Orçamento
“A secreta política de renúncia fiscal do governo é lesiva aos serviços públicos e à sociedade”, diz Fórum das Seis em carta aberta aos deputados estaduais: “Prejuízos somaram mais de R$ 24 bilhões em 2019”
Entre 2011 e 2019, período analisado em parecer do Ministério Público de Contas, a queda na arrecadação do Estado de São Paulo decorrente de benefícios fiscais concedidos a um seleto grupo de grandes empresas — cuja identidade o governo não revela nem mesmo para o TCE-SP — soma a impressionante cifra de R$ 149 bilhões
O Fórum das Seis encaminhou aos deputados e deputadas estaduais paulistas, em 16/7, uma carta aberta em que denuncia a “secreta política de renúncia fiscal” do governo estadual — que envolveu, considerando-se apenas o exercício passado, benefícios fiscais no montante de R$ 24,3 bilhões — e reivindica aos parlamentares que “rejeitem as contas do governo estadual relativas a 2019, de modo a exigir que o governador João Doria (PSDB) esclareça os questionamentos levantados, bem como cumpra as recomendações do TCE-SP no sentido de dar transparência à sociedade de sua nefasta política de renúncia fiscal”. O tema foi objeto de recente reportagem do Informativo Adusp.
“O Fórum das Seis — que representa as entidades sindicais e estudantis das universidades estaduais paulistas e do Centro Paula Souza — vem a público expor aos deputados e às deputadas estaduais de São Paulo uma questão que ronda o orçamento paulista há muitos anos: a política de renúncia fiscal adotada pelos sucessivos governos, envolta em sigilo já questionado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP), sem transparência, com evidente queda na arrecadação e sem quaisquer comprovações de benefícios à sociedade”, principia a carta.
Estes fatos, “denunciados há anos pelo Fórum das Seis”, foram detalhadamente descritos pelo Ministério Público de Contas (MPC) — que se apoiou também nas análises da Assessoria Técnico-Jurídica (ATJ) daquele tribunal — em parecer relativo às contas de 2019 do governador. “De acordo com o parecer emitido pelo MPC, somente em 2019 o erário paulista deixou de receber R$ 24,33 bilhões em impostos, como fruto da autorização legal para algumas empresas deixarem de recolher, parcial ou totalmente, os tributos”, lembra a carta aberta.
O documento destaca o enorme volume de recursos que o governo estadual deixou de arrecadar na década passada, em detrimento dos gastos sociais, ao beneficiar com a renúncia fiscal de ICMS e IPVA um seleto grupo de grandes empresas, cujos nomes são mantidos em segredo tanto para os contribuintes quanto para o próprio TCE-SP: “Entre 2011 e 2019, período analisado no parecer, a queda na arrecadação soma impressionante monta de R$ 149 bilhões. Neste interregno, o percentual de renúncia em relação ao orçamento total do estado, previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada ano, foi subindo cada vez mais, passando dos 7,8% em 2011 para 16% em 2019”.
No entender do Fórum das Seis, a eventual rejeição das contas de 2019 pela Assembleia Legislativa (Alesp) seria “a demonstração clara e efetiva da sensibilidade e da preocupação dos deputados e das deputadas desta casa com a manutenção e a qualidade dos serviços públicos prestados à população do Estado, para os quais a arrecadação de tributos é essencial”. Leia a seguir a íntegra da carta aberta.
Íntegra da carta aberta do Fórum das Seis aos(às) deputados(as) da Alesp
O Fórum das Seis – que representa as entidades sindicais e estudantis das universidades estaduais paulistas e do Centro Paula Souza – vem a público expor aos deputados e às deputadas estaduais de São Paulo uma questão que ronda o orçamento paulista há muitos anos: a política de renúncia fiscal adotada pelos sucessivos governos, envolta em sigilo já questionado pelo Tribunal de Contas do Estado (TCE-SP), sem transparência, com evidente queda na arrecadação e sem quaisquer comprovações de benefícios à sociedade.
