decotelli. Correia é próximo dos militares e do atual governo federal e já presidiu a Coordenação de Aperfeiçoamento do Pessoal de Nível Superior (Capes), em 2019.
O novo ministro teria sido nomeado em caráter interino, mas o noticiário da mídia é contraditório a respeito. De qualquer modo, não há dúvidas quanto ao seu perfil: Veiga é estranho à área da educação e politicamente alinhado ao bolsonarismo.
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