A Pró-Reitoria de Graduação da USP (PRG) lançou, em 15/6, o edital 02/2020 do “Programa de Estímulo ao Ensino de Graduação-Monitoria” (PEEG), que visa “incentivar alunos com mérito acadêmico a  aperfeiçoarem seus estudos em uma disciplina de seu interesse, por meio do desenvolvimento de atividades supervisionadas de ensino”. O programa distribuirá 450 bolsas, no valor de quatro parcelas mensais de R$ 400, pagas de agosto a novembro de 2020.
 
De acordo com o programa, o aluno-monitor deverá ter cursado a própria disciplina ou equivalente. “A monitoria deverá ser desenvolvida necessariamente sob a supervisão do docente da disciplina. O programa atenderá a uma turma ou a um conjunto de turmas de uma mesma disciplina, que receberá o monitor”. Para realizar o plano de trabalho elaborado pelo docente responsável pela disciplina, o aluno-monitor deverá cumprir uma carga horária de 10 horas de atividade por semana.
 
Caberá às comissões de Graduação (CG) “receber e avaliar os projetos de cada disciplina” para proceder à distribuição de bolsas. Portanto, não basta a existência da disciplina como condição para pleitear uma bolsa: “Os docentes interessados em participar da Monitoria deverão inscrever um projeto vinculado a uma disciplina no Sistema Júpiterweb contendo introdução, objetivos e procedimentos metodológicos, além de uma justificativa que caracterize as atividades a serem realmente desenvolvidas pelo monitor”.
 
Segundo o edital, o número de bolsas destinado a cada unidade de ensino e pesquisa “será oficiado” pela PRG ao diretor da unidade e ao presidente da CG da unidade. Contudo, para fazer jus às bolsas, é preciso que a CG “tenha cumprido com o compromisso de entrega do relatório consolidado” referente ao edital anterior. “O número de bolsas é calculado de acordo com o número de matrículas em crédito-aula e o número de docentes ativos na Unidade”, informa o edital.
 
Os estudantes de graduação interessados em participar “deverão se inscrever no projeto da disciplina no sistema Júpiterweb e, em campo específico, inserir a carta de motivação para participação no projeto da disciplina”. Exige-se dos candidatos “bom rendimento escolar e destacado desempenho na disciplina escolhida para desenvolver as atividades de monitoria”.

Programa instaura competição entre docentes e os sobrecarrega

O edital do PEEG suscita questionamentos seja pelo baixo valor das bolsas, seja pelo reduzido número de bolsas, seja por suas imposições de teor burocrático, que parecem ignorar a situação criada pela Covid-19. Uma docente da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH), que prefere não se identificar, chama atenção para o fato de que o programa instaura uma competição entre pares, porque obviamente o número de monitores é muito menor que o de disciplinas.
 
“Se bem entendi, não há muita verba para esta ‘ajuda’ com monitores. Assim, teremos que sentar e fazer um projeto para explicar e justificar à PRG o porquê de necessitarmos de monitoria em tempos de pandemia, certo? Lá, eles não sabem!!!!!!!”, ironiza. “Assim, teremos que concorrer entre nós e legitimar esta decisão ‘seletiva’?”
 
Ainda na opinião da professora, as comissões organizadoras de cursos (COC) deveriam discutir a questão, uma vez que a Reitoria, ao invés de facilitar apoio aos docentes para que ofereçam as aulas remotas, os sobrecarrega ao exigir mais um projeto. “Será que a PRG não tem familiaridade com a dificuldade que temos em ministrar estas aulas? Fazer um projeto para isto é legitimar a falta de verbas e a sobrecarga de trabalho”.
 
Outra docente, do Instituto de Biociências (IB), se disse surpresa “com o mundo paralelo em que vivem os(as) administradores(as) da maior universidade brasileira”, ao constatar mais uma vez que “nesse momento tão aflitivo que o país vive a USP tente viver um clima de normalização, ou pior, de naturalização da situação”, ao lançar o edital do PEEG. “Se, por um lado fico feliz por saber que alunos(as)-monitores(as) podem contar com essa possibilidade de recurso, por outro fico surpresa ao constatar que o edital é exatamente idêntico aos anteriores (com exceção das datas), como se as disciplinas fossem acontecer normalmente ou naturalmente”.
 
As duas vezes em que a palavra online aparece no edital, prossegue a docente, são referentes apenas às inscrições dos projetos e dos alunos. “A palavra ‘remoto’ ou ‘remota’ não foi sequer mencionada, assim como as palavras ‘virtual’, ‘digital’ ou ‘distância’. Ou seja: no edital, não existe nenhuma adaptação ou consideração sobre o cenário de ensino remoto emergencial, ao qual estaremos submetidos no segundo semestre. Poderíamos pensar que isso deveria ficar a cargo dos projetos e não precisaria estar no edital. Sim, poderíamos, mas deveríamos? Deveríamos continuar aceitando essa naturalização, essa forma de agir como se muito pouco estivesse acontecendo do outro lado da raia olímpica ou para além do Butantã?”
 
A seu ver, ao menos uma revisão do texto do edital deveria ter sido feita, de modo a estimular, incentivar e apoiar as iniciativas mais adequadas ao ensino remoto. “Também deveriam estar no texto indicativos claros de que as comissões deveriam incluir, em seus critérios de seleção, a real possibilidade de adaptação das disciplinas a esse formato. Além disso, os projetos deveriam indicar claramente de que forma a monitoria será realizada nesse formato e garantir que os(as) monitores(as) não sejam sobrecarregados como aconteceu com muita frequência no primeiro semestre. E, por fim, exatamente o mesmo número de bolsas está sendo oferecido, ou seja: nesse momento que docentes precisam de muito mais apoio para suas disciplinas, tudo é tratado dentro da ‘normalidade’. Tudo isso parece bobagem? Pode ser, mas também pode ser que represente uma vez mais esse limiar entre o descuido e o descaso com o qual a nossa universidade está lidando com a Covid-19 e com o cenário político brasileiro, seja em aspectos burocráticos ou de humanidade”.
 
“Hoje esse programa de monitorias é precioso, porque os monitores ajudam a lidar com as novas tecnologias, que são necessárias no ensino remoto mas a maioria dos docentes não conhece. Além disso, é mais uma ponte no contato com os alunos”, diz o professor Rodrigo Ricupero, presidente da Adusp. “Então a Reitoria perdeu uma oportunidade de simplificar e de ampliar esse projeto, dada a situação da epidemia. O que não seria complicado, porque ele tem um custo muito baixo, além de ser uma ajuda à permanência estudantil. Hoje, da forma como está, ele vai atender somente a cerca de 10% das disciplinas, provavelmente as mais básicas”.
 
 
 
 
 

EXPRESSO ADUSP


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