Estes fatos, denunciados há anos pelo Fórum das Seis, foram apontados em detalhes pelo Ministério Público de Contas (MPC-SP) e pela Assessoria Técnico-Jurídica (ATJ) do TCE-SP. De acordo com o parecer emitido pelo MPC, somente em 2019 o erário paulista deixou de receber R$ 24,33 bilhões em impostos, como fruto da autorização legal para algumas empresas deixarem de recolher, parcial ou totalmente, os tributos. A renúncia fiscal ocupa as páginas 92 a 117 do parecer, que pode ser acessado em https://bit.ly/parecer-mp.
Entre 2011 e 2019, período analisado no parecer, a queda na arrecadação soma impressionante monta de R$ 149 bilhões. Neste interregno, o percentual de renúncia em relação ao orçamento total do estado, previsto na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de cada ano, foi subindo cada vez mais, passando dos 7,8% em 2011 para 16% em 2019. Para efeito de comparação sobre os danos causados à sociedade, o MPC e a ATJ apontam: “Em 2011, a estimativa de perdas com isenção de ICMS e IPVA (R$ 11,95 bilhões) correspondia a 47,5% dos gastos realizadas na função saúde pelo Estado (R$ 25,16 bilhões). Por sua vez, em 2019, as perdas estimadas com essas isenções (R$ 24,33 bilhões) já equivaliam a expressivos 89,8% das despesas voltadas à saúde (R$ 27,10 bilhões).”
O parecer classifica a renúncia fiscal, política mantida e ampliada pelo governo Doria, como “inadmissível”, com “retornos socioeconômicos duvidosos”, com “total falta de transparência, por prazo indeterminado e às custas do contribuinte”, que continua a prosperar “sob o pretexto de guerra fiscal com outros Estados”. O texto cita as recomendações emitidas pelo TCE-SP em 2017, ao governo estadual, apontando um descontrole dos benefícios fiscais concedidos a um grupo seleto e sigiloso de grupos empresariais. Na época, o TCE-SP expediu seis recomendações, entre elas a necessidade de ampla transparência dos grupos beneficiados e a comprovação dos benefícios gerados à sociedade pela renúncia.
O parecer do MPC aponta, no entanto, que “decorridos dois anos desde a emissão de recomendações por parte desse Tribunal, no sentido de que fossem feitas as correções necessárias, pouco se avançou”. Diz o documento: “Existem benefícios fiscais concedidos sem exigência do estorno do crédito do imposto relativo à mercadoria beneficiada, sem formalização de justificativas e indicação do interesse público, social e econômico envolvido, além das necessárias medidas de compensação. A Secretaria da Fazenda não realiza os registros contábeis da renúncia de receitas, conforme exigido pela Secretaria do Tesouro Nacional (STN). Não são realizados controles contendo avaliações e monitoramentos da política fiscal de renúncias.”
Por fim, o MPC sinaliza apreensão com os cenários futuros da arrecadação em tempos de pandemia: “A preocupação com a matéria se justifica, sobretudo, pelo cenário de queda na arrecadação que será verificado nas próximas Contas do Estado e que, certamente, exigirá cada vez mais zelo na gestão da coisa pública de modo a não comprometer a proteção dos direitos sociais previstos no art. 6º da Constituição Federal”.
O parecer emitido pelo MPC cita, ainda, outras irregularidades nas contas do governo de SP em 2019, relacionadas ao descumprimento sistemático de recomendações e determinações, violação da Reserva Legal e não comprovação de utilização integral de verbas do Fundeb em ações de manutenção e desenvolvimento do ensino. Somadas à nociva renúncia fiscal, essas irregularidades levaram o MPC a indicar aos conselheiros do TCE-SP a aprovação de parecer prévio desfavorável às contas do governo paulista em 2019, o que não foi acatado, apesar da contundência dos elementos denunciados.
Desta forma, o Fórum das Seis reivindica dos deputados e das deputadas estaduais paulistas que atentem à gravidade dos dados expostos pelo MPC, e que rejeitem as contas do governo estadual relativas a 2019, de modo a exigir que o governador João Doria esclareça os questionamentos levantados, bem como cumpra as recomendações do TCE-SP no sentido de dar transparência à sociedade de sua nefasta política de renúncia fiscal.
A rejeição das contas de 2019 será a demonstração clara e efetiva da sensibilidade e da preocupação dos deputados e das deputadas desta casa com a manutenção e a qualidade dos serviços públicos prestados à população do estado, para os quais a arrecadação de tributos é essencial.
São Paulo, 15 de julho de 2020.
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