Universidade
Congregação da FFLCH rompe convênio com a Universidade de Haifa
No último dia 23 de outubro, a Congregação da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) decidiu romper o convênio acadêmico que mantinha com a Universidade de Haifa, conhecida instituição israelense. A decisão da Congregação da FFLCH foi tomada por 46 votos favoráveis, havendo quatro votos contrários e quatro abstenções. É a primeira vez que um convênio desse tipo é rompido na USP.
O convênio foi assinado por Paulo Martins, então diretor da FFLCH, em 15 de dezembro de 2021 e tinha validade por cinco anos, até 14 de dezembro de 2026. Pela Universidade de Haifa assinaram Ron Robin, seu presidente, e o reitor Gur Alroey. Tinha como objeto “a cooperação acadêmica nas áreas de História, Geografia, Filosofia, Ciências Sociais e Letras, a fim de promover o intercâmbio de docentes/pesquisadores, estudantes de pós-graduação, estudantes de graduação (com reconhecimento mútuo de estudos de graduação) e membros da equipe técnico-administrativa de ambas as instituições”, e não implicava “compromisso de suporte financeiro por parte das instituições” (confira aqui a versão em português).
Em texto publicado no seu site em 27 de outubro, a FFLCH informa que o pedido de encerramento do acordo com a Universidade de Haifa foi encaminhado pelo Centro de Estudos Palestinos da FFLCH (CEPal), por meio de documento assinado por 53 docentes da unidade. A solicitação “abordou o Artigo 8º, inciso VIII do Regimento da Faculdade”, segundo o qual cabe exclusivamente à Congregação opinar sobre a realização de acordos e convênios que envolvam a política de pesquisa e ensino daquela unidade.
“A escalada genocida, sem precedentes e cada vez mais destrutiva do Estado de Israel sobre a população de Gaza, seu território e suas instituições — hospitais, escolas, universidades, templos, sítios históricos e arqueológicos —, faz com que um convênio da FFLCH com a Universidade de Haifa fira todos os princípios e valores da nossa Faculdade”, diz a justificativa apresentada pelo CePal.
A Congregação da FFLCH também recebeu uma nota assinada pelos cinco centros acadêmicos da Faculdade (CeUPES, CAF, CEGE, CAEL e CAHIS) e pelo Diretório Central dos Estudantes (DCE-Livre “Alexandre Vannucchi Leme”), e endossada “por todos os representantes discentes da Congregação e de colegiados de conselhos departamentais”, solicitando o fim das relações com Haifa.
No decorrer do debate, a maioria das pessoas que se pronunciaram defendeu a ruptura do convênio com a Universidade de Haifa, enquanto algumas se manifestaram pela continuidade. “Romper um convênio com uma instituição universitária é um ato político, e nesse caso um ato de responsabilidade política diante de um horror que não podemos silenciar. Muito se tem falado do prejuízo acadêmico que essa decisão poderia trazer. Mas nenhum prejuízo institucional ou científico se aproxima, nem de longe, da dimensão do genocídio em curso na Palestina”, disse a professora Vanessa Martins do Monte.
“Sou a favor de um convênio com a Universidade de Haifa somente quando o Estado de Israel permitir que os nossos alunos viajem com visto para estudar em universidades palestinas, porque Israel proíbe, não concede visto para os nossos estudantes que querem estudar na Universidade Al-Quds, com a qual já tivemos um convênio, e na Universidade Birzeit, com a qual temos um convênio vigente”, destacou a professora Arlene Clemesha, coordenadora do CePal. “Trata-se de uma causa que está há quase cem anos pendente de solução, e se o mundo não se juntar para pressionar Israel, para que termine a ocupação ilegal dos territórios palestinos ocupados, não vai terminar”, emendou.
“A anulação do convênio com a Universidade de Haifa prejudicará principalmente nossos alunos, que a partir de uma decisão arbitrária já não terão a possibilidade de fazer intercâmbio com uma universidade de excelência”, afirmou a professora Marta Francisca Topel, coordenadora do convênio. Alunos do curso de hebraico se opuseram ao encerramento da cooperação, alegando que “nós não causamos a guerra, e não é justo que sejamos prejudicados por isso”, e que encerrar o convênio “não porá fim à guerra”.
O diretor da FFLCH, professor Adrián Fanjul, que se encontrava na China, por meio de uma chamada telefônica durante a reunião expôs argumentos favoráveis ao encerramento do convênio. Disse que “as informações sobre a Universidade de Haifa são comprováveis” e que “sua colaboração com as forças armadas de Israel e com a invasão genocida de Gaza me parece um problema ético nada menor”. Avaliou ainda que “a decisão do parlamento israelense de reocupar a Cisjordânia e a confissão do propósito de expulsar a população de Gaza, com a ofensiva terrestre de agosto, acabaram com o argumento de autodefesa de Israel”. Assista aqui à gravação em vídeo da reunião.
A USP ainda mantêm dois instrumentos de cooperação com a Universidade de Ariel, ambos firmados em julho de 2021, com vigência de cinco anos (2026), e assinados pelo então reitor Vahan Agopyan (atual secretário estadual de Ciência, Tecnologia e Inovação) e por sua contraparte israelense, Albert Pinhasov. Essa instituição foi erguida no assentamento de Ariel, na Cisjordânia ocupada, e por essa razão o “convênio acadêmico para mobilidade internacional” foi objeto do requerimento de informações 359/2024, apresentado pelo então deputado estadual Simão Pedro (PT). No site da Agência USP de Cooperação Acadêmica Nacional e Internacional (Aucani), porém, esse instrumento, que corresponde ao processo 2021.1.10432.1.1, é citado como um “acordo de cooperação”.
A Reitoria cumpre ainda um convênio com o Consulado Geral de Israel em São Paulo. Seu objeto é a “criação de um espaço interativo intercultural modal”, o chamado “Israel Corner” mantido pela Aucani no Centro Intercultural Internacional (CII), e sua vigência encerra-se em 14 de dezembro de 2026. Em abril, a Aucani cancelou a realização da “Feira Internacional Cultural 2025”, que serviria de palco para apresentações do Consulado Geral de Israel, depois que o professor aposentado da FFLCH e ex-ministro de Direitos Humanos Paulo Sérgio Pinheiro denunciou o fato por meio de um artigo que repercutiu intensamente.
Outras universidades brasileiras que romperam convênios com homólogas israelenses foram a Universidade de Campinas (Unicamp), que em 26 de setembro último, por decisão do reitor, extinguiu sua relação com o Israel Institute of Technology, conhecido como Technion; a Universidade Federal do Ceará (UFC); e a Universidade Federal Fluminense (UFF).
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