Na reunião de 12 de dezembro do Conselho Universitário (Co), o diretor-executivo da Fundação Universidade de São Paulo (FUSP), Marcílio Alves, e o reitor Carlos Gilberto Carlotti Jr. anunciaram a expansão física dessa organização privada por meio da abertura de escritórios nos campi do interior. Ao apresentar ao plenário do Co, na parte final da reunião, slides contendo dados sobre a FUSP, Marcílio informou a existência, “agora”, de escritórios nos campi de Ribeirão Preto (“com uma funcionária trabalhando lá, dedicada a acolher os professores de Ribeirão”), Piracicaba e São Carlos.

Na apresentação, Marcílio revelou que a FUSP teve uma receita de R$ 271 milhões em projetos no ano de 2022, dos quais R$ 128 milhões provenientes de empresas privadas, R$ 72 milhões de instituições públicas, R$ 59 milhões de cursos pagos e R$ 12 milhões de instituições internacionais. Ele também informou como esses recursos são distribuídos. Os “projetos docentes” respondem pela maior fatia do bolo: 75%; a FUSP retém uma comissão de 10%; outros 10% são recolhidos pelo Fundo Único de Promoção à Pesquisa, à Educação, à Cultura e à Extensão Universitária da USP (Fuppeceu), divididos meio a meio entre a Reitoria e a respectiva unidade. Os 5% restantes são divididos entre a Reitoria e a unidade, para aplicação livre em projetos, mas gerenciados pela FUSP.

Portanto, em 2022 os “projetos docentes” da FUSP, após descontadas as taxas devidas à Reitoria, às unidades e à própria FUSP, arrecadaram nada menos que R$ 203 milhões, em números redondos. É uma quantia muito expressiva. Digamos, por outro lado, que os projetos tenham despesas de 30% (o custo real provavelmente é menor). Neste caso, o total da remuneração do(a)s docentes coordenadores(a)s de projetos da FUSP, em 2022, terá sido de algo em torno de R$ 142 milhões. Se dividirmos por 1.200 projetos (dado anunciado pelo diretor-executivo), teremos uma média de R$ 1,184 milhão líquidos por projeto.

Na apresentação, Marcílio citou também outra cifra, igualmente impressionante: a FUSP “gerencia R$ 344 milhões”, relatou, sem indicar a que período corresponde esse montante.

Marcílio apontou as principais características da FUSP, entre as quais o fato de ser “uma entidade privada do terceiro setor”, criada há 31 anos e que hoje conta com 200 funcionários celetistas e 55 “colaboradores”. Nesse momento da apresentação, após mencionar que a fundação surgiu com a “missão de apoiar a USP e seus docentes, em pesquisa, em extensão, em inclusão, em cultura, ensino, inovação”, ele a descreveu como uma espécie de factotum da USP.

“Ela é uma interveniente entre pessoas, setor produtivo, agências de fomento, convênios com a Fapesp, CNPq, com o governo, vários ministérios. Recebe emendas parlamentares, é uma coisa importante que está acontecendo cada vez mais lá na FUSP. E participa de editais públicos”, disse o diretor-executivo. Em resumo, a apresentação indicou que a FUSP parece fazer quase tudo que a USP pode e deveria fazer, mas delega a uma entidade privada — até mesmo receber emendas parlamentares.

Marcílio destacou ainda a participação da fundação no financiamento do projeto de reforma do Museu do Ipiranga. A FUSP aportou R$ 37 milhões para que a obra fosse concluída no prazo. O valor equivale a 15% do custo total da reforma, de R$ 251 milhões. Fechado por vários anos, o museu foi reaberto em 6 de setembro de 2022, um dia antes do previsto, para evitar eventuais complicações provocadas por apoiadores(as) do então presidente Jair Bolsonaro. “Foi uma aventura muito grande que eu e o professor Carlotti [Jr.] passamos, com muitas outras pessoas também”, comentou sobre a inauguração o diretor-executivo.

Segundo Carlotti Jr., é “obrigação da Reitoria disponibilizar a FUSP”

Após a apresentação de Marcílio, o reitor — que preside o Conselho Curador da FUSP desde que tomou posse na Reitoria, em janeiro de 2022 — fez questão de enfatizar a expansão dessa fundação privada. Além de citá-la como se fosse um departamento da universidade, Carlotti Jr. ainda normalizou a existência das demais fundações privadas que atuam na USP, ao avisar, literalmente, que a FUSP não pretende “competir” com elas.

“O que nós fizemos de diferente na nossa gestão, primeiro, foi colocar a FUSP nos diferentes campi. Ela não poderia ficar uma FUSP restrita ao Butantã. Então agora ela tem [sic] em São Carlos, ela tem…”, declarou o reitor ao Co, sem completar a frase. “E ela não entra para competir nesses campi. Quem tiver fundação trabalhando bem, trabalha. Mas é obrigação da Reitoria disponibilizar [sic] a FUSP. Porque dá muito trabalho fundação. Já fui presidente de fundação, dá muito trabalho. Então se a gente puder ter a FUSP servindo para todo mundo seria muito bom”, afirmou, sem explicar por que razão a Reitoria teria a “obrigação” de “disponibilizar” a FUSP.

Até onde se sabe, esta é a primeira vez que Carlotti Jr. explicitou publicamente o fato de haver presidido uma fundação privada (que não a FUSP). Mas ele não mencionou que a fundação em questão é a Faepa, ou Fundação de Apoio ao Ensino, Pesquisa e Assistência do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, constituída por docentes da FMRP e que controla inteiramente o Hospital de Clínicas de Ribeirão Preto, outrora pertencente à USP e hoje uma autarquia estadual. Carlotti presidiu o Conselho de Curadores e de Administração da Faepa de 2013 a 2016, quando diretor da FMRP.

Trata-se da mesma Faepa que foi contratada sem licitação pelo governo estadual para gerir o Hospital das Clínicas de Bauru e o ex-Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais (HRAC). O valor do contrato, que tem vigência de cinco anos mas pode ser prorrogado, é de R$ 309 milhões. Quinhentos e vinte funcionários da USP, remunerados pela USP, foram compelidos pela Reitoria a trabalhar de graça para a Faepa.

“A outra iniciativa foi essa que eu combinei com o Marcílio, que ele vai dar alguns presentes para a USP durante o ano”, continuou Carlotti Jr. “Então ele já deu o presente dos centros de vivência, já deu os portões, mas este ano ainda tenho uma surpresa para ele. Os campi do interior também vão ganhar presentes da FUSP. Aquela porcentagem que fica para a Reitoria a gente deixando dentro dos campi ou dentro das unidades. São alterações significativas na FUSP, e sem a FUSP, ele mostrou, seria impossível fazer a reforma do Museu do Ipiranga. Foi um exemplo de serviço público”, afirmou, dando a entender que, a seu ver, a fundação privada é um ente público.

“Dois anos e meio, Marcílio, é isso? Fazer a reforma, fazer um restauro do Museu, duplicar a área física do Museu, uma entidade particular não conseguiria fazer, eu tenho certeza disso. Qualquer empresa particular não conseguiria, a FUSP conseguiu fazer”, prosseguiu na mesma linha, ignorando assim a clara definição do diretor-executivo sobre o caráter privado da fundação. “Então é um exemplo de uma entidade que tem como característica servir a Universidade, servir ao público. Isso é muito bom”, completou, prometendo ainda “grandes novidades para este ano”, provavelmente na área esportiva. “Sinto que vai ser alguma coisa no Cepeusp, que vai ter o apoio da FUSP”.

EXPRESSO ADUSP


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