O professor emérito Dalmo de Abreu Dallari, da Faculdade de Direito do Largo São Francisco (FD-USP), morreu nesta sexta-feira (8/4), aos 90 anos. Considerado um dos grandes juristas brasileiros, Dalmo além disso notabilizou-se no combate à Ditadura Militar (1964-1985). Foi um dos organizadores e presidente da Comissão de Justiça e Paz da Arquidiocese de São Paulo, criada em 1972 e que sob a liderança do cardeal dom Paulo Evaristo Arns se tornaria um dos polos de resistência às violências e arbitrariedades cometidas pelo regime.

No governo do general João Baptista Figueiredo, durante a visita do papa João Paulo II ao Brasil, em 1980, Dalmo foi sequestrado por agentes da repressão política para que não participasse da missa campal para a qual havia sido convidado pelo Vaticano. Agredido e esfaqueado, fez questão de comparecer à missa, mesmo em cadeira de rodas.

“Dalmo foi um dos grandes juristas da resistência democrática brasileira, mas também foi uma pessoa generosa e solidária com todos os que o cercavam”, declarou ao Informativo Adusp Deisy Ventura, professora titular de Ética da Faculdade de Saúde Pública (FSP-USP), que foi sua orientanda no mestrado. “Constituiu uma família maravilhosa e foi um farol para ela, assim como para todos os seus alunos, amigos e colegas. Todo o país chora sua morte, e os direitos humanos perdem um de seus maiores e mais sinceros defensores”.

“Um jurista público que encarnou como poucos o compromisso ético-político dessa profissão. O antípoda do jurista instrumental ao poder e à violência, como tantos de hoje e de ontem, que escondem indiferença moral por baixo do que dizem ser técnica jurídica”, destaca o professor Conrado Hubner Mendes, do Departamento de Direito do Estado da FD.

“O falecimento do professor Dalmo Dallari é uma perda irreparável para o Direito e para a Democracia brasileiros. Tive a honra de ser aluno do professor ainda nos bancos da graduação da Faculdade de Direito da USP. Suas lições e sabedoria são inesquecíveis e acompanharam toda a minha trajetória”, diz Alamiro Velludo Salvador Netto, professor titular do Departamento de Direito Penal, Medicina Forense e Criminologia da FD e membro do Conselho de Representantes (CR) da Adusp.

“Além de acadêmico brilhante, o professor Dalmo sempre lutou de modo incansável pela afirmação da democracia brasileira, defendeu as minorias e transformou-se em autêntica bandeira a ser empunhada por todos aqueles que almejam uma sociedade mais justa, tolerante e igualitária”, enfatiza Alamiro.

Dalmo graduou-se pela FD em 1957. Em 1963 foi aprovado no concurso para livre-docente em Teoria Geral do Estado, passando a integrar o corpo docente da USP no ano seguinte. Em 1974, venceu o concurso de títulos e provas para professor titular de Teoria Geral do Estado, “formando gerações de alunos até sua aposentadoria, em 2001”, como destaca matéria publicada no site da FD. Foi diretor da faculdade de 1986 a 1990. Na gestão da prefeita Luiza Erundina (então no PT), Dalmo foi secretário dos Negócios Jurídicos da Prefeitura do Município de São Paulo (entre 1990 e 1992).

“Defender os direitos humanos durante a Ditadura exigia coragem. Ser membro, e ainda mais, presidente da Comissão de Justiça e Paz, exigia muita coragem”, comentou, a pedido do Informativo Adusp , a jornalista britânica Jan Rocha, que foi correspondente da BBC no Brasil durante a Ditadura Militar.

“Dalmo Dallari pagou o preço. Em julho de 1980, durante a visita do papa João Paulo II a São Paulo, ele foi escolhido para fazer uma leitura da Biblia durante uma missa campal. Na véspera, foi sequestrado por quatro homens não identificados, levado para um terreno baldio, espancado e esfaqueado”, lembrou a jornalista. “Impossibilitado de caminhar devido aos ferimentos, insistiu em ir à missa mesmo em cadeira de rodas”.

Na época, ela fez o seguinte relato à BBC: “João Paulo II experimentou em primeira mão a hostilidade oficial que cerca a igreja local por defender os direitos humanos em geral e os direitos dos trabalhadores em particular. Assistiu à dolorosa caminhada até o altar do jurista Dalmo Dallari, selvagemente atacado na noite anterior por homens que diziam ser membros de   um grupo radical de extrema direita”.

A sorte do Brasil, finaliza Jan, “era ter homens e mulheres como ele, corajosos e solidários, que levantaram as suas vozes contra a repressão, a tortura e a brutalidade”.

O professor deixa a esposa, professora Sueli Gandolfi Dallari, professora titular da FSP-USP; sete filhos, entre os quais o professor Pedro Bohomoletz de Abreu Dallari (Instituto de Relações Internacionais) e a professora Maria Paula Dallari Bucci (FD); treze netos e dois bisnetos. Confira a seguir a nota divulgada pela família.

Aviso de falecimento

A família do professor Dalmo de Abreu Dallari comunica seu falecimento, ocorrido na data de hoje em São Paulo, em decorrência de insuficiência respiratória.

O professor Dalmo de Abreu Dallari tinha 90 anos e deixa esposa, 7 filhos, 13 netos e 2 bisnetos, e várias gerações de alunos e seguidores, aos quais se dedicou em mais de 60 anos de magistério e atuação na promoção dos direitos humanos.

O velório será realizado na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, no Largo de São Francisco, 95.

São Paulo, 8 de abril de 2022

EXPRESSO ADUSP


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