Debate sobre sindicalismo no setor público
Debate
Antunes, Mazzei, Miraglia, Schuch e Zanetic

A organização sindical foi pauta do segundo evento de comemoração dos 30 anos da Adusp, um debate realizado em 29/11, na ECA, com o mote “A crise do trabalho, o funcionalismo público e seus sindicatos”. Foram convidados a compor a mesa os professores Luiz Henrique Schuch, da UFPel e secretário-geral do Andes-Sindicato Nacional; Arnaldo José França Mazzei Nogueira, da FEA-USP e da PUC-SP; Ricardo Antunes, da Unicamp; e João Zanetic, vice-presidente da Adusp.

Primeiro a falar, o professor Zanetic se propôs a compartilhar suas reminiscências com os presentes, buscando o que chamou de “memórias com características sindicais”. Recapitulou sua juventude, a experiência de filho de um operário têxtil que acompanhou de perto momentos cruciais da política brasileira, como a campanha “O petróleo é nosso!” e o suicídio de Vargas.

O professor procurou demonstrar, assim, a importância de vivências políticas anteriores para os estudantes que viriam a entrar na USP no início dos anos 1960, e ali travar lutas democráticas. Dessa década, sublinhou a importância da organização estudantil nas greves, com o exemplo do curso de auto-gestão ministrado por estudantes do Instituto de Física. Além de intensificar a presença na faculdade, a turma não perdeu o semestre. “A greve não atrapalha a qualidade de ensino desde que sejamos criativos”, reforçou Zanetic.

Por último, delineou os embates travados na universidade no fim da ditadura militar e no período de redemocratização, quando já era professor. Ele acredita que aquele período foi essencial para mostrar a necessidade de uma entidade de defesa dos direitos civis. “Foi quando se percebeu que o professor não era um príncipe, mas um trabalhador”, argumentou. O professor destacou a importância da constituição da Adusp e de sua articulação com as entidades das outras universidades estaduais paulistas, no Fórum das Seis, compondo um “pólo aglutinador da luta por melhores condições de vida e trabalho”.

Solidariedade

Luiz Henrique Schuch expôs a necessidade de se debater a organização sindical, tema que o professor considera extremamente atual, devido ao avanço das formas de precarização do trabalho, provocado pela ameaça do desemprego e pelas imbricações determinadas pelas distorções entre o que é público e o que é privado.

Para o professor, que é ex-reitor da UFPel, os movimentos sindicais da década de 1980, mais articulados devido à condição política da época, viriam a sofrer um grande impacto após as medidas econômicas implantadas no início da década de 1990.

“Em boa medida, hoje vivemos o resultado disso”, avaliou Schuch, que vê esse resultado materializado, por exemplo, nas políticas salariais baseadas em “reajuste zero”, nas gratificações de cunho produtivista, nas fundações “de apoio”, nos fundos setoriais. Se nas décadas anteriores a organização sindical contava com fundamentos de solidariedade, o período mais recente minou essas bases, fazendo “o que a ditadura não conseguiu fazer”. “Passou-se da solidariedade ao concorrencial”, acredita.

Schuch ponderou que a organização sindical não está em descenso, mas passando por uma crise. Para o secretário-geral do Andes-SN, a atuação nesse campo passa obrigatoriamente pela revisão do conceito de categoria, ou seja, pela formulação de uma “organização trabalhista que incorpore de fato a grande massa de trabalhadores”, e que atue “com a perspectiva de barrar a agenda de dominação capitalista”.

Fragmentação

“Estamos vivendo uma desfiguração por causa da fragmentação, da dificuldade de as pessoas conversarem”, afirmou Arnaldo Mazzei Nogueira. O professor teceu considerações sobre as especificidades da organização trabalhista nos setores público e privado. Recuperou, para isso, a experiência da Associação dos Professores da PUC-SP (Apropuc), da qual faz parte, e o exemplo da demissão em massa ocorrida neste ano naquela instituição privada de ensino. “A Apropuc também faz anos, mas não há o que comemorar”, lamenta.

O professor Mazzei criticou duramente a “política nada negociadora, com elementos autocráticos”, praticada pelo governo FHC na relação com o funcionalismo público. O enfrentamento com os petroleiros e as políticas de contenção salarial e demissões são exemplos do que qualificou como “dissonância do governo FHC para com os trabalhadores”. Porém, analisando as greves ocorridas no setor público durante o governo Lula, disse não notar mudança expressiva: “as relações com o governo Lula não se alteraram significativamente em relação ao governo anterior, apesar da adoção da mesa permanente de negociação”, mesa que é uma “ilusão”, segundo ele. “Não adianta ter mesas de negociação permanentes, se você não tem realizações efetivas nessas mesas”, avaliou.

Quanto à organização sindical, Nogueira atribui protagonismo ao setor público na superação da crise, que, “além de ser estrutural e objetiva, tem uma dimensão subjetiva política e cultural”. Uma das necessidades mais prementes seria, em sua opinião, reconectar as pontes com outros movimentos organizados. O professor questionou se a depuração do movimento do setor público “não estaria nos afastando do mundo do trabalho”. E concluiu: “É necessário repensar esta dinâmica e reconduzir as lideranças às bases, saber o que pensam”.

Socialismo é vital

Em sua intervenção, Ricardo Antunes optou por traçar um panorama das transições pelas quais passou o mundo do trabalho nas últimas décadas. Resgatou, assim, as perturbações causadas por determinados colapsos cíclicos do capitalismo, como em meados dos anos 70. Momentos que resultariam no avanço da terceirização e em diversas formas de ocultamento do trabalho precário.

Antunes chamou a atenção para o altíssimo índice de informalidade — cerca de 60% dos trabalhadores — e para o fato de esse grande número de pessoas se encontrar fora do alcance da organização sindical. Mesmo dentro das empresas, denunciou o professor da Unicamp, técnicas de “cooptação” são utilizadas para desmobilizar os trabalhadores. “Operário agora é ‘colaborador’ e recebe uma ‘cartilha de integração’”, exemplificou, complementando: “Essas ações têm um fundo profundamente ideológico”.

Ele criticou a divisão dos trabalhadores na universidade pública, causada pela terceirização. “É imperioso que os sindicatos sejam a ponte entre os estáveis e os terceirizados”, defendeu o professor, para quem a luta tem que ser “sindical, social e política”. Sem perder de vista a perspectiva de fundo: “O socialismo no século XXI é uma questão vital”.

 

Matéria publicada no Informativo nº 228

EXPRESSO ADUSP


